Lixo revirado: como delegado descobriu envolvimento de Suzane Richthofen
Presa desde 2002 pelo assassinato de seus pais, Suzane Von Richthofen foi solta ontem após a Justiça conceder progressão ao regime aberto. Marísia e Manfred Von Richthofen foram mortos no quarto onde dormiam em 31 de outubro de 2002. O envolvimento da filha do casal no crime fez o país acompanhar com atenção todos os desdobramentos do caso.
Como foi a investigação
- Cristian Cravinhos, irmão de Daniel -- namorado de Suzane -- confessou ao ex-delegado da Polícia Civil de São Paulo José Masi a participação no assassinato do casal Richthofen, abrindo as portas para elucidar o caso.
Desde que chegaram ao DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa), o comportamento deles não me convenceu. A Suzane e o Daniel trocavam beijinhos ao se cruzarem no corredor, um chamava o outro de benzinho, um comportamento que não era esperado de quem tinha acabado de perder pai e mãe
José Masi, ex-delegado de Polícia Civil
- Não havia sinal em Suzane de desespero nem preocupação com o futuro, segundo o delegado
Quando sentou no sofá ao lado do Daniel, ela jogou sua perna sobre a perna dele, um gesto revelador de cumplicidade
José Masi, ex-delegado de Polícia Civil
- Quatro dias depois do crime, o delegado decidiu fazer nova inspeção no lixo da mansão e encontrou as caixas vazias das joias da família que tinham sido "roubadas" pelos supostos assassinos do casal.
A Suzane se aproximou e pediu para ficar com a caixa de joias como uma recordação. Nesse momento, tive a clara percepção de que ela sabia onde estavam as joias 'roubadas'
José Masi, ex-delegado de Polícia Civil
- Depois que eles confessaram os crimes, parte das joias foi recuperada em uma chácara da família Richthofen, na região de Sorocaba.
Quando chegamos à casa, vimos o local e conversamos com um tio dela, e ele achou esquisito o irmão não ter deixado ligado o alarme
Ricardo Guanaes, delegado do Departamento de Homicídios que esteve na casa logo após o crime
- Um tio contou que as discussões entre pais e filha se davam pelo namoro da menina, "mas ele disse que isso já havia sido superado", lembrou o delegado
- O delegado foi com sua equipe para a casa do namorado, e o que chamou sua atenção foi a aliança de noivado no dedo dela.
Se o problema do namoro estava superado, por que a aliança do noivado logo depois da morte dos pais?
Ricardo Guanaes, do Departamento de Homicídios
- O método da polícia foi levar cada um para uma sala e ouvir suas versões, para confrontá-las.
- O delegado disse que percebia que a história estava bem ensaiada e que Suzane e o namorado estavam escondendo muita coisa, o que depois se confirmou.
Participação 'decisiva' de Suzane
- A denúncia do Ministério Público de São Paulo foi apresentada ao 1º Tribunal do Júri da capital.
- Ela descreveu de forma detalhada os acontecimentos daquele 31 de outubro de 2002.
- O crime aconteceu por volta da meia-noite, na casa da rua Zacarias de Góis, no bairro Campo Belo, em São Paulo.
- Daniel Cravinhos de Paula e Silva e seu irmão, Cristian Cravinhos de Paula e Silva, desferiram diversos golpes de porretes que causaram em Manfred e Marísia, "ferimentos suficientes a lhes causarem a morte".
- Contaram com a participação "valiosa e decisiva" da filha Suzane.
As tensões geradas pelo conflito em torno do namoro da filha culminaram com o uso de força física por Manfred e com promessas de deserdação dela, caso não desse fim ao namoro. Com isso, o casal passou a nutrir a intenção de eliminar os pais dela
Denúncia apresentada pelo MP-SP
- Com a habilidade adquirida na confecção de aeromodelos, Daniel fabricou os porretes que seriam usados para matar o casal.
- Já Suzane apanhou as luvas cirúrgicas da mãe que seriam usadas para não deixar marcas da ação.
- Cristian foi chamado para ajudar em troca do dinheiro que havia na mansão.
- No dia do crime, os três já sabiam que os pais estariam dormindo. Ela entrou primeiro, certificou-se desse fato e chamou os dois, que esperavam do lado de fora.
- Com os rostos cobertos por meias-calças e usando luvas, os irmãos desferiram os golpes contra as cabeças das vítimas. Daniel atacou Manfred, Cristian matou Marísia.
- Conforme o laudo da perícia, as porretadas foram tão violentas que pedaços de ossos e massa encefálica se espalharam pelo quarto.
- Para certificar-se da morte de ambos, Cristian enfiou uma toalha na cabeça de Marísia e a envolveu com um saco plástico. Daniel usou uma toalha molhada para cobrir a cabeça e impedir a respiração de Manfred.
- Depois foi em busca de um revólver que sabia existir na casa e deixou ao lado do corpo do homem.
- Enquanto a dupla matava o casal, Suzane se ocupava de criar um cenário de roubo, espalhando as joias da mãe pela casa -- algumas foram levadas por Cristian.
- Ela sabia onde a mãe guardava valores em moeda estrangeira, deu uma parte para Cristian e ficou com um pouco para suas despesas.
- Depois de trocarem de roupa e se desfazerem dos trajes ensanguentados e dos porretes, o trio deixou a casa de carro. Cristian foi deixado próximo à sua casa, Daniel e Suzane foram para um motel.
- Uma hora depois, Suzane saiu e passou em um cibercafé para pegar o irmão mais novo, "ali propositadamente deixado para que não atrapalhasse eventualmente os planos do trio".
- De volta à casa, continuou com a encenação do assalto, chamando primeiro o namorado, seu cúmplice, depois a polícia.
- A denúncia concluiu que Suzane e Daniel agiram embalados por motivação torpe, ela para se vingar dos pais ante a proibição do namoro, ele com a perspectiva de uma vida confortável com a herança que receberia. Cristian agiu motivado pelo pagamento em dinheiro.
Dificilmente a Justiça e a sociedade irão se deparar com um caso tão claro em que a responsabilidade penal dos acusados ficou cabalmente demonstrada. A polícia fez um trabalho de investigação exemplar, o que levou os réus a confessarem. É verdade que eles procuraram mitigar os fatos, dizendo que a Suzane teria sofrido violência por parte do pai, mas isso nunca se provou."
Alberto Zacharias Toron, advogado que atuou como assistente de acusação, auxiliando a promotoria a demonstrar a culpa dos réus
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