Tiros matam uma pessoa durante reconstituição da morte do menino Ray
Uma pessoa foi morta e outra foi presa na manhã de hoje durante a reconstituição da morte do adolescente negro Ray Pinto Faria, de 14 anos, que aconteceu no dia 22 de fevereiro desse ano, em uma comunidade do Campinho, na Zona Norte do Rio de Janeiro.
Um grupo de policiais do Core (Coordenadoria de Recursos Especiais), com apoio da Delegacia de Homicídios da Capital, chegou ao local com o propósito de fazer a segurança no perímetro em que aconteceria a reconstituição do crime.
Uma testemunha ouvida pelo UOL disse que no momento da chegada à comunidade os participantes da reconstituição foram recebidos a tiros e responderam com disparos.
Após o confronto, eles deram continuidade à reprodução, que durou cerca de quatro horas. Até o momento, não foram fornecidas mais informações sobre a identidade da pessoa morta e da pessoa detida.
Rodrigo Mondego, integrante da Comissão de Direitos Humanos da OAB-Rio que acompanhou a reprodução simulada, confirmou os tiros na chegada dos agentes.
Ele explicou que existem duas versões conflitantes sobre o caso.
"A PM diz que houve um confronto no local e o Ray teria morrido por causa disso. A outra versão, das testemunhas e das pessoas que moravam no local, que conheciam o menino desde bebê, dizem que viram o Ray vivo no domínio dos policiais. Hoje a Polícia Civil fez uma análise vendo do ponto de vista dos polícias e das testemunhas pra ver o que é mais verossímil e responsabilizar ou não os policiais pela morte do Ray", detalhou.
Em nota comentando a morte e a prisão ocorridas hoje, a Polícia Civil afirmou que durante a reconstituição os agentes "avistaram um homem em atitude suspeita", sem mais detalhes sobre qual seria a atitude mencionada.
Segundo o comunicado, ele atirou contra os policiais, "que revidaram e o balearam", antes de ser abordado. Questionados sobre a identidade do homem morto, a polícia ainda não respondeu.
Já o homem preso foi identificado apenas como um jovem de 19 anos. Registros de um cinegrafista que estava no local mostram o rapaz, negro, sendo levado pelos agentes. Eles disseram ter apreendido com ele uma pistola, um rádio comunicador, carregador e munições.
Lembre o caso
Um adolescente negro, Ray foi visto pela última vez sendo levado por policiais para o alto da comunidade do Campinho, segundo a família do adolescente. Ainda de acordo com o relato, ele estava na porta de casa, mexendo no celular, quando policiais militares o abordaram.
Durante horas eles ficaram sem saber o que aconteceu com o jovem e só depois foram informados que seu corpo estava no Hospital Salgado Filho, no Méier, na zona norte da cidade.
De acordo com testemunhas, Ray não estava armado e nem tinha envolvimento com o tráfico. No dia da morte, o adolescente tinha acordado cedo e ido para a porta de casa jogar Free Fire, um game para celular e computador.
Como a família não tinha Wi-Fi e nem 3G, ele pegava o sinal de uma venda ao lado de sua casa. A assessoria de imprensa da Polícia Militar informou na data do ocorrido que houve operação policial na região, e um confronto na comunidade do Urubu, onde dois indivíduos foram localizados feridos e levados para o Hospital Municipal Salgado Filho, mas acabaram morrendo.
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020 (levantamento mais recente feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com dados do ano de 2019), 74,4% das vítimas de homicídio no Brasil eram pessoas negras. Entre as pessoas mortas por policiais, 79,1% são pessoas negras.
Na esfera do poder público, não existe uma divulgação transparente de dados oficiais nacionais sobre homicídios ou sobre mortes provocadas por policiais em todo o Brasil. O governo brasileiro também não disponibiliza dados nacionais sobre as investigações e punições de homicídios.
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