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Advogado usa absolvição em outro processo como defesa por chacina de Osasco

De camiseta branca, os réus Sergio Manhanhã, e Victor Cristilder (de muletas) chegam para acompanhar a sessão de terça-feira do julgamento da chacina de Osasco; ao centro os advogados de defesa, à direita o promotor Marcelo Alexandre de Oliveira - Divulgação/Tribunal de Justiça de São Paulo
De camiseta branca, os réus Sergio Manhanhã, e Victor Cristilder (de muletas) chegam para acompanhar a sessão de terça-feira do julgamento da chacina de Osasco; ao centro os advogados de defesa, à direita o promotor Marcelo Alexandre de Oliveira Imagem: Divulgação/Tribunal de Justiça de São Paulo

Marcelo Oliveira

Do UOL, em São Paulo

24/02/2021 16h05

A defesa do policial militar Victor Cristilder Silva dos Santos e do guarda civil Sergio Manhanhã está usando a absolvição do PM no júri da "pré-chacina" de Carapicuíba —em novembro de 2020— como argumento para tentar desmontar a tese do Ministério Público de que Cristilder e Manhanhã se associaram a outros policiais para matar 17 pessoas e ferir outras sete na chacina de Osasco e Barueri, a maior já registrada no estado de São Paulo.

Em 2017, Manhanhã havia sido condenado a 110 anos de prisão pela participação em 11 mortes e duas tentativas de homicídio. Em 2018, Cristilder foi condenado a 119 anos de prisão por 12 mortes e quatro tentativas de assassinato.

Segundo o MP, as vítimas foram mortas por um grupo de agentes de forças de segurança que se uniram para vingar os assassinatos do PM Admilson Pereira de Oliveira, em 8 de agosto de 2015, em Osasco, e do guarda civil Jeferson Luiz Rodrigues da Silva, no dia 12 de agosto daquele ano, em Barueri.

Manhanhã e Cristilder recorreram de suas condenações. O Tribunal de Justiça de São Paulo anulou os júris anteriores em relação aos dois réus, por isso acontece o novo julgamento nesta semana.

O TJ entendeu que os jurados decidiram de forma contrária à prova dos autos. Atualmente, os dois são representados pelo advogado João Carlos Campanini, que juntou 20 mil novas páginas de documentos ao processo após a absolvição de Cristilder.

A decisão do TJ não abrange os outros dois PMs acusados pela chacina. Fabrício Eleutério e Thiago Henklain foram condenados em 2017 a 255 e 247 anos de prisão, respectivamente.

O que foi a "pré-chacina" de Carapicuíba

A "pré-chacina" de Carapicuíba, Osasco e Itapevi teve seis mortos e aconteceu em 8 de agosto de 2015, cinco dias antes da chacina de Osasco e Barueri, pela qual Cristilder e Manhanhã estão sendo novamente julgados.

Cristilder foi acusado de ter participado do assassinato de Michael do Amaral Ribeiro, uma das vítimas mortas em Carapicuíba. Foi a júri popular e acabou absolvido por maioria dos votos.

Estudiosos do processo dizem, contudo, que o caso atual tem muitas evidências. "Nesse caso, há farta prova. Mais do que é comum aos processos de júri. Tem balística, prova pericial do celular, muitas testemunhas foram ouvidas", afirma a professora de direito penal Fernanda Matsuda.

Ela integra um grupo de professores do campus Osasco da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) que está acompanhando o processo em apoio ao movimento das Mães de Osasco e Barueri, de familiares das vítimas da chacina.

O julgamento de Cristilder em Carapicuíba aconteceu em 26 de novembro de 2020, embora estivesse marcado para acontecer depois do julgamento do PM e Manhanhã pela chacina de Osasco e Barueri. Este estava previsto para 23 de novembro, mas foi adiado porque o advogado de defesa estava com suspeita de covid-19. Quando ele descartou a doença, em 24 de novembro, foi liberada a realização do júri em Carapicuíba.

Uniformes de presidiários

Hoje, reportagem da Folha revelou que os réus estão em plenário usando uniforme das penitenciárias onde estão presos preventivamente. Segundo a reportagem, a decisão teria sido da presidente do júri, a juíza Élia Kinosita. O TJ não confirma, dizendo que juízes são proibidos por lei de comentar casos em andamento. Fotos divulgadas ontem (24) pelo tribunal mostram os réus apenas de costas.

Justamente pelo fato de os jurados não serem técnicos, o uso de uniforme da cadeia e algemas pelos réus é evitado pelos tribunais. A tese é que o uniforme e as algemas influenciariam na avaliação do caso pelos jurados, o que pode causar a anulação do júri.

O promotor Marcelo Alexandre de Oliveira nega que o uso de roupas de presidiários pelos réus dê causa à anulação do julgamento. "O que é proibido é o uso de algemas e os réus estão sem algemas", diz. Segundo o promotor, o uso de roupas comuns poderia facilitar uma eventual fuga dos réus.

Segundo o advogado dos réus, Manhanhã está entrando em plenário com algemas. Cristilder está liberado das algemas, porque usa muletas após quebrar a perna em um jogo de futebol no presídio.

"As algemas são retiradas somente quando eles já estão de costas para os jurados. Vou pedir a anulação do júri, caso eles não sejam absolvidos", disse Campanini.

Na sessão de hoje (24), oito testemunhas foram ouvidas, encerrando essa fase do julgamento. Esta foi a mais longa sessão do julgamento até agora. Começou às 10h20 e terminou às 21h.

Os interrogatórios dos réus estão marcados para amanhã. Pela ordem prevista será ouvido primeiro o ex-PM Cristilder, depois o GCM Manhanhã. Em seguida, acusação e defesa debatem.

A reunião dos jurados para o veredito é a penúltima etapa do julgamento. Depois, a juíza analisa as respostas dos jurados aos quesitos e informa se houve absolvição ou condenação e calcula a pena, se houver. A previsão atual é que o julgamento termine apenas na sexta-feira (26).

Júris normalmente são abertos ao público. Sob a alegação da pandemia de covid-19, a juíza Élia Kinosita proibiu a presença de pessoas estranhas ao processo no plenário. Só é permitida a presença da defesa, do MP, de funcionários da Justiça, dos policiais que fazem a escolta e os réus. Familiares das vítimas e dos réus e a imprensa não podem entrar no recinto e não há transmissão da sessão.