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Defensoria pede que Funai tire nota contra Univaja do ar: Tom intimidatório

Bruno Arújo (à esq.) e Dom Phillips estão desaparecidos desde o dia 05/06 - BBC
Bruno Arújo (à esq.) e Dom Phillips estão desaparecidos desde o dia 05/06 Imagem: BBC

Do UOL, em São Paulo

14/06/2022 23h05Atualizada em 14/06/2022 23h19

A DPU (Defensoria Pública da União) solicitou que a Funai (Fundação Nacional do Índio) retire do ar uma nota "com efetiva violação de direitos humanos" veiculada no último dia 10 sobre o desaparecimento do jornalista britânico Dom Phillips e de Bruno Araújo Pereira, servidor licenciado da Funai, desaparecidos desde o dia 5 de junho na região do Vale do Javari, oeste do Amazonas. Segundo a Defensoria, a nota também ataca e tem "tom intimidatório" contra a Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari).

Segundo o pedido, a nota da Funai foi uma resposta à nota de esclarecimento da Univaja que explicou sobre o cumprimento do protocolo contra a covid-19 nas áreas indígenas da região. O texto também apontou que Bruno tinha a autorização da Coordenação Regional da Funai no Vale do Javari para se movimentar no local.

"Em sua nota, a Univaja também deixa claro que o intuito do ingresso à terra indígena era justamente a capacitação dos indígenas e a execução dessas práticas de campo junto com o conhecimento indígena para a proteção do território e da autonomia dos povos do Vale do Javari", disse a Defensoria.

No texto da Funai, veiculado no último dia 10, o órgão aponta que há "inverídicas" informações na nota da Univaja e nega que Bruno e Dom tivessem autorização para entrar em terras indígenas. A fundação ainda discorre que "as medidas sanitárias precisariam ser adotadas, bem como a Funai informada" sobre o acesso para evitar a contaminação pela covid-19 pelos indígenas.

"A Funai irá acionar o Ministério Público Federal (MPF) para que seja apurada a responsabilidade da Univaja quanto à possível aproximação com indígenas de recente contato sem o conhecimento da instituição e, aparentemente, sem a adoção das medidas sanitárias cabíveis, entre elas, a realização de PCR e de quarentena de 14 dias", afirmou a Funai em nota veiculada no dia 10.

A Defensoria criticou a nota da Funai por usar argumentos no âmbito da covid-19 para minimizar o trabalho realizado por Bruno e Dom na região.

Ao contestar apenas com argumentos que objetivam atribuir a Bruno e Dom responsabilidade por potenciais contágios de COVID-19 e supostos danos à saúde indígena, resumindo o trabalho investigativo e capacitador de ambos no local à pura aventura desautorizada, consubstancia-se grave violação aos direitos humanos, isto é, não encerra apenas ofensa aos direitos dos desaparecidos, mas também os dos grupos que eles defendem e protegem e de seus familiares, que sofrem com sua ausência. Tais declarações da presidência da Funai geram ainda mais sofrimento e revolta em todos/as amigos/as e familiares. Defensoria Pública da União rebate nota da Funai

Nos argumentos, a Defensoria continua: "A alegação da Funai não tem qualquer respaldo no ordenamento jurídico e carece até mesmo de lógica e sentido. A se trilhar este raciocínio esposado pela Funai, qualquer pessoa que for dialogar com um indígena em Tabatinga ou Atalaia do Norte, por exemplo, áreas que não fazem parte da terra indígena do Vale do Javari, mas dela estão próximas, deverá comunicar o fato previamente a Funai".

"Não é preciso maiores esforços interpretativos para se concluir que tal assertiva é grotesca. Esta mensagem contida na nota provoca confusão e perplexidade e, vez que emitida pela Presidência da Autarquia, sua manutenção se revela especialmente mais danosa, razão pela qual deve ser retirada do ar imediatamente", completou.

Os defensores ainda questionam o porquê a Funai vai acionar o MPF contra a Univaja, sendo que nesse momento os esforços deveriam estar focados em achar o indigenista e o jornalista. Eles ainda citaram que a Coordenadora Substituta da Coordenação Regional da Funai no Vale do Javari recebeu solicitação da assessoria da Presidência da fundação para seja enviada toda a
documentação física, em caráter de urgência, no processo sobre a autorização de pessoas jurídicas na terra indígena.

Assim, percebe-se que o foco principal da Presidência da Funai não parece ser realmente encontrar os desaparecidos, mas apurar como se deu a autorização de ingresso do indigenista Bruno Pereira. É importante ressaltar que o órgão indigenista até poderia verificar como se deu a autorização de ingresso do servidor licenciado e indigenista renomado na terra indígena do Vale do Javari, não é este o ponto. Todavia, nesse momento, tal atitude é contraditória com o que se espera de uma instituição que deveria estar toda
mobilizada para encontrar Bruno Pereira e Dom Phillips.
Defensoria

Outras solicitações da Defensoria

Além do pedido de retirada da nota do ar, a Defensoria ainda solicitou que:

  • Que durante as buscas aos desaparecidos a Funai "não adote qualquer comportamento que busque desacreditar a trajetória do indigenista Bruno da Cunha Araújo Pereira e do Jornalista Dom Phillips";

  • Que a Funai/Presidência da Funai se abstenha de praticar qualquer ato que possa ser "considerado atentatório a dignidade dos desaparecidos ou que implique injusta perseguição à Univaja ou aos servidores da Funai no Vale do Javari";
  • Que seja determinado o envio imediato de forças de segurança pública específicas para a garantir a integridade física dos servidores da Funai e dos povos indígenas em todas as Bases de Proteção do Vale do Javari -- Quixito, Curuçá e Jandiatuba; e
  • O envio imediato de força tarefa de servidores da Funai e outros outros servidores que se mostrarem necessários para o apoio aos servidores e às atividades das Coordenadorias Regionais.

Onde o indigenista e o jornalista desapareceram - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL