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Leia a íntegra da sabatina UOL e Folha com Mara Gabrilli, vice de Tebet

Do UOL, em São Paulo

26/09/2022 11h38

A senadora Mara Gabrilli (PSDB) foi a primeira a participar das sabatinas UOL e Folha de S.Paulo com os candidatos a vice-presidente. Ela está na chapa de na chapa de Simone Tebet (MDB).

Os próximos sabatinados serão: Ana Paula Matos (PDT), vice de Ciro Gomes (PDT), e Geraldo Alckmin (PSB), vice de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Braga Netto (PL), vice do Jair Bolsonaro (PL), ainda não confirmou.

Leia a seguir a íntegra da sabatina com Mara Gabrilli:

[Kennedy Alencar]: Olá, bom dia. Começa agora a sabatina do UOL e da Folha de São Paulo com a senadora Mara Gabrilli, do PSDB, de São Paulo. Ela é candidata a vice-presidente na chapa de Simone Tebet, do MDB. Na quarta-feira, será sabatinada a candidata a vice-presidente do Ciro Gomes, Ana Paula Matos. Ela também é do PDT, como o Ciro. Na quinta-feira, o entrevistado será o ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSB. Ele é candidato a vice de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT. Braga Netto, candidato a vice do presidente Jair Bolsonaro, foi convidado, mas ainda não respondeu. E vão participar dessa sabatina comigo a jornalista Fernanda Mena, da Folha de São Paulo, e o jornalista Leonardo Sakamoto, do Uol. Eu quero dar bom dia aos meus colegas e à senadora. Bom dia, Fernanda.

[Fernanda Mena]: Bom dia, Kennedy. Bom dia, senadora. Bom dia a quem nos acompanha.

[Kennedy Alencar]: Bom dia, Sakamoto.

[Leonardo Sakamoto]: Bom dia, Kennedy, Fernanda. Bom dia, senadora. Obrigado pela presença.

[Kennedy Alencar]: Senadora, bom dia para a senhora.

[Mara Gabrilli]: Bom dia, Kennedy. Muito obrigada pela oportunidade.

[Kennedy Alencar]: Nós é que agradecemos à presença da senhora aqui, nessa sabatina. Senadora, vou começar falando com a senhora sobre a questão democrática. A violência reapareceu no cenário brasileiro, em um grau nunca visto antes desde a redemocratização. A gente teve a morte de dois eleitores do Lula por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. Nas últimas semanas, pesquisadores foram agredidos, há ataques à reputação de figuras públicas: jornalistas, políticos, um clima muito duro. A senhora vê risco de uma escalada de violência nessa reta final? E quem é responsável por essa atmosfera política? A partir de agora, a senhora tem uma hora, senadora?

[Mara Gabrilli]: Bom, eu acho que o responsável por essa escalada política tem sido o nosso Presidente da República, fomentando a discórdia, fomentando a raiva, fomentando o ressentimento e a violência. Eu sempre acredito que um Presidente da República tem que ser uma figura que dê exemplo à população, porque as pessoas realmente seguem o exemplo de um mandatário dessa envergadura. Então, isso me deixa bastante frustrada, por estar passando por um momento desse. Acho que o próprio Brasil tem se preocupado com essa escalada da violência. Com relação a essa semana, o que eu posso te dizer é que eu realmente espero que não aconteça uma escalada da violência e que a gente tenha batido no teto da violência, porque isso acaba prejudicando até as propostas. Se a gente observar o que vem acontecendo, por exemplo, nos debates, a gente perde muito tempo por conta de briguinha, de falar de violência do que de falar de propostas, né? Então o que eu posso te dizer é que eu espero que a violência não escale e que não exceda o que a gente já vem vivendo. Acho que eu e a Simone, nesse aspecto, a gente vem tentando trazer o contraponto, o paradoxal de toda essa violência, até trazendo uma mensagem de união do país; e união com amor, com coragem, ao invés de separar o Brasil com raiva, com violência. Isso tem feito parte mesmo da nossa fala. Inclusive falar de amor, que parece piegas, mas a gente está em um momento em que o Brasil está precisando, o Brasil está sofrendo, então, a gente tem violência de todos os tipos acontecendo no Brasil, né? E essa violência a que você se referiu, ela também é um fruto, sabe? A pessoa quando passa fome, entendeu, a gente pode imaginar o que vem no coração dessa pessoa? Com certeza, não é tanto o amor. É muito mais a raiva. Estar desempregado, você também fica beirando sentimentos de ressentimento, então, acho que o Brasil convergiu para um momento de violência, impulsionado pelas atitudes do presidente, mas pela própria situação do atual momento que a gente vive.

[Fernanda Mena]: Senadora, a senhora acredita que essa convergência a qual a senhora se referiu, implica em um risco real de uma tentativa de golpe do Presidente no caso de derrota nas eleições, ou de um tumulto, como o episódio da invasão do Capitólio, no Congresso Americano dos Estados Unidos, que fracassou, mas que resultou na morte de cinco pessoas, em qualquer um desses cenários, a senhora acredita no endosso de setores da ativa das Forças Armadas a esse movimento?

[Mara Gabrilli]: Eu acredito nas Forças Armadas, que têm razoabilidade num momento como esse. E eu espero que a gente não tenha uma ação parecida com o que aconteceu nos Estados Unidos, e também não acho que o presidente tenha atualmente uma força pra causar uma rebelião dessa envergadura.

[Leonardo Sakamoto]: Senadora, integrantes do seu partido, PSDB, muitos deles próximos, inclusive, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, declararam voto em Lula nas últimas semanas. O próprio ex-presidente fez uma manifestação, nas redes sociais que, por alguns, foi entendida como apoio a Lula nesse processo, mesmo sem citar o petista, né? Por que uma parcela do PSDB está apoiando Lula no primeiro turno sendo que tem a chapa em que a senhora é vice?

[Mara Gabrilli]: Poxa, Sakamoto, porque acho que a gente vem já de um caminho, né, pra Simone conseguir chegar a candidata de presidência da República, ela teve que passar por tantos obstáculos, e foram tantas as parcerias que foram feitas. Por exemplo, vide o governador de São Paulo, que tá na federação que tem a União Brasil e que tem uma outra candidata à presidência da República. E eu acho que o que tá acontecendo no país é que muita gente tá votando, tá pensando em eleger com medo e não com o coração, sabe? E trabalhando pelo menos pior, né? Eu vejo isso com muita tristeza porque eu acho que o primeiro turno é o momento de você conhecer a trajetória de cada postulante, de você mergulhar fundo nas propostas de cada um. E quando isso acontece, eu vejo que... né, quando já saem declarando voto... é um gesto de... é... ah, até de desrespeito e desdém à democracia, à troca de saberes, sabe? Ao conhecimento. Então... isso tá acontecendo também fruto desse momento inflamado que a gente tá vivendo.

