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Jovem de 23 anos leva 18 facadas e sobrevive: 'Dor é na alma'

Vitória Lima, de 23 anos, lembra que foi atacada por dois homens próximo a casa em que morava, no litoral de SP - Reprodução/Arquivo Pessoal
Vitória Lima, de 23 anos, lembra que foi atacada por dois homens próximo a casa em que morava, no litoral de SP Imagem: Reprodução/Arquivo Pessoal

Maurício Businari

Colaboração para o UOL, em Santos

16/06/2021 15h23Atualizada em 16/06/2021 16h51

A analista de sistemas Vitória Raquel Celeste Ferreira de Lima, de 23 anos, foi vítima de um ataque violento na madrugada do dia 19 de maio nas proximidades de sua casa, em Santos, no Litoral de São Paulo.

A jovem teve as roupas arrancadas, levou 18 facadas no pescoço e foi deixada abandonada, com ferimentos graves, na roda de um caminhão. Mas após 12 dias internada, cinco deles na UTI (Unidade de Terapia Intensiva), ela sobreviveu. O crime aconteceu no bairro do Jardim Rádio Clube, onde a analista morava há três anos com a esposa.

No dia do ataque, elas estavam preparando a mudança para a casa dos pais de Vitória, com quem morariam por um tempo.

"Já era tarde da noite quando a gente acabou de arrumar as coisas para a mudança. Sentimos fome e tentamos pedir algo pelo aplicativo, mas já era 1h da manhã e não conseguimos. Daí falei para a minha esposa que ia até um carrinho de salgados, que ficava aberto a noite toda, numa praça perto de casa", detalha Vitória.

A jovem então saiu, caminhou por cinco quadras até a praça e comprou os salgados. Mas quando estava retornando para casa, ouviu um assovio. Ela caminhava por um trecho da via em que os postes de iluminação não estavam funcionando e quando procurou quem a chamava, foi atacada.

"Vi dois vultos. Um deles jogou areia molhada nos meus olhos e o outro me agarrou e colocou um lenço no meu rosto, com algum tipo de química. Ardia os olhos. Pensei que fosse um assalto e gritei que podiam levar tudo. Mas começaram a me arrastar e me jogaram em cima de um colchão velho, perto de um caminhão. Daí eu apaguei".

Vitória conta que acordou minutos depois com um dos homens sobre ela, tentando esganá-la com as mãos e gritando que ia ensiná-la 'o que é ser mulher'. Desesperada, ela começou a tatear o chão em busca de algo para se defender e encontrou uma faca grande, de cabo preto. A vítima diz que não se recorda bem, mas acredita que tenha ferido o agressor.

"O outro rapaz filmava tudo com o celular. Nesse momento, o que estava em cima de mim pegou R$ 20,00 que estavam no meu short, meu celular, e entregou ao outro, enquanto colocava o pano no meu rosto novamente. Eu ouvi ele dizer: 'agora vai comprar os bagulhos enquanto eu dou um jeito nela'. Foi quando eu desmaiei de novo", detalha.

Deixada sozinha pelos homens na roda de um caminhão, Vitória relata que só acordou horas depois, com o latido de um cão que passava pela rua. Ela estava deitada, encaixada na parte interna de uma das rodas do caminhão, sem saber o que tinha acontecido.

A analista percebeu que estava seminua e se arrastou até a calçada para procurar o short que usava antes do ataque, mas desmaiou novamente. Quando despertou já viu a esposa, que tentava estancar o sangue do seu pescoço com uma jaqueta.

Uma vizinha, que chamara o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), também permanecia ao seu lado. Levada ao hospital, Vitória descobriu que havia levado 18 facadas no pescoço. Uma delas atingiu a veia carótida, que não se rompeu apenas porque o sangue coagulou rapidamente.

A vítima também precisou passar por várias transfusões, recebendo 8 bolsas de sangue no hospital.

Mesmo após ter alta, Vitória teve que reaprender a comer e a falar. Com os exames feitos em seu corpo, ela descobriu que o agressor usou três tipos de objetos pontiagudos diferentes para feri-la. Dois deles facas, sendo uma de serra, e uma garrafa de vidro quebrada.

Ela ficou sabendo também que foi marcada na cintura, provavelmente com um anel em brasa.

"Como se eu fosse propriedade dele. Ele é doente, um monstro. E espero que se arrependa ainda em vida do que fez", desabafa.

Suspeitos são conhecidos no bairro

A própria Vitória foi a responsável por indicar aos policiais quem são os homens considerados suspeitos do ataque contra ela. Um deles, o que filmava a ação, seria um homem morador do bairro, que, segundo a vítima, é conhecido pelos vizinhos por seu comportamento problemático.

Já o que praticou a violência é apontado como um morador de rua, a quem a jovem ajudou por diversas vezes, oferecendo alimentos.

"Não posso afirmar com certeza que foi um crime motivado por homofobia. Nem sei se cheguei a ser violentada mesmo, não me lembro. Talvez arrancaram minha roupa para me humilhar. Talvez eles só quisessem dinheiro para comprar drogas", reflete a jovem sobre as razões do ataque.

Enquanto se recupera, Vitória diz que espera que a história sirva como exemplo para outras mulheres vítimas de violência, para que não tenham medo de denunciar e não se calem diante das atrocidades que outro ser humano possa cometer com elas.

"Quero me dedicar agora a ajudar vítimas de violência. É engraçado, mas eu não senti dor física nenhuma. Nem durante e nem depois dos ataques. A minha dor é na alma", concluiu.

Por meio de nota, a Polícia Civil informou que o caso foi registrado como estupro e tentativa de homicídio qualificado pela Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Santos. "Diligências estão em andamento para esclarecimento dos fatos. Mais detalhes não podem ser fornecidos, por se tratar de crime sexual".

Como denunciar violência

Caso a vítima tenha sofrido violência sem ferimentos graves ela pode recorrer imediatamente a Delegacia da Mulher, se existir essa unidade em seu município, ou a delegacia de Polícia Civil, para registrar o boletim de ocorrência.

Quando houver ferimentos graves, com necessidade de pronto atendimento, a unidade de saúde ou hospital deverá fazer o encaminhamento ou orientar a paciente para que procure a delegacia de polícia. Na maioria dos casos com internamento, o próprio hospital confirma a violência e avisa a Polícia Civil.

Disque 190

Deve ser acionado em caso de flagrante ou em que a situação de violência esteja ocorrendo naquele momento.

Disque 181

Pode ser usado para denunciar anonimamente a violência. As informações serão conferidas pela polícia.

Disque 180

A Central de Atendimento à Mulher funciona 24 horas. A ligação é gratuita, anônima e disponível em todo o país.

Ministério Público

Acesse o site do Ministério Público do seu estado e saiba qual a melhor forma de fazer a denúncia. Alguns estados possuem, inclusive, núcleos de gênero especializados em atender mulheres vítimas de violência.