Professora sofre racismo e alunos acham suástica em escola em SP
A professora Ana Paula Pereira Gomes, 41, foi chamada de "macaca" na lista de presença de uma das turmas para a qual dá aula. O caso aconteceu no último dia 24 em uma turma do do 2º ano do Ensino Médio na Escola Municipal Professor Linneu Prestes, localizada em Santo Amaro, na zona sul da cidade de São Paulo.
Uma semana depois, alunos encontraram dois símbolos nazistas em uma mesa: uma suástica e um SS, que se refere à polícia ligada ao Partido Nazista, líder nazista Adolf Hitler.
Procurada, por meio da Secretaria Municipal da Educação, a prefeitura informou que "repudia qualquer ato de discriminação e racismo" e que a Diretoria Regional de Ensino "instaurou apuração interna".
Racismo na lista de presença. Ana é professora na rede municipal desde 2013 e leciona na Linneu Prestes desde 2017. Ela abriu um boletim de ocorrências na Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância) por causa do episódio.
Em 24 de outubro, a professora foi avisada por um colega que, no lugar do seu nome havia a palavra "macaca", na lista de presença dos alunos de uma das turmas do 2º ano do Ensino Médio. Nela, cada professor coloca seu nome no dia que irá dar a disciplina.
"Isso chegou ao conhecimento de uma colega. Ela entendeu que se referia a mim porque estava no local onde ficaria o meu nome na aula que seria dada no dia seguinte. Ela apresentou até a direção e aguardou que tomassem as providências", explicou.
"Às 15h do mesmo dia, outro colega viu a coluna correspondente ao meu nome e me avisou. Os alunos já estavam falando sobre a ofensa racista. Eu fiquei chocada, disse que não sabia do que ele estava falando. Fui atrás da lista para entender do que se tratava", completou.
Ana só conseguiu acessar a lista por volta das 17h daquele dia com o o diretor da escola. "Eu vi a lista que estava na mesa dele."
Sem conseguir raciocinar direito, comecei a problematizar o racismo na escola, que não era algo novo. Comecei a insistir com ele que era necessário que tivéssemos uma resposta institucional, que os estudantes precisavam entender que não era a professora falando do combate ao racismo, se tratava da escola
Ana Paula Pereira Gomes, professora
Ana, o diretor e mais dois professores foram até a sala onde a lista foi assinada avisar que aquela situação era um crime.
Os símbolos nazistas. Uma semana depois do caso de racismo vivenciado pela professora, um dos alunos, integrante do Grêmio Estudantil, encontrou os símbolos nazistas depois de conversar com uma aluna do 1º ano. O aluno, que é um adolescente trans e negro, pediu para não ser identificado, mas conversou com a reportagem.
Preocupados com os desenhos, os alunos procuraram Ana, "que é uma das únicas que dá atenção para essas coisas [pautas raciais e de gênero]", afirmou o aluno, que está no último ano do Ensino Médio. "Se levássemos para a diretoria, eles simplesmente apagariam [os símbolos]. Até agora, o diretor não passou nas salas de aula para conversar sobre isso."
A professora Ana conta que, até o momento, ninguém foi identificado, nem pela ofensa racista contra ela nem pelos desenhos dos símbolos nazistas. "Não sabemos ainda se as duas situações têm relação."
Professora afirma que escola precisa se posicionar. Para a docente, ambas as situações devem servir de alerta para a escola "se posicionar em relação ao modelo de escola que nós queremos".
Em uma reunião na escola, inclusive, Ana afirma que ouviu que "isso podia ser só uma brincadeira de mau gosto". Para ela, a "escola tem que declarar que não quer formar cidadãos racistas, violentos, nazistas, transfóbicos, que discriminam pessoas com deficiência".
A escola, enquanto instituição responsável pela formação cidadã dessas pessoas, precisa dimensionar a gravidade do que significa normalizar ou trazer para rotina símbolos que representam discursos de ódio e o extermínio de povos inteiros. De milhões de pessoas
Ana Paula, professora de sociologia vítima de racismo
Para a docente, a situação é extremamente grave e é preciso identificar onde os alunos estão aprendendo tais práticas: se em casa ou em outras interações sociais. Caso seja influência dos pais, Ana avalia que a escola precisa intervir. "Os pais podem ter a opinião que quiserem, mas eles não têm autoridade legal para formar filhos racistas ou nazistas."
"E, no caso de alunos negros, LGBTs, com deficiência, os responsáveis têm o direito de saber que seus filhos podem estar em risco. Não tem como garantirmos que alguém que desenha uma suástica ou que se sinta confortável para ser racista com uma professora não seja capaz de violências maiores", completou a docente.
Escola tem histórico de racismo e transfobia
O aluno ouvido pelo UOL Notícias também contou que esses não foram os primeiros casos de racismo da escola nos últimos meses. "Foram quatro casos no total. Todos os casos foram passado para debaixo do tapete, exceto o da professora, que não se calou", disse.
"Um dos alunos chegou a fazer uma denúncia na delegacia, mas o caso está em sigilo, não sabemos quem fez. Eu ouvi o policial falando com a inspetora que um aluno fez uma denúncia contra um professor, que foi racista com ele. Também uma aluna que foi chamada de 'macaca' e outro aluno foi chamado de 'macaco' por outros alunos", completou. "Os alunos precisam entender que é na escola que se começa a desconstrução antirracista."
Um dos poucos alunos trans da escola, o estudante também conta que vive situações de preconceito todos os dias, a maioria feita pelos próprios funcionários. "Quando eu entrei na escola, a escola deixou claro que não sabia lidar com pessoas trans. É o erro do pronome, e se incomodar e querer impedir que eu use o banheiro masculino, que é o banheiro do gênero que eu me identifico".
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