[Fernanda Mena]: E nesse sentido, o que a senhora pensa, senadora, do movimento de voto útil que tem ocorrido nessa reta final em favor do candidato Lula?

[Mara Gabrilli]: Ah, eu penso como eu disse agora, eu acho um desserviço pro Brasil. Eu não vejo esse voto como voto útil. Eu acho inútil. Inútil porque você trabalha... é inútil pro Brasil votar no menos pior, é inútil pro Brasil não olhar pra trás, não olhar... a gente tem exemplos de Brasis que a gente já viveu. Então quando você vai lá e faz uma opção, entendeu, baseado no medo, baseado naquele que você não quer, né? Optar pelo menos pior...

[Kennedy Alencar]: Mas, senadora, o presidente Jair Bolsonaro tem dito, feito ameaças de golpe, quem defende terminar eleição no primeiro turno argumenta que seria mais difícil pra ele contestar uma eleição resolvida no primeiro turno porque ele teria que contestar a urna eletrônica que elegeu também 27 governadores, 513 deputados federais, senadores. Que resolver no primeiro turno tiraria a força do Bolsonaro pra tentar tumultuar a eleição. Esse é o argumento, o que a senhora acha dele?

[Mara Gabrilli]: Mas, Kennedy, você acha que esse deve ser o argumento pra gente escolher um presidente? Jamais deveria ser isso. Pelo contrário, a gente tem exemplos de pessoas que já presidiram esse país. Então, por um lado, a gente tem um presidente negacionista, um presidente que negou vacina no braço do brasileiro, um presidente que desdenha fome, um presidente que desrespeita mulher, um presidente que... eu posso dizer que a Simone, com muita coragem, na CPI, foi ela que denunciou a tentativa de superfaturamento de vacinas, enquanto até hoje ele fica falando que quem toma vacina pode virar jacaré, mas estava querendo ganhar em dólar em cima da vacina. E, por outro lado, a gente tem um ex-presidente que avassalou o Brasil com a corrupção, que começou lá em Santo André como laboratório, virou mensalão, virou petrolão, a gente já conhece esse passado brasileiro.

A gente sabe que corrupção mata, tira comida do prato do brasileiro, tira remédio da vida do brasileiro, então fazer uma opção dessa forma, acho que não é a forma mais apropriada para se escolher um Presidente da República, porque a eleição... a eleição pode acabar no dia 02, mas a vida do brasileiro não. E aí, o que vai ser depois disso?

[Leonardo Sakamoto]: Senadora, pinçando um pouco, voltando um pouco ao PSDB, e falando um pouco da vida partidária, de maneira geral. Esta é a eleição, é a primeira vez desde 1989, ou seja, desde a redemocratização, que o PSDB não é cabeça de chapa numa eleição.
A gente teve PSDB em 89, com Covas, depois vencendo com Fernando Henrique, em 94, 98; depois tivemos candidaturas que foram até o segundo turno, 2002, 2006, 2010, 2014, do PSDB e 2018 com Geraldo Alckmin. Dessa vez, agora, tivemos o João Dória, Eduardo Leite disputando o direito de concorrer, de ser cabeça de chapa, mas nenhum dos dois conseguiu ser candidato. Quais são as razões desse fracasso político do PSDB neste momento?

[Mara Gabrilli]: Você está chamando de fracasso político, mas eu não vejo dessa forma. Eu acho que todos os partidos têm suas crises. Realmente, aquele processo das prévias foi um processo desgastante, o Dória venceu as prévias, eu votei no João Dória para as prévias, acreditava nele como candidato à Presidência da República, infelizmente não aconteceu, por várias razões. Mas, por outro lado, é a primeira vez na história do PSDB que o PSDB tem como candidata à Presidência da República uma vice mulher, então a gente perde de um lado, mas ganha do outro. Tem quadros novos aparecendo no PSDB, e tem mais uma coisa que eu admiro muito no PSDB, que é o PSDB Mulher, que poucos falam, mas o PSDB Mulher, através da Yeda Crusius na presidência, fez todo um trabalho de qualificação de mulheres, para que a gente tenha mais mulheres em cargos de poder, para que a gente tenha mais mulheres dentro do Congresso, não só de qualificação, mas, assim, cursos de ciência política, cursos de liderança preparando essas mulheres, então é um outro caminho que a gente pouco vê, mas que vem acontecendo e isso faz o PSDB engrandecer por um outro lado.

[Fernanda Mena]: Senadora, dentro desse assunto da primeira chapa da história da democracia brasileira formada exclusivamente por mulheres, eu queria lembrar que no ato de lançamento da campanha, a senadora Simone Tebet e senhora foram elogiadas, no entanto, não pelas qualidades na vida pública e política, mas por estarem bem arrumadas e pela política precisar da docilidade das mulheres. O que esse tratamento e duas as chapas mais bem posicionadas serem compostas por homens evidenciam sobre o lugar da mulher na política brasileira hoje?

[Mara Gabrilli]: Bom, com relação ao lançamento, desculpa, mas eu também não vi dessa forma, o que aconteceu foi um elogiozinho lá é um jeito do Serra, assim, ele sempre foi assim, sempre teve essas tiradinhas. Mas... puxa, a gente estava lá, são duas mulheres com trajetórias de trabalho, com trajetórias de competência no trabalho. Eu posso falar... puxa, a Simone Tebet tem uma profundidade técnica, ela tem uma trajetória onde foi prefeita, foi prefeita reeleita, foi deputada estadual, foi vice-governadora. No Senado, além de ter sido a primeira mulher a ser candidata à presidência do Senado, depois de 198 anos, ainda a primeira mulher a ser presidente da CCJ, com um trabalho admirável, uma das principais comissões. E do meu lado tem uma trajetória, eu sou uma psicóloga, publicitária, marqueteira que teve uma intercorrência na vida, que foi quebrar o pescoço, e passei por muitos desafios, lembrando que eu perdi todos os movimentos do pescoço para baixo, parei de respirar, só conseguia respirar com auxílio de aparelhos, depois, por conta disso, também não falava, para eu me comunicar, Fernanda, eu tinha que usar uma placa que alguém ficava apontando as letras e eu piscava para fazer uma palavra, para fazer uma frase, e não tinha prognóstico de que um dia eu voltaria a respirar sozinha. Imagina o tamanho disso, de eu poder hoje ter voz e poder usar essa voz como o meu instrumento de trabalho e, inclusive, dar voz a muitos brasileiros invisíveis. Acho isso tão mais importante.

