Jornalista relata apagão de memória por 8h: 'Mandei áudios me despedindo'
O jornalista Sidney Gusman, de 56 anos, era uma pessoa que praticava exercícios físicos regulares e tinha os exames em dia quando sofreu um dos maiores sustos de sua vida: um apagão que o deixou oito horas "fora do ar".
Durante esse período, continuava conversando com amigos e familiares, mas sem conseguir lembrar o que tinha feito nas horas anteriores e repetindo as mesmas perguntas várias vezes.
Chegou a ficar convencido de que estava sofrendo um derrame.
Apaixonado por quadrinhos, Sidney é responsável pelo planejamento editorial da Maurício de Sousa Produções, do criador da Turma da Mônica, e tinha acabado de deixar o estande da Panini, que publica histórias da empresa, na Bienal do Livro de São Paulo.
Estava feliz, lembra, apesar da agenda pesada no evento, que aconteceu em julho de 2022. Ainda assim, seu corpo enviou um sinal de alerta.
O diagnóstico para o apagão veio bem mais tarde: TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada).
Não teve absolutamente nada de diferente na minha rotina, mas o que eu senti foi um cansaço muito grande. Dois amigos editores me encontraram na Bienal, me abraçaram e falaram: 'Sidão, a gente está preocupado com você, você está em um ritmo muito punk'. Eu sentia que meu corpo estava me avisando do cansaço, mas não esperava que ia acontecer algo naquela noite."
Sidney Gusman, ao UOL
Os médicos que atenderam Sidney explicaram que apenas uma coisa diferenciava o seu diagnóstico do burnout — uma espécie de estresse crônico ligado à exaustão: o jornalista ama seu trabalho e atrela até o seu lazer a ele.
No caso do TAG, explica o site do médico Dráuzio Varella, as principais característica é a "preocupação excessiva" persistente e de difícil controle, que perdura por seis meses no mínimo e vem acompanhada por três ou mais dos seguintes sintomas:
- inquietação
- fadiga
- irritabilidade
- dificuldade de concentração
- tensão muscular
- perturbação do sono
Outra característica é a reação desproporcional com acontecimentos do cotidiano. Pessoas de todas as idades podem apresentar o TAG, com incidência levemente maior entre mulheres.
Sidney dormia apenas de 3 a 4 horas por noite, sem descansar de fato, chegando a sonhar com o trabalho.
Além disso, ele assume que sempre foi muito estressado, inclusive ao interagir com pessoas na internet, rebatendo comentários desagradáveis, mesmo que sua rotina do dia a dia, que incluía palestras e eventos de livros, o deixasse satisfeito.
As demandas estavam normais. E o mais estranho, que eu falei para os médicos, é que aconteceu quando eu estava muito feliz por palestrar com meus autores. Mas eles me explicaram que felicidade também gera uma espécie de 'estresse do bem'. À noite, tive o apagão e não lembrava inclusive que tinha estado na Bienal. Eu olhava meus stories e ficava: 'Não vivi isso'"
Ao perceberem a confusão, sua esposa e filho o acompanharam até um hospital na capital paulista. No caminho, ele falava apenas de trabalho, repetindo sempre as mesmas perguntas.
Mandei um áudio para os caras [seus sócios] me despedindo. Felizmente, meu filho pegou o aparelho e apagou, porque eu ia enfartar todo mundo. Só que eu não lembro de nada disso, a sensação é de que tinha alguém falando por mim"
No hospital, ele fez exames e começou a ter a memória de volta - mas sem as oito horas do "apagão".
Eles me deram uma injeção para eu apagar e eu nem pisquei, de tão 'adrenalizado' que eu estava. Tive que entrar na máquina de tomografia acordado, acompanhado da minha esposa usando uma roupa de chumbo, porque eu não parava quieto
Mudança de hábitos
Foi quando viu o resultado dos exames e ouviu da neurologista que ele era uma 'bomba relógio' que decidiu prestar mais atenção à rotina. Desde então, foca mais o lazer, desliga quando precisa, monitora o sono e o estresse.
"Ainda trabalho muito, mas em um ritmo mais planejado", conta. "Monitoro tudo com um psiquiatra e tomo remédio para o TAG. Tenho sido bem rigoroso com a mudança de estilo de vida."
Foram sete meses de tratamento. Hoje, dorme sempre mais de seis horas por noite, adotou o home office duas vezes por semana para evitar a ansiedade causada pelo trânsito e usa os sábados para descansar, encontrar os amigos e viajar a lazer.
Eu sou um cara forte, bem fisicamente, mas não tem essa... Quando o corpo quer te parar, ele te para. Eu tive que colocar o pé no freio. Sou o cara que cuida de tudo e todo mundo, mas o médico me perguntou: quem cuida dos cuidadores? E eu estou me permitindo ser cuidado."
O jornalista agora tenta passar uma mensagem para quem o acompanha: "ouça os sinais que o seu corpo e as pessoas que gostam de você estão te dando".
Além disso, diz, vale fazer o exercício de pensar naquilo que está te deixando nervoso: o que isso vai representar na sua vida em um ano? "Se não for representar nada, não fique."
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