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Igreja Católica diz que não se omitiu sobre acusações contra padre Ernani

Maria Carolina Trevisan e José Dacau

Colunista do UOL e do UOL, em Monte Sião (MG)

30/09/2021 07h00

A Igreja Católica afirmou, em resposta enviada por email, que não se omitiu em relação às acusações de crimes sexuais contra o padre Ernani Maia dos Reis, que comandou durante nove anos o Mosteiro Santíssima Trindade, em Monte Sião, interior de Minas Gerais.

Na resposta assinada pelo cônego Wilson Mário de Morais, vigário geral da Arquidiocese de Pouso Alegre (MG), a instituição afirma que "nunca negou qualquer fato (dele) ou ato atribuído quando do exercício na liderança daquela comunidade". Porém, no mesmo texto, não há nenhuma menção específica sobre a natureza das acusações: violência sexual, assédio sexual e assédio moral.

"Foram constituídas auditorias, comissões de apuração em várias esferas de acompanhamento, sendo as respectivas comunicações, diretas aos representantes legais superiores (Nunciatura e Santa Sé). Nunca houve qualquer omissão nesse sentido."

A igreja não respondeu sobre as conclusões das investigações internas, nem esclareceu que atitudes foram tomadas em relação aos relatos de crimes sexuais cometidos pelo padre Ernani. Também não respondeu qual o atual estágio do processo de saída de Ernani da Igreja Católica, que foi encaminhado ao Vaticano. O afastamento foi pedido pelo próprio padre.

A resposta completa pode ser lida no seguinte link: https://download.uol.com.br/files/2021/09/868470500_resposta-da-igreja-catolica.pdf

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Padre Ernani Maia dos Reis é acusado por oito monges de assédio e violência sexual
Imagem: Reprodução Internet

Investigação interna

A Arquidiocese de Pouso Alegre informou que, em agosto de 2018, quando eclodiu a crise no mosteiro, o padre Ernani procurou o arcebispo dom José Luiz Majella Delgado, arcebispo de Pouso Alegre (MG), alegando estar cansado e desmotivado. Pediu para se afastar por um tempo.

Dom Majella enviou Ernani para um tratamento no Centro Âncora, um tipo de clínica especializada em amparar sacerdotes e religiosos "que venham apresentando sofrimentos e angústias", em Pinhais, região metropolitana de Curitiba.

O espaço "visa contribuir com a igreja através da acolhida, revitalização espiritual e condutas psicoterápicas, bem como cuidado médico especializado para com aqueles que sofrem", lê-se no site da instituição.

Padre enviado à casa de acolhimento no Paraná

No período em que esteve internado no Centro Âncora, o padre Ernani recebeu tratamento semanal com psicólogo, psiquiatra, nutricionista e apoio espiritual.

A equipe de reportagem foi até Pinhais (PR) para conhecer a instituição especializada em atender sacerdotes e religiosos com problemas de estresse, dúvidas sobre vocação, depressão e ansiedade, além de abusadores sexuais —inclusive casos de padres pedófilos.

A estada de seis meses foi paga pelo próprio mosteiro ao custo mensal de mais de R$ 10 mil.

Inaugurado em 2011, o centro recebeu cerca de 500 membros de igrejas brasileiras e alguns do exterior. Os fundadores dizem ser o único lugar do mundo com essas características. "Talvez existam mais três semelhantes", afirma a irmã Adenise Sommer, diretora presidente do Centro Âncora.

Ao final, há um laudo e uma indicação de encaminhamento do paciente. Ernani esteve na clínica por seis meses. Segundo depoimento de uma fonte ligada à igreja, foram identificados em Ernani traços psicopáticos e narcisistas.

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Dom José Luiz Majella Delgado, arcebispo de Pouso Alegre (MG)
Imagem: Reprodução Internet

Segundo a Arquidiocese de Pouso Alegre (MG), depois de seis meses internado na clínica, em março de 2019, o padre Ernani pediu seu afastamento em definitivo. Dom Majella sugeriu que ele ficasse suspenso por mais um ano para pensar melhor na decisão que havia tomado.