[Fernanda Mena]: A senhora não se incomodou com isso não ter sido exaltado no ato de lançamento da campanha e sim?

[Mara Gabrilli]: Eu mesma falei disso, e quando eu falei disso, eu não sei se vocês notaram, mas todos se calaram e ouviram; e as pessoas, elas não falam muito desse? elas não gostam de falar de inclusão, de falar de deficiência. Só continuando, passado isso, eu também tenho uma trajetória, que é uma trajetória robusta, porque eu comecei como fundadora de ONG, na sociedade civil. Aí eu fui secretária municipal, eleita vereadora duas vezes, dois mandatos de deputada federal, senadora, e ainda eleita para um comitê da ONU, e sou perita da ONU hoje.

[Fernanda Mena]: O que a senhora acha então que isso quer dizer sobre o lugar da mulher na política? A senhora discorreu aqui um currículo maravilhoso, tanto da senhora quanto da cabeça de chapa. O que esse episódio fala sobre o lugar da mulher na política, hoje, e o fato de vocês estarem enfrentando duas candidaturas exclusivamente femininas que são as mais bem colocadas?

[Mara Gabrilli]: Então, Fernanda, tudo é mais difícil para mulher neste país. Não importa a área, a gente tem que estar sempre trabalhando para vencer obstáculos, e a gente traz uma chapa que, além de duas mulheres com toda essa trajetória, ainda tem uma tetraplégica, que eu acho que é muito a cara do que a gente quer para o Brasil. Se nossas competências não foram exaltadas naquele dia, talvez faça parte de uma cultura que é uma cultura realmente machista e que muitas vezes as pessoas não estão atentas ao que realmente importa, e, por isso, a necessidade de mostrar, de fazer? Até agradeço vocês pela oportunidade, porque é a forma que a gente tem de mostrar nosso trabalho, de mostrar nossas propostas, de mostrar o Brasil que nós imaginamos, o Brasil que nós esperançamos, o Brasil que a gente vislumbra, sabe, para os nossos jovens, para as nossas crianças, para os nossos adultos. Acho que é para isso que a gente veio um pouco uma chapa até disruptiva no que a gente vem assistindo por aí; e ali não teve nada diferente do que costuma acontecer geralmente. E se você notar as perguntas nas coletivas, elas são perguntas que muitas vezes não enaltecem aquilo que a gente tem de mais diferente, de mais inovador para mostrar.

[Fernanda Mena]: Senadora, e o que é urgente na políticas para as mulheres, neste momento, no país?

[Mara Gabrilli]: Bom, eu acho que, em primeiro lugar, o mais urgente é acabar com a violência contra a mulher. Lembrando que a cada duas horas, uma mulher é morta. O Brasil está em quinto lugar como país que mais mata mulheres. Além disso, a cada dois minutos uma mulher é agredida física ou verbalmente. A gente sabe que a mulher passa por várias discriminações, a mulher vai agregando discriminação. A gente imagina uma mulher cadeirante, como eu, negra, lésbica, pobre, o que ela vai agregando de discriminação é algo que vai tirando da capacidade de ter um exercício de cidadania, e eu acho que urgente é a gente trazer, acabar com a desigualdade entre homens e mulheres, no que diz respeito à violência política, no que diz respeito à diferença de salários, no que diz respeito a várias questões, e, principalmente, essa questão da violência. E uma delas, que eu até ressalto aqui, quando a gente fala, por exemplo, de armar a população hoje, 96% das armas estão nas mãos de homens, e 4% só nas mãos de mulheres. Então, nossa, se a gente quer acabar com o feminicídio no Brasil, armar a população, sendo que as armas estão nas mãos dos homens, é um contrassenso, não é?

[Kennedy Alencar]: Senadora, a senhora já falou em entrevistas que caso a chapa da senhora não vá ao segundo turno, queria voltar um pouquinho a essa questão eleitoral, a senhora não vai apoiar nem o ex-presidente Lula nem o presidente Jair Bolsonaro. Quero entender o que é isso. Se a senhora vai votar em um deles e simplesmente não quer declarar um apoio público, quer ficar com seu voto em segredo, ou se a senhora não vai votar mesmo em nenhum deles e vai anular e vai dizer: "Tô anulando meu voto", e como que a senhora vai se posicionar se o PSDB, por exemplo, recomendar o voto em um dos candidatos.

[Mara Gabrilli]: Kennedy, eu não me lembro de ter dito isso em nenhum momento porque eu não consigo fazer uma campanha, me dedicar a uma campanha sem acreditar que eu vou chegar no segundo turno. Então, assim, eu preciso acreditar, é assim que eu trabalho pra fazer uma campanha, senão perde totalmente a razão.

[Kennedy Alencar]: É que a gente tá nessa reta final, né, senadora, e as pesquisas mostram a polarização muito clara entre o Lula e o Bolsonaro. O cenário mais provável é esse.

[Mara Gabrilli]: Não, calma, eu vou terminar meu raciocínio. Na hora de entrar na campanha, quando eu fui convidada, eu já deixei muito claro que eu não apoiaria nem um nem o outro, isso quer dizer não votar, eu não dou meu voto nem pra um e nem pra outro de forma alguma.

[Kennedy Alencar]: Tá claro. Obrigado.

[Leonardo Sakamoto]: Senadora, ao longo da história do Brasil, vice-presidentes desempenharam papéis muito diferentes, algumas vezes antagônicos nesses papeis. Houve vices discretos, e que ajudaram na articulação política, como é o caso do Marco Maciel, vice de Fernando Henrique, ou José de Alencar, que foi vice do Lula, né? Outros aproveitaram crises pra ascender ao poder, seja jogando parados, seja fazendo articulações pra chegar à presidência, como foi o caso do Itamar Franco, no caso do Collor, e Michel Temer no caso de Dilma. Na sua opinião, qual deve ser o papel de um vice ou de uma vice e como evitar que eles cedam à tentação do golpismo?

