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Carrefour: 'Orientação é ficar escondida por causa da mídia', disse fiscal

Hygino Vasconcellos

Colaboração para o UOL, em Porto Alegre

11/12/2020 13h22Atualizada em 11/12/2020 16h51

A agente de fiscalização do Carrefour Adriana Alves Dutra, uma das seis pessoas indiciadas pela morte do cliente negro João Alberto Silveira Freitas, afirmou que precisava ficar "escondida por causa da mídia" em uma conversa com um colega, horas após o crime. Ela foi presa cinco dias depois do assassinato, quando foi chamada para prestar novo depoimento, já que não foi encontrada em sua residência pelos policiais.

No momento da detenção, o celular dela foi entregue e passou a ser analisado. Duas mensagens chamaram a atenção dos policiais - uma enviada às 16h38 e a outra às 22h57 de 20 de novembro. As duas foram encaminhadas a dois contatos diferentes, mas com mesmo nome: Paulo.

"Também não sei Paulo, a orientação da advogada, é eu ficar baixada, escondida por enquanto, por causa da mídia, tu tá entendendo? Porque está tudo muito ruim pro meu lado".
Primeira mensagem de Adriana

"A orientação da advogada é ficar totalmente fora da vista, e tentar proteger as pessoas que são ligadas a mim. Então, não fica te expondo porque vai ficar ruim, tu tá entendendo?"
Segunda mensagem de Adriana

Os diálogos constam no relatório de investigação encaminhado à Justiça hoje devido à conclusão do inquérito. Além de Adriana, já estavam presos desde a noite do crime o ex-policial militar temporário Giovane Gaspar da Silva e o segurança Magno Braz Borges. Adriana está presa temporariamente e foi solicitada a conversão para prisão preventiva.

Hoje, a polícia pediu o indiciamento e a prisão de mais três funcionários por homicídio triplamente qualificado por motivo torpe, asfixia e uso de recurso que impossibilitou a defesa. Entre eles está o segurança que foi flagrado em vídeo dizendo para João Alberto "não fazer cena" enquanto era contido, além de dois funcionários com participação menor no caso.

Para a polícia, não houve crime de injúria racial, mas Beto, como era conhecido o cliente negro, foi vítima de "racismo estrutural", citado como motivo torpe nas qualificadoras.

Procurado, o advogado Felipe Bertoni, que defende Adriana, disse que não iria se manifestar.

Quem são os indiciados:

  • Giovane Gaspar da Silva - ex-PM temporário e funcionário da empresa de segurança terceirizada contratada pelo Carrefour; foi um dos agressores
  • Magno Braz Borges - funcionário da empresa de segurança terceirizada contratada pelo Carrefour; foi um dos agressores
  • Adriana Alves Dutra - agente de fiscalização que acompanhou toda a ação, não impediu as agressões e tentou proibir que a situação fosse filmada
  • Paulo Francisco da Silva - funcionário do Carrefour que viu toda a ação e chegou a dizer para João Alberto parar de fazer "cena" enquanto era agredido. Intimidou as pessoas em volta e, para a polícia, teve conduta similar à de Adriana.
  • Rafael Rezende - funcionário do Carrefour que aparece correndo em direção ao estacionamento antes de João ser agredido; foi flagrado intimidando e afastando as pessoas que estavam no entorno
  • Kleiton Silva Santos - funcionário do Carrefour que aparece correndo em direção ao estacionamento antes de João ser agredido; foi flagrado intimidando e afastando as pessoas que estavam no entorno.

Caso João Alberto

João Alberto Silveira Freitas foi morto em 19 de novembro no Carrefour da zona norte de Porto Alegre. Segundo a esposa dele, Milena Borges Alves, 43, o casal foi ao supermercado para comprar ingredientes para um pudim de pão e adquirir verduras. Ela conta que ficaram poucos minutos no Carrefour e que Beto saiu na frente em direção ao estacionamento. Ao chegar ao local, Milena se deparou com o marido se debatendo no chão. Ele chegou a pedir ajuda, mas a esposa foi impedida de chegar perto dele.

Imagens de câmeras de segurança mostram a circulação de Beto na área dos caixas e as agressões no estacionamento. A gravação mostra Beto desferindo um soco no PM temporário, o que é seguido por chutes, pontapés e socos do segurança e do PM temporário.

A maior parte das imagens mostra a imobilização com uso da perna flexionada do segurança sobre as costas de Beto. O Samu foi acionado, mas Beto não resistiu às agressões.