Correria e desespero: funcionários narram desmoronamento na Marginal
O operário Luiz Carlos* ajudava a carregar materiais de construção com um colega na obra da linha 6-laranja do metrô, em São Paulo, na última terça-feira (1º), quando ouviu um barulho de água escorrendo seguido por gritaria. Ele estava na superfície e não teve dificuldade de correr para a avenida Santa Marina, na zona oeste, quando foi dado o protocolo de segurança.
Ele já estava fora da obra, com todos os colegas, quando parte da obra à beira da marginal Tietê começou a desmoronar e abriu uma cratera na pista local, no sentido da rodovia Ayrton Senna, entre as pontes do Piqueri e da Freguesia do Ó.
De acordo com o governo de São Paulo, o acidente foi causado pelo rompimento de um túnel de esgoto da Sabesp (Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo) que ficava poucos metros acima de onde a escavadora apelidada de tatuzão passou, por volta das 8h20.
Som de cachoeira, cheiro de esgoto
No primeiro momento, os funcionários achavam que o que estava invadindo a galeria subterrânea era o rio Tietê, que passa próximo à obra, separado apenas pela marginal
"Primeiro foi um barulho forte de água, parecia uma cachoeira. Começou uma correria de um lado para o outro — todo mundo falando 'inundou' - e veio um cheiro muito forte de esgoto, horrível", conta o operário.
Havia cerca de 120 pessoas trabalhando diretamente na galeria onde ocorreu o rompimento. Todas conseguiram sair rapidamente. Apenas quatro tiveram contato com o esgoto e foram atendidas no local. Não houve feridos.
Pouco tempo após o rompimento, antes das 9h, parte da obra começou a desmoronar e invadir a pista local da marginal, que já estava bloqueada, formando uma cratera. Até a noite de terça, antes da contenção, o buraco já havia tomado três das quatro faixas da via.
Este foi o momento mais crítico, segundo os funcionários. "A gente achou que ia cair tudo", conta Paulo Lima*, que também já estava distante da galeria quando ouviu o desmoronamento.
Segundo ele, havia um treinamento para situações de emergência e que foi colocado em prática, sem que os trabalhadores precisassem sair correndo. "Mesmo assim, a gente fica com medo, né? Ninguém sabia o que estava acontecendo."
Não demorou para que os boatos começassem a circular. Da invasão do rio, ao desmoronamento de todo o perímetro da obra, que ligaria as áreas de construção nas duas pontas da avenida Santa Marina, uma distância de 700 com área comercial e residencial - hipótese afastada pela Defesa Civil pouco depois.
No prédio vizinho, a menos de 500 metros do desmoronamento, pelo menos 30 famílias deixaram seus apartamentos quando receberam imagens do buraco. A Defesa Civil só fez uma inspeção - e referendou a segurança do local - quatro horas após o acidente.
Na obra, trabalhadores dizem que ficaram mais tranquilos depois que a Defesa Civil disse que não haveria desmoronamento. Os funcionários que tiveram contato direto com esgoto tiraram licença. Os demais seguiram o trabalho, embora não haja previsão de retomada para a obra.
A reportagem não conseguiu contatar nenhum dos funcionários que estava na parte de baixo da galeria quando houve o rompimento. Entre os funcionários, a ordem é que nenhum deveria falar com a imprensa e todos os posicionamentos deveriam ser dados pelas assessorias de comunicação - por isso a alteração dos nomes.
"Todos os profissionais que estavam no local foram retirados com segurança. A empresa está prestando todo o suporte necessário à equipe e à comunidade", afirmou a Acciona, construtora espanhola responsável pela obra, em nota.
A empresa assumiu a construção da linha 6-laranja em 2020, estreando a parceria plena no formato PPP (Parceria Público Privada) com o governo paulista e, segundo o governador João Doria (PSDB), será responsável por todo o custo de reconstrução da obra e da Marginal.
As causas do acidente ainda estão sendo apuradas. Apesar de não haver prazo de conclusão, até agora nenhuma das partes envolvidas na operação — o governo de São Paulo, a Acciona e a Sabesp — assumiu completamente a responsabilidade pelo buraco.
Cratera foi concretada
A concretagem da cratera que se abriu na Marginal Tietê na manhã de terça-feira (01) foi concluída na noite de ontem. Para preencher a abertura foram usados 4 mil m³ de concreto, o equivalente a 650 caminhões betoneira, informou nota conjunta da STM (Secretaria de Transportes Metropolitanos) com a Sabesp.
Após o processo de reparos, a pista central da marginal foi liberada às 17h de ontem (3), Segundo a STM, o processo "bem-sucedido" de concretagem foi aprovado em avaliação de funcionários do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas).
Com isso, não será necessária a instalação de estacas para contenção da pista, o que aumentaria o prazo para desbloqueio da via para de três a nove dias.
*Os nomes foram alterados a pedido dos trabalhadores para evitar possíveis represálias.
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