[Mara Gabrilli]: Nossa, eu acho que, assim, no meu caso, eu tô tão distante de uma questão de golpismo. Mas posso trazer o tema pra minha chapa? Porque a Simone já deixou claro desde o princípio que não gostaria que eu fosse uma vice coadjuvante, e gostaria muito que eu presidisse o Brasil junto com ela. E curiosamente, a gente traz como um dos principais pilares da nossa chapa a inclusão, que é algo que poucos falam, né? Não só os postulantes, não só os candidatos, mas os jornalistas também pouco perguntam sobre esse assunto, que é um assunto tão importante. E falar de inclusão é perpassar por todos os Ministérios. A gente não consegue falar de inclusão sem falar de habitação, sem falar de saúde, sem falar de transporte, sem falar de infraestrutura urbana, sem falar de economia, sem falar de planejamento, sem falar de ciência e tecnologia. Então se eu imagino, por exemplo, meu papel dentro de um governo, eu imagino trabalhando uma política totalmente transversal e que não deixe com que nenhum Ministério subtraia o direito não só de pessoas com deficiência ou pessoas com doenças raras, mas de minorias, de estarem contempladas dentro da política pública daquele Ministério. Então, assim, eu me enxergo uma vice com muito trabalho a fazer. E não só a inclusão é uma política transversal que deve perpassar todas as instâncias, como também a sustentabilidade tem que ser um instrumento de política transversal. Então acho que não sobraria... no que eu imagino, nenhum tempo pra golpe ou pra qualquer coisa desse tipo.

[Fernanda Mena]: Senadora, falando em inclusão, a senhora foi quem propôs à Prefeitura de São Paulo e liderou a primeira Secretaria Municipal voltada pra pessoas com deficiência, que a gente chamou de PCDs, em 2005. Qual foi impacto da pasta das políticas pra esse grupo, como avançar com essa agenda junto às empresas, e ao projetar esse tipo de priorização na esfera federal, quais Ministérios o Brasil precisa criar pros desafios dos próximos quatro anos?

[Mara Gabrilli]: Bom, primeiro com relação à primeira secretaria, foi muito curioso, Fernanda, porque quando eu assumi, a secretaria e não tinha nem recurso, porque ela não havia sido prevista, prevista na gestão anterior. E eu também não tinha experiência de Prefeitura, então aquilo para mim não fez a mínima falta, e eu fui construindo a secretaria pedindo insumos, pedindo computador, mesa, cadeira para outras as secretarias, porque nem lugar tinha, e depois eu comecei a trabalhar fazendo com que os outros secretários fizessem, deixando claro que eu estava lá não era para isentá-los da responsabilidade de incluir a pessoa com deficiência, mas fazer com que eles fizessem, levar o conhecimento do universo da pessoa com deficiência. Então assim, foram números muito significativos para dois anos de secretaria, que foi o tempo que eu fiquei. Então, quando eu cheguei, São Paulo tinha 300 ônibus acessíveis, em dois anos passou a ter 3500. Quando eu cheguei, não tinha quantitativo de guias rebaixadas, por exemplo, nas esquinas, quando eu saí depois de dois anos, a gente já estava completando 500. Assim, o número de pessoas com deficiência que passaram a frequentar os clubes municipais que a gente tornou os clubes acessíveis e ainda treinou técnicos em educação física. Então assim, em um mês treinados os técnicos, foi em 800 o número de pessoas que passaram no primeiro mês, depois disso, a frequentar pessoas com deficiências, a frequentar os clubes municipais. Então os números foram todos grandes, exorbitantes, o que demonstrou que muita coisa não acontecia porque nunca ninguém tinha pedido para que acontecesse. Foi até uma resposta do prefeito: Poxa, algo tão simples, por que nunca fizeram antes? Porque nunca pediu para que fosse feito. Com relação a criar Ministérios, eu acho que com o que a gente tem, assim, sempre dá para fazer. Se tiver que criar um Ministério, eu criaria o Ministério do Planejamento, e teria o Ministério da Cultura, robusto. E traria no Ministério da Educação, e isso está no nosso plano de governo, que fique diretamente ligado à presidência, uma espécie de secretaria, algo que cuide da primeira infância, porque é algo que a gente tem que começar pelo começo, mesmo. E se a gente já começa desde princípio na educação da criança, fazendo com que essa criança, já desde primórdios, convivam com outras crianças que tenham deficiência, que leiam de forma diferente, que caminhem de forma diferente, que raciocinam de forma diferente, que se comunicam de forma diferente, a gente está formando crianças que têm uma visão de mundo muito mais completa, e isso faz com que ela saiba conviver com essa diversidade, isso dá ferramenta para criança conviver com adversidades, isso traz ferramenta para criança ter mais facilidade de ser feliz, é simples assim, essa convivência ela é fundamental para vida das pessoas e faz com que elas não formem barreiras de atitudes, que nós adultos temos que é tão difícil de derrubar, isso assim para mim é imprescindível, começar pela primeira infância. Coisa que nesse governo, infelizmente a gente retrocedeu no que diz respeito à educação inclusiva, algo tão fundamental para vida do brasileiro. Posso tomar uma aguinha?

[Kennedy Alencar]: Por favor, toma uma água. A gente vai parar o cronômetro um pouquinho para a senadora tomar uma aguinha.

[Mara Gabrilli]: Traz um papel também.

[Fernanda Mena]: Podemos perguntar enquanto você toma água?

[Mara Gabrilli]: Claro. Só finalizando, Fernanda, acho que fazer inclusão basta ter o Ministério e se aproveitar, uma pessoa que trabalha com inclusão dentro de uma Prefeitura, por exemplo, ela fica preparada para trabalhar como prefeito, porque assim, tem que conhecer, para ela saber se estão atendendo todas as minorias dentro da Saúde, ela tem que saber tudo o que está sendo feito na Saúde, e assim todas as pastas.

[Kennedy Alencar]: Nós estamos entrevistando a senadora Mara Gabrilli, que é candidata a vice-presidente, na chapa da Simone Tebet, do MDB. Na quarta-feira, vamos entrevistar Ana Paula Matos, vice do Ciro; na quinta-feira, o Alckmin, vice do Lula; e o Braga Netto, vice do Bolsonaro, foi convidado, mas ainda não respondeu. A senadora está tomando uma aguinha aqui, e nós vamos continuar a entrevista.

