'Sentimento de traição', diz irmão de Leandro Bossi após ossada encontrada
A informação de que os fragmentos genéticos de Leandro Bossi, 7, desaparecido desde 1992 em Guaratuba (PR), foram encontrados trouxe revolta para alguns familiares, que acreditam que o desfecho do crime poderia ter sido elucidado na época do crime. A identificação foi confirmada nesta sexta-feira, durante uma entrevista coletiva do Governo do Estado.
A criança sumiu durante um show, no dia 15 de fevereiro de 1992. Naquele mesmo ano, no dia 6 de abril, outro menino, Evandro Caetano, de 6 anos, também desapareceu na região litorânea. Desde então, os casos ficaram sendo tratados como desaparecimentos.
O local onde a ossada atribuída a Leandro Bossi foi encontrada não foi informado. A família acredita que, provavelmente, os restos mortais encontrados há 30 anos, junto ao corpo do garoto Evandro, seriam do garoto Leandro, informação ainda não confirmada. Questionadas sobre o assunto durante coletiva de imprensa, as autoridades do governo do Paraná e da Polícia Civil disseram não poder fazer afirmações sobre a origem da ossada.
À época, uma das ossadas encontradas foi atribuída a uma menina desaparecida. Ainda não há confirmação se os casos têm ligação. A polícia afirma apenas que "a partir dessa informação de hoje, será aberto um inquérito para investigar outras informações, inclusive da menina".
É um sentimento de traição, como se a gente não tivesse direito à Justiça. Toda verdade deveria ser revelada há 30 anos e fomos privados disso. Se era a ossada que existia naquele momento, o que impede de achar que esse exame de DNA de agora não está errado? Ficamos 30 anos sem enterrar o corpo, sem poder fazer algo com aquele saco que só tem 'restinho' dele. Meu pai faleceu sem saber disso, sem enterrar o Leandro. Estamos em um estado de choque.
Lucas Bossi, irmão de Leandro
A mãe de Leandro, Paulina Bossi, também ficou sabendo da confirmação hoje. Ela foi procurada pelo UOL, mas muito abalada, por enquanto, não vai se pronunciar sobre o assunto.
Lucas relembra que, um ano depois foi encontrada uma ossada no mesmo local que estava o corpo do Evandro, a mãe deles foi submetida a um exame de DNA e que a família acreditava que roupas encontradas no local do crime seriam de Leandro.
"Na época, falaram que seria de uma menina, descartando a possibilidade que seria ele. Mas nunca confirmaram se realmente se tratava de uma menina. Até agora, nunca informaram sobre isso. Há uma revolta, mas não vamos confrontar com a polícia. Seria maravilhoso se a gente conseguisse outro exame. No fim, achamos que não existia menina e realmente era o Leandro que estava no local. [...] O que nos resta é essa notícia. Fico muito abalado, estou em choque. Foi uma ligação de 10 minutos que resumiu esse tempo todo", completou.
Nas redes sociais, a irmã de Leandro e Lucas, Neli Steffen Bossi, chegou a classificar o anúncio do governo do Paraná como "uma vergonha".
Meu pai, João Bossi, morreu procurando seu filho, o qual a ossada já havia sido encontrada há 30 anos e diziam ser de uma menina.
Neli Steffen Bossi, irmã de Leandro
Investigação
A identificação da criança é resultado da integração entre as forças de segurança e foi possível após a coleta das amostras de fragmentos armazenados na Polícia Científica e o confronto com o DNA de familiares do menino.
Segundo a chefe do Serviço de Investigação de Crianças Desaparecidas (Sicride), delegada Patrícia Nobre, o exame foi complexo e exigiu apoio da tecnologia. "Essas investigações aconteceram desde 1992 e o Sicride deu continuidade na localização da criança desaparecida. Foi feito esse exame depois de tanto tempo; não foi fácil, são exames mais complexos e, após os resultados, tivemos a resposta que teria a compatibilidade".
A perícia comprovou 99,9% de compatibilidade da amostra analisada com o material coletado da mãe de Leandro. No total, foram oito amostras analisadas.
De acordo com o Governo Estadual, a resolução é fruto do trabalho do banco genético do Estado, que integra a Campanha Nacional de Coleta de DNA de Pessoas Vivas Sem Identificação, do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
"É um trabalho que tem avançado com mais celeridade nos últimos anos. A integração das forças de segurança e o trabalho em parceria com a União, além dos avanços tecnológicos, estão ajudando o Estado a responder casos complexos e que demandavam resposta", afirma o secretário de Segurança Pública, Wagner Mesquita.
Procurado pelo UOL para esclarecer quando e onde a ossada de Leandro Bossi foi encontrada, o governo do Paraná se limitou a responder que "o inquérito do desaparecimento de Leandro Bossi, de 30 anos atrás, foi arquivado pelo Ministério Público, naquela época. Informações complementares sobre o caso dependem do acesso ao inquérito".
As Bruxas de Guaratuba
O caso dos desaparecimentos de Leandro e Evandro ficou conhecido como "As Bruxas de Guaratuba" e teve repercussão em todo o país. Após alguns dias do sumiço, um corpo foi encontrado em um matagal em Guaratuba, no litoral do estado, com órgãos arrancados e pés e mãos cortados durante um ritual de magia negra.
Inicialmente, durante as investigações na época, para a polícia e para o Ministério Público do Paraná (MPPR), o corpo encontrado seria de Evandro. De acordo com as apurações, os responsáveis pela morte foram:
- Beatriz e Celina Abagge, filha e esposa do então prefeito de Guaratuba em 1992, Aldo Abagge;
- Osvaldo Marcineiro, pai de santo;
- Vicente de Paula Ferreira, ajudante do pai de santo;
- Davi dos Santos Soares, artesão e vice-presidente da associação de artesãos de Guaratuba em 1992;
- Francisco Sérgio Cristofolini, vizinho do prefeito;
- Airton Bardelli dos Santos, funcionário da serraria da família Abagge.
Em um primeiro momento, os sete acusados confessaram o crime e foram condenados. Porém, depois alegaram que as declarações foram feitas mediante tortura, conforme fitas obtidas pelo jornalista Ivan Mizanzuk, em 2020, cujo podcast foi adaptado para a série "O caso Evandro", da Globoplay.
No mesmo ano, em 2020, o processo do desaparecimento de Leandro foi arquivado por causa do tempo, já que, por lei, o a investigação prescreve em 20 anos, de acordo com o Ministério Público do Paraná.
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