'Alma gela quando ouço estrondo': avanço de cratera assusta moradores de SP

A enorme cratera que se abriu na pequena cidade de Lupércio, a 32 quilômetros de distância da cidade de Marília, no interior de São Paulo, não é novidade para os moradores. Desde 2007, quando o buraco surgiu, o problema se arrasta, sem solução, e a preocupação vai desde o risco de desabamento dos imóveis até a desvalorização das residências no mercado imobiliário.

O que se sabe:

Com o passar dos anos e sem os cuidados necessários, a cratera, que fica num talude em uma área desabitada, aumentou de tamanho e está cada vez mais próxima das residências da região central da cidade, que possui 3.900 habitantes, segundo o censo de 2020 do IBGE.

Apesar de ter se iniciado em 2007, o problema só veio à tona recentemente. A população local evita tocar no assunto com gente que não é da cidade. Cerca de metade dos menos de 4.000 moradores vive na região central e muitos munícipes dependem de boas relações com a administração municipal e com membros do Legislativo. Falar da voçoroca, como é chamado o fenômeno que causa a cratera, é um assunto "delicado".

A gente acaba evitando falar sobre isso. A gente depende de boas relações com todo mundo, nos negócios, no convívio, no dia a dia. Aqui quase todo mundo se conhece, disse uma moradora que pediu para não ser identificada.

Ela mora a cerca de 300 metros do epicentro do fenômeno e diz que há mais de 15 anos sua alma sempre "gela" toda vez que chove e ela ouve estrondos vindos daquela direção.

Tenho amigas que moram próximo à cratera. A gente sente medo todo dia, ainda mais quando a chuva é forte. É como um fantasma, que nos atormenta há anos.

O professor Márcio Martins mora longe dessa área, mas mantém um imóvel de valor elevado próximo à cratera, que aluga para empresas.

Não se trata de algo novo. Esse é um problema antigo que vem sendo passado adiante por diversas administrações. Nós, moradores, somos informados de que estão tomando providências agora. Mesmo assim, há uma preocupação de quem tem imóveis nas proximidades da cratera. Márcio Martins, professor.

A preocupação, explica Martins, é da cratera ceder ainda mais e avançar na direção da cidade. Com atuais 300 metros de comprimento, 25 metros de largura e 15 metros de profundidade, ela ameaça engolir residências inteiras, caso se expanda. "Vi imagens feitas por drone, não parece estar tão próxima. Mesmo assim, as pessoas estão preocupadas", diz o professor.

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Assombrados pela interdição

O atendente comercial Acássio Tavares, 46, que mora em uma rua a cerca de três quarteirões da cratera, diz que os moradores mais próximos do problema estão preocupados com a possibilidade de interdição dos imóveis por conta de possíveis riscos estruturais. Ele lembra que a cidade já havia enfrentado um problema parecido, na Rua Joaquim Teodoro Tavares. A erosão quase chegou à rua também, mas a cratera que se formou era de proporções muito menores que a atual.

A situação é preocupante e se agravou por não ter sido feita a contenção quando a cratera ainda era pequena. Com o tempo, ela foi aumentando. Hoje, quem mora próximo ao local, teria dificuldade em vender seu imóvel. As pessoas convivem com o medo de terem as casas interditadas, ou até mesmo desapropriadas, enquanto aguardam providências. Acássio Tavares, atendente comercial.

A preocupação de Acássio com o mercado imobiliário é real e legítima, segundo o empresário do ramo, Anibal Costa, que há muitos anos atua na região. "Na visão do profissional, o avanço da voçoroca já começa a refletir no mercado de imóveis na cidade. Está havendo um recuo dos interessados e, em consequência, os valores dos imóveis estão sendo afetados".

Terreno particular

A prefeitura diz que vem tentando contato com os proprietários das terras, registradas no Incra como Fazenda Nossa Senhora de Lourdes, mas sem sucesso. Os donos pertencem a uma família muito conhecida na região.

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A ausência de uma reação dos proprietários levou a prefeitura a decretar a desapropriação parcial da gleba, no dia 16 de abril. O decreto 35/2004 justifica a medida como necessária, ?para utilização de captação de águas pluviais, obras de contenção e recuperação de solo?.

Porém, para o vereador Gabriel Henrique Costa dos Santos, que mora em um imóvel próximo à cratera, a desapropriação não seria necessária, bastando ao Executivo acionar o seu 'poder de polícia', premissa prevista em determinadas situações na administração pública.

Poderiam ter usado o poder de polícia ou a servidão de passagem [um direito real que obriga o proprietário de um imóvel a permitir que outras pessoas transitem por parte do seu imóvel], o que permitiria a entrada do Poder Público no terreno. De qualquer forma, aprovamos um crédito adicional de R$ 114 mil para a desapropriação. Gabriel Henrique Costa dos Santos, vereador.

Santos acredita que o fato dos proprietários pertencerem a uma família conhecida na região pode ter influenciado no adiamento de uma resolução. "Acredito que tudo tenha um viés político".

Na quinta-feira (25), técnicos do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) e da Defesa Civil do Estado de São Paulo estiveram no local para uma inspeção detalhada. O resultado das análises será emitido dentro de alguns dias.

Em nota, a Defesa Civil do Estado informou não haver necessidade de evacuação das residências próximas à voçoroca porque, recentemente, a prefeitura de Lupércio tomou medidas de contenção que conseguiram retardar o aumento da erosão, "afastando o risco iminente para os moradores".

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A formação da cratera é atribuída a uma falha em uma galeria pluvial. Esse problema de infraestrutura permitiu que as águas das chuvas erodissem o solo de maneira agressiva, resultando em um avanço da erosão na área.

Ainda segundo o órgão, a cidade aguarda a autorização judicial para prosseguir com as obras públicas necessárias, já que o local é de propriedade privada. O governo do estado já manifestou apoio às ações da Defesa Civil, condicionando sua continuidade à "segurança jurídica requerida".

A voçoroca é um tipo de erosão intensa que forma grandes buracos no solo devido à ação da água da chuva sobre terrenos vulneráveis. Esse fenômeno pode crescer progressivamente se não for controlado, levando à destruição de grandes áreas de terra, comprometendo propriedades e a segurança dos moradores.

O UOL entrou em contato com o prefeito de Lupércio, Cleber Menegucci, para obter mais informações, mas até o momento ele não havia respondido aos questionamentos. O espaço segue aberto para manifestação.

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