[Mara Gabrilli]: Aqui temos a Rosa, que é minha cuidadora?

[Kennedy Alencar]: A Rosa está aqui com a senadora.

[Fernanda Mena]: Obrigada, Rosa.

[Kennedy Alencar]: Entrevista completa aqui. Valeu, Rosa!

[Mara Gabrilli]: Posso usar a Rosa para falar sobre algo muito importante?

[Kennedy Alencar]: Claro.

[Mara Gabrilli]: Que acho que é um dos temas que? Obrigada, Rosa.

[Fernanda Mena]: Só um instantinho, que a gente tem que voltar o cronômetro.

[Kennedy Alencar]: Obrigado, Rosa! Vamos voltar o cronômetro, senadora. A palavra com a senhora.

[Mara Gabrilli]: Já que há a presença da Rosa aqui, para eu ter aceitado esse convite da Simone para encarar esse percurso de campanha à vice-presidência, isso está diretamente relacionado a todas as oportunidades que eu tive na vida, embora continue com uma deficiência considerada bastante severa, e, infelizmente, a maioria da população não tem todas essas oportunidades que eu tive, nem perto disso; e uma das nossas propostas no plano de governo é criar uma política de cuidados para o Brasil. E isso é algo que é você viver jogado em uma cama, sem nenhuma função, ou ter uma oportunidade de ser um contribuinte brasileiro. Assim, é de trafegar do Nadir ao Zenit, conseguir fazer uma transformação completa na vida. Porque se eu não tivesse a oportunidade de ter uma cuidadora, eu jamais estaria aqui, eu jamais teria passado por todos os cargos que eu passei, e eu, dentro do Congresso, sou o primeiro caso de uma pessoa que entra em todas as reuniões dentro do Plenário com uma cuidadora. Então, só falar a importância disso, né? E a gente volta a falar de mulher, porque a maioria das cuidadoras, hoje, no Brasil, são as mães, são cuidadoras familiares, são mulheres que param de trabalhar para poder cuidar do filho que tem algum tipo de deficiência, uma doença rara. A renda da família diminui, a despesa aumenta, porque tem que comprar fralda, tem que comprar remédios, tem que comprar insumos e vira uma tragédia. Esse é o Brasil que a gente vive hoje. E eu não estou falando de uma minoria porque são poucas pessoas, é minoria porque tem invisibilidade. Estou falando, segundo o censo 2010, de 45 milhões de brasileiros com algum tipo de deficiência. E, ainda, se somarmos as pessoas que têm deficiências raras, são mais 15 milhões de brasileiros. E quando, na nossa chapa, a gente fala de inclusão, a gente está falando da população negra, a gente está falando da população LGBTQIA+, a gente está falando de imigrantes, de refugiados, a gente está falando das populações originárias, indígenas, quilombolas, a gente está falando de idoso e está falando de obeso, a gente está falando de toda essa população. Inclusive, isso perpassa até pelo racismo ambiental, passa pelo racismo energético, que são várias discriminações que a gente quer trabalhar no pilar da inclusão na nossa chapa.

[Kennedy Alencar]: Obrigado, senadora. Bacana. Obrigado pelas palavras aí. Senadora, a senhora foi deputada federal, acompanhou o impeachment da, então, Presidente Dilma Rousseff. À época, o Eduardo Cunha segurou o pedido de impeachment até ele não ter apoio no Conselho de Ética, e desencadeou o pedido de impeachment. Questão pessoal. Agora, o Arthur Lira, Presidente da Câmara, está sentado em cima de uma pilha de pedido de impeachment, o Presidente da República cometeu uma série de crimes de responsabilidades, e ele não faz nada. Há uma discussão se seria preciso retirar tanto poder do Presidente da Câmara e delegar para o Plenário, ou se mantém a regra atual, porque poderia? enfim, tem que ser assim mesmo. Qual é a posição da senhora em relação a essa legislação do impeachment: precisa mudar ou fica como está?

[Mara Gabrilli]: Bom, o que eu tô enxergando hoje é que pra que haja o impeachment, deveria ter um clamor popular e vontade política, coisa que não aconteceu. Talvez fazer uma mudança nisso traria uma... acho que uma... uma transparência? Não, não seria transparência, mas uma legitimidade maior com relação ao impeachment. Eu vi com bons olhos essa mudança, veria com bons olhos.

[Fernanda Mena]: A senhora e a candidata Simone Tebet votaram a favor do impeachment da presidente Dilma, a primeira mulher a presidir o Brasil. Se a votação fosse hoje, a senhora votaria da mesma maneira e por quê?

[Mara Gabrilli]: Com relação ao Bolsonaro?

[Fernanda Mena]: Ao impeachment da presidente Dilma.

[Mara Gabrilli]: Votaria do mesmo jeito.

[Fernanda Mena]: Por quê?

[Mara Gabrilli]: Porque ela cometeu crime de responsabilidade.

[Kennedy Alencar]: O Ministério Público mandou arquivar agora, não viu responsabilidade dela nem do Guido Mantega nas pedaladas fiscais, que foi o principal motivo pelo qual ela foi condenada, né?

[Mara Gabrilli]: É, mas eu votaria a favor por várias outras razões. Com relação ao governo. Porque eu acho que a pedalada foi a forma que encontraram pra conseguir fazer o impeachment, mas tinham muitos outros crimes ali, elencados de uma forma ou de outra.

[Fernanda Mena]: Crimes ou problemas de gestão? Existe uma diferença entre uma coisa e outra. E qual problema pra institucionalidade se você usa uma questão como essa da pedalada, que se mostrou agora frágil com essa nova decisão?

[Mara Gabrilli]: Então, Fernanda, eu... eu falo crime porque eu vejo que mesmo no governo da Dilma, existia uma corrupção sistêmica acontecendo no Governo. Então eu enxergo como crime.

[Kennedy Alencar]: Existe uma discussão, desculpa, Saka, que é... o impeachment, no caso, da Dilma, teria sido usado como se o Brasil fosse parlamentarista, ou seja, prevaleceu a questão política e encontraram um aspecto técnico que agora caiu, e o sistema é presidencialista, ou seja, que um presidente da república tem que ser tirado no voto, que pra ter impeachment tem que haver uma combinação das duas coisas, e que ali houve um golpe parlamentar porque se usou só a perna política. Como a senhora avalia essa opinião e essa avaliação?