Passado esse período, Ernani voltou a conversar com o arcebispo, afirmam fontes ligadas ao caso. O padre insistiu em renunciar ao ministério. Fez um pedido por escrito ao papa Francisco para que ele conceda a redução ao estado laico. O documento seguiu à Congregação para o Clero, no Vaticano. O processo ainda está em andamento.

Dois padres que participaram da investigação interna foram procurados pela reportagem em Pouso Alegre. Confirmaram a existência da investigação, a escuta dos relatos e a assistência às vítimas que ficaram na comunidade, mas disseram que não poderiam falar sobre o caso sem a anuência do arcebispo.

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Padre Ernani Maia dos Reis nega que tenha cometido assédio e violência sexual contra monges
Imagem: Reprodução Internet

Padre tem consultório de psicanálise

Após deixar a clínica em Pinhais (PR), padre Ernani Maia dos Reis se mudou para Franca (SP), onde mantém um consultório de psicanálise e faz atendimentos.

Na cidade do interior paulista, ele chegou a atuar em outro grupo da Igreja Católica ligado à Diocese de Franca, a Comunidade Tenda, "uma comunidade de famílias".

Nas duas vezes em que a reportagem abordou o padre Ernani, ele negou as acusações de violência sexual e assédio. Alega ser vítima de uma perseguição. "Vocês não têm noção do que eu sei. E nem do que eu vivi", disse, com a voz baixa. "Eu não vou falar", repetiu, pausadamente, em tom cada vez mais alto.

"Sabe por quê? Eu vou dar a chance de eles viverem até onde eles puderem. Se eu disser alguma coisa, eu explodo com eles, eu acabo com eles [de um jeito] que lá não sobra nada. Deixa eles viverem."

Ernani se recusou a responder perguntas específicas da reportagem sobre acusações de violência sexual, assédio sexual e assédio moral.

O atual arcebispo da Arquidiocese de Pouso Alegre, dom Majella, responsável por paróquias de 36 municípios, incluindo Monte Sião, não quis dar entrevistas nas duas vezes em que foi procurado pessoalmente.

A assessoria de imprensa da Cúria de Pouso Alegre (MG) informou que houve investigação relacionada a uma "crise interna, de foro íntimo deles, por isso a gente tem que preservar". Segundo a cúria, houve questões relacionadas a "ciúme, um certo autoritarismo".

A arquidiocese foi procurada também por telefone e por email. Em julho, foi questionada acerca de seu conhecimento sobre os abusos sexuais e moral, se esses fatos foram relatados ao Vaticano e o andamento do processo canônico, a adequação da arquidiocese às medidas determinadas pelo papa Francisco, que devem entrar em vigor a partir de dezembro, e que tratam do envolvimento de sacerdotes com adultos e de medidas contra a omissão das instituições da Igreja Católica nesses contextos.

Sobre o tratamento dado aos monges, a reportagem perguntou qual era o estado psicológico em que se encontravam os irmãos e irmãs e se eles receberam amparo da Igreja, inclusive os que já tinham saído.

antiga sede - José Dacau/UOL - José Dacau/UOL
Antiga sede do mosteiro da Santíssima Trindade, em Monte Sião (MG)
Imagem: José Dacau/UOL

O Vaticano foi procurado e respondeu de forma protocolar que as questões colocadas pela reportagem teriam de ser direcionadas à Arquidiocese de Pouso Alegre. Não se posicionou sobre abusos sexuais cometidos por membros do clero da Igreja Católica.

A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), instituição responsável pelos bispos arquidiocesanos do Brasil, também pediu que as perguntas fossem enviadas à Arquidiocese de Pouso Alegre e não se posicionou sobre os abusos e acobertamento das violações praticadas pelo clero. Não respondeu se teve ciência do caso do padre Ernani Maia dos Reis.

O atual núncio apostólico para o Brasil, dom Giambattista Diquattro, a maior autoridade católica no país, não atendeu às solicitações de entrevista feitas por email e por telefone.

Veja o segundo episódio do documentário "Nosso Pai":