[Mara Gabrilli]: Jura que a gente vai voltar assim pro passado?

[Kennedy Alencar]: Mas o Ministério Público acabou, senadora, de dizer que pedalada fiscal não é crime. E tem uma discussão sobre semipresidencialismo. No partido da senhora, há pessoas que defendem o parlamentarismo, ou seja, que é justamente pra lidar com essas crises quando tem um presidente que combina uma crise política com uma política econômica.

[Mara Gabrilli]: Então, eu também defendo o parlamentarismo, até porque acho que a gente conseguiria governar com muito mais facilidade e resolveria essas questões de uma forma muito mais leve. Agora, se a gente for voltar pro caso da Dilma, a gente vai ter que falar de corrupção, inevitavelmente. E disso... a gente não vai fugir. O que aconteceu? A Dilma era presidente do conselho da Petrobras, quando aconteceu o caso de Pasadena. A gente tem tantos fatos pra elencar que... que com certeza, né, naquela época, o impeachment enveredou pra esse caminho, mas talvez, se não fosse esse caminho, teria sido outro. Porque eu enxergo que era um governo que estava mergulhado, não que esse não esteja, mas aquele estava totalmente mergulhado na corrupção.

[Leonardo Sakamoto]: Senadora, falando um pouco não do passado, mas falando, então, do presente, a senhora e a senadora Simone Tebet são muito críticas ao orçamento secreto, à utilização do orçamento secreto, que acabou se mostrando um grande escândalo do governo Jair Bolsonaro. Contudo, uma matéria do jornal Estado de São Paulo aponta que a senhora foi beneficiada em 19,2 milhões de emendas dentro dessa estrutura do orçamento secreto, tendo ido pra 19 municípios no ano de 2020 ou 2021. Não é, de certa forma, um contrassenso?

[Mara Gabrilli]: Então, Sakamoto, quando eu recebi esse recurso, quando me foi oferecido, que eu abracei com unhas e dentes no meio da pandemia, quando os hospitais filantrópicos estavam quebrando, as Santas Casas não conseguindo atender, os municípios não conseguindo atender os pacientes de Covid, primeiro que ele nem tinha esse sobrenome, "secreto", e depois que eu nunca trabalhei de forma secreta, eu sempre tive total transparência na forma como eu destinei emendas. Inclusive, nessa época, eu fiz um levantamento do que estava acontecendo no interior de São Paulo, quais os hospitais que estavam conseguindo receber, atender paciente de Covid e quais hospitais que estavam faltando o quê? EPIs? Não, esse acabou de chegar. Então nesse eu não vou mandar. Esse aqui tá sem. Foi feito um estudo aprofundado, e eu fui ligando de prefeito em prefeito pra dizer: "Olha, você vai receber tanto, é pra colocar em tal hospital", assim de uma forma totalmente transparente.

Só, o que o que foi acontecendo? Os valores foram tomando um tamanho gigante e os parlamentares não precisavam dizer onde colocavam, então ele foi criando essa alcunha de orçamento secreto. Mas na época que eu recebi, ele não era assim, não era dessa proporção. E eu tenho o maior confiança no trabalho que eu faço. Ainda mais num momento tão sensível, tão trágico, como a gente estava vivendo da pandemia. É muito diferente você pegar, eu coloquei, embora na matéria tenha saído que eu coloquei inclusão e acessibilidade, eu só coloquei em saúde, só em saúde. O que é diferente de você, no meio da pandemia, pegar um recurso desse para fazer pavimentação, eu não estou fazendo nem comparação, mas eu acho que num momento de pandemia qualquer recurso tem que pretender melhorar a saúde do povo brasileiro.

[Kennedy Alencar]: Senadora, como acabar com esse monstro do orçamento secreto? Porque agora, como a senhora mesma falou, e crítica, a Simone Tebet quer acabar, outros candidatos falam que precisa acabar o orçamento secreto, que a regra da Constituição é transparência, o Supremo está para analisar. Agora, interessa ao Centrão. Como construir maioria para tirar dos deputados e dos senadores um poder de gerenciar uma obra bilionária, são quase cerca de 19 bilhões de reais. Como é que acaba com esse monstro?

[Mara Gabrilli]: Então, eu vi o Bolsonaro falando no debate, sábado, que: ah, que orçamento secreto é culpa do Congresso. Entendeu? Mas é claro que ele pode fazer a grande mudança nisso, claro que a Simone, assumindo a presidência, ela pode fazer a grande mudança nisso. Essa semana eu assinei um projeto de lei que faz com que a gente consiga, através do recurso do orçamento secreto, conseguir uma fonte de custeio para subsidiar o piso da enfermagem. Então assim, eu acho que a gente tem vários caminhos para fazer essa mudança. E com relação, a gente sempre precisa de um centro democrático que seja realmente um centro democrático, mas infelizmente o Centrão, ele acabou virando uma questão totalmente volátil de ideias, porque as ideias flutuam de acordo com a conveniência, virou projetos de poder pessoal de cada um, e deturpou aquilo que poderia um centro democrático, então virou uma guerra muito pessoal de cada um. E você sabe que essa guerra a gente enxerga até na questão de ter candidato à presidência e não ter candidato à presidência, assim, quem acabou determinando isso foi o dinheiro, não é? É a mesma coisa. E olha, hoje, por exemplo, várias mulheres foram desistindo da corrida a candidaturas, candidatas a deputadas, estaduais, federais, senadoras, por quê? Porque passaram em cima do dinheiro da mulher, os 30% deveriam ter reservado às mulheres não estão sendo respeitados.

[Kennedy Alencar]: No fundo eleitoral, a senhora está falando.

[Mara Gabrilli]: No fundo eleitoral. Então assim, o dinheiro... o recurso acabou virando o preponderante para tomar decisões, infelizmente, as políticas públicas passam a ser menores, por isso que seria bom sim a gente acabar com esse presidencialismo, e que... presidencialismo de coalizão, mas que a Simone está chamando de presidencialismo, está no nosso plano de governo, de presidencialismo... acabou de me fugir a palavra.

[Kennedy Alencar]: Cooptação que ela usa?

[Mara Gabrilli]: Não, não. Não é cooperação, mas de coesão. Não. De conciliação, perdão. Presidencialismo de conciliação. E pra isso, a gente precisa de diálogo, coisa que tem faltado muito no Congresso por essas questões todas.

[Fernanda Mena]: Senadora, como é que a senhora acredita que deve ser tratada a regra do teto dos gastos que está totalmente desmoralizada pelo governo Bolsonaro e que colocou uma pressão extra sobre os gastos sociais. Deve-se manter a regra, deve-se mudá-la, qual sua opinião a respeito?

[Mara Gabrilli]: Acho superimportante a gente ter essa regra, ela é fundamental assim quando a gente pensa em todas as reformas que estamos propostas a fazer: reforma tributária, reforma administrativa, a gente tem que ter isso. Mas, na nossa chapa, a gente traz algumas inovações que é poder "furar o teto", mas nunca contingenciar dinheiro de educação, isso já está, e nunca contingenciar dinheiro de ciência, inovação e tecnologia, como questões fundamentais para o crescimento e desenvolvimento econômico e social do Brasil. Então acredito, assim, a gente tem que manter e respeitar o teto, isso é fundamental para a gente ter um ambiente de negócios confiável, controlável, sem isso seria o caos.

[Kennedy Alencar]: Senadora, nós estamos chegando aqui na reta final da entrevista. Eu quero fazer o pinga-fogo com a senhora e ver se nós temos tempo.

[Mara Gabrilli]: Já?

[Kennedy Alencar]: Temos 13 minutos, a gente faz o pinga-fogo rapidinho, uma ou duas palavras, e o Sakamoto e a Fernanda voltam com mais perguntas para a senhora. Começando aqui: João Goulart?

[Mara Gabrilli]: Admiração.

[Kennedy Alencar]: José Sarney?

[Mara Gabrilli]: Eu tenho que ser rápida, né? Ah? perpetuação.

[Kennedy Alencar]: Itamar Franco.

[Mara Gabrilli]: Inovação.

[Kennedy Alencar]: Michel Temer?

[Mara Gabrilli]: Michel Temer? Segurança.

[Kennedy Alencar]: A senhora é a favor ou contra o uso de câmera em uniformes de policiais?

[Mara Gabrilli]: Totalmente a favor.

[Kennedy Alencar]: Voltar a restringir o porte de arma ou manter esse relaxamento feito pelo Bolsonaro na posse e no porte de armas?

[Mara Gabrilli]: Voltar a restringir.

[Kennedy Alencar]: A senhora é a favor ou contra ampliar as possibilidades de aborto legal no Brasil, que hoje são: risco de morte para gestante, resultado de estupro ou feto anencéfalo?

[Mara Gabrilli]: Está perguntando se sou a favor ou contra?

[Kennedy Alencar]: Ampliar as possibilidades.

[Mara Gabrilli]: Contra.

[Kennedy Alencar]: A favor ou contra legalizar a maconha?

[Mara Gabrilli]: Contra.

[Kennedy Alencar]: A favor ou contra as cotas raciais?

[Mara Gabrilli]: A favor.

[Kennedy Alencar]: A favor ou contra a privatização da Petrobras?

[Mara Gabrilli]: No momento, contra.

[Kennedy Alencar]: A favor ou contra revogar a reforma trabalhista?

[Mara Gabrilli]: Contra.

[Kennedy Alencar]: Um livro?

[Mara Gabrilli]: "A Descoberta do Mundo", Clarice Lispector.

[Kennedy Alencar]: Uma música?

[Mara Gabrilli]: Ryuichi Sakamoto, "Merry Christmas Mr. Lawrence".

[Kennedy Alencar]: Um sonho?

[Mara Gabrilli]: Um sonho? Ah? só pode ser uma palavra?

[Kennedy Alencar]: Não, pode ser uma frase, um pensamento também, mais sucinto, mas pode.

[Mara Gabrilli]: A primeira coisa que me veio foi o quadro "Sonhos", do Van Gogh, mas eu sonho com um Brasil mais inclusivo. Eu posso falar mais?

[Kennedy Alencar]: Pode, claro.

[Mara Gabrilli]: Então, tem algo que eu queria passar para o coração de vocês, porque a gente falou tanto de política, mas quando a gente fala de inclusão, eu fui para Pernambuco essa semana, e aí eu trabalhei muito lá, mas como Instituto Mara Gabrilli, que acabou indo para lá para atender todas aquelas mães que tiveram filhos com microcefalia, e elas acabaram formando uma organização, e a presidente da organização começou a contar que ela tem um filho com deficiência, todo dia sai da escola e passa por um parque e naquele parque não tem brinquedos acessíveis, e o filho sempre quer ir naquele parque, e fala: "Poxa, mãe, vamos, vamos". Ela: "Não, vamos tomar um sorvete, vamos comer uma pizza", fica disfarçando. E aí, um dia, eles fizeram outro caminho, e ele viu um outro parque, que estava mais vazio e que parecia acessível, e ele virou e falou assim: "Mãe, naquele parque eu posso ir". Aí a mãe falou assim: "Não, filho, aquele é um parque só para cachorro". E aí, ele virou e falou assim: "Poxa, mãe, eu queria ser um cachorro". Então, eu estou falando nisso porque quando a gente fala de inclusão, a gente está falando de um Brasil gigante, onde as pessoas vivem, 80% delas, abaixo do nível da pobreza, entendeu? Não é fácil para mim chegar em lugar nenhum, não é? Acabei, estava vindo para cá, teve um pedido de cadeira, um cara mostrando a cadeira dele, e eu estou passando maior perrengue de cadeira porque quebraram minhas cadeiras durante viagens, e, poxa, eu tenho condições de ir lá, de pagar, mas a maioria do Brasil está vivendo desse jeito. A gente está no Brasil, em que 33 milhões estão passando fome, enquanto praticamente 60 milhões estão vivendo insegurança alimentar, e parece que as pessoas não estão percebendo isso, sabe? Não estão percebendo o quanto a gente está precisando cuidar de gente, e isso me entristece, entendeu? Porque eu vivo isso 24 horas por dia, sabe? São situações extremamente desesperadoras. Então, eu queria que vocês perguntassem mais sobre gente, sabe? Sobre o que o brasileiro está vivendo nesse momento da história.

[Kennedy Alencar]: Excelente responda, no pinga-fogo, respondeu muito bem. Vou dar a palavra agora para o Sakamoto para a gente continuar, senadora. Tem mais sete minutos e meio para conversar com a senhora.

[Leonardo Sakamoto]: Primeiro, obrigado pela resposta, senadora. Acho que é bem forte e importante. Eu queria voltar um pouco para a questão do bloco econômico, que é o que a gente estava falando. A senhora é candidata à vice-presidência com o maior patrimônio das nove chapas, não é? Foi feita uma listagem pela imprensa, com 12,8 milhões, segundo sua declaração de bens. O Congresso vem postergando a realização de uma reforma tributária - que a senhora defende inclusive -, uma reforma tributária que reduza a regressividade, ou seja, taxe mais os mais ricos e taxe menos a classe média e os mais pobres, A senhora é favor de mecanismos de taxação de grandes patrimônios e de herança?

[Mara Gabrilli]: Então, nossa chapa traz não a taxação de grandes fortunas, mas a taxação do lucro. Eu sou a favor, sim. E sou a favor de fazer uma mudança no Imposto de Renda, sabe? Pra que aqueles que têm mais pagam mais, os que têm menos paguem menos. Sou a favor de fazer muita justiça nessa área. E acho que a reforma tributária, ela vai trazer não só a simplificação, mas ela vai trazer justiça social. E por justiça social, a gente entende uma maior facilidade pra comprar comida, maior facilidade pra comprar remédio, então, com certeza, eu acho que isso... E não dá pra desvincular uma reforma tributária de uma reforma administrativa. Porque eu vejo governo inflado, população pobre. Então tudo isso eu acredito que tenha que ser ajustado.

[Kennedy Alencar]: Senadora, a senhora falou da questão da pobreza, né, da falta do poder de compra. Queria a opinião da senhora sobre reajuste real do salário mínimo acima da inflação, se a senhora acha que essa política tem que ser retomada e que ela traz bons resultados pra combater a pobreza, e se a senhora defende um Auxílio Brasil, um novo Bolsa Família, qual que seja o nome, de 600 reais no ano que vem.

[Mara Gabrilli]: Com certeza. Porque a gente viu que um percentual muito grande, 30% das pessoas que estão recebendo esse auxílio não estão conseguindo comer. E a gente sabe que o preço da cesta básica aumentou, os alimentos aumentaram. As pessoas não estão conseguindo encher o prato, a gente tá assistindo muitas mães que não dão almoço e esperam pra dar o jantar porque a noite é longa. Então não só o benefício... Só que um benefício em que a gente tem direitos, mas tem deveres também, sabe? Eu quero até dar o exemplo pra você, Kennedy, de algo que veio da lei brasileira de inclusão, que a gente nem falou disso, mas foi uma lei que eu fui relatora e autora do texto final, e que é um Marco legal na vida da pessoa com deficiência. E é importante falar de pessoas com deficiência porque quando uma cidade é boa pra quem tem deficiência, ela é melhor pra todo cidadão. Ela é melhor pra você, pra Fernanda, pro Sakamoto, pra todo mundo. E essa lei trouxe o Auxílio Inclusão. O Auxílio Inclusão é o benefício pago àquela pessoa que recebe BPC, que é o benefício da assistência social, benefício de prestação continuada, que quer ingressar no mercado de trabalho. E ela não pode fazer isso recebendo o benefício, o BPC. Então seria um encorajamento pra ela abrir mão do BPC e receber esse recurso pra ir trabalhar. Então é um recurso, é um benefício que é concedido pra pessoa ir trabalhar. É dar a vara pra pessoa pescar. É nisso que eu acredito. A lei brasileira de inclusão é nada assistencialista. Ela é toda garantidora de direitos. São 137 artigos trazendo direitos, e direitos desse tipo. Pra que a pessoa possa, né, conseguir virar um contribuinte e colaborar com esse país. E quanto ao salário mínimo, ele não tá dando conta, então, assim, com certeza ele tem que ser não só reajustado, mas quanto mais a gente conseguir valorizar o salário mínimo, melhor a gente vai ter um país. Porque eu não acredito num Brasil cuja base maior, a base da pirâmide... é... vivendo na situação em que vive hoje... não acredito num país que se desenvolva deixando os mais vulneráveis pra trás.

[Fernanda Mena]: Senadora, a primeira-dama Michelle Bolsonaro, desde início do governo, procura dar destaque à questão das pessoas com deficiência. Como é que a senhora avalia o papel dela e as políticas do governo atual nesse tema?

[Mara Gabrilli]: Então, ela tem uma... A Michelle usa Libras, língua brasileira de sinais, e isso foi um gesto muito bacana porque valorizou a pessoa surda no Brasil, trouxe uma língua... trouxe visibilidade pra uma língua, que é uma língua oficial no Brasil, e muitos meios de comunicação estão descumprindo a legislação e não estão usando a língua brasileira de sinais, os surdos ficaram totalmente perdidos durante a pandemia por conta disso. Então é um lado importante, mas, por outro lado, eu acho que falta profundidade técnica porque a gente entrou em vários momentos de retrocesso, onde o governo, inclusive, não queria expandir o teste do pezinho com parlamentares da base do Governo dizendo que era desnecessário. Como assim desnecessário expandir o teste do pezinho pra 45, 50 doenças, que é o que faz o sistema privado? A gente evita, entendeu, tantas doenças, a gente consegue reverter tantos casos que isso fica muito mais barato pro Brasil depois. E aí eu emendo contando que eu criei uma comissão no Senado que é uma comissão que avalia a qualidade do gasto público. A gente nunca teve isso. A gente tem os canais de contas, que eles fiscalizam o gasto público, mas avaliar a qualidade, não. Eu te dou até um exemplo como isso é importante: o Brasil distribui cadeira de rodas. Tem estado que demora cinco anos pra uma cadeira de rodas. E a cadeira chega. E a criança joga a cadeira no lixo porque ela cresceu e a cadeira não serve mais. Isso é jogar dinheiro fora. Isso é não avaliar a qualidade do gasto público. E a gente precisa disso. E nessas políticas que você mencionou que a Michelle se envolveu, a gente infelizmente teve muito retrocesso por conta de qualidade de política pública.

[Kennedy Alencar]: Senadora, queria dar pra senhora um minuto pras considerações finais da senhora, pra alguma mensagem que a senhora ache importante falar no final dessa sabatina.

[Mara Gabrilli]: Bom, primeiro eu peço pra votar 15, pra conhecer o nosso trabalho, pra conhecer nossa vida pregressa, pra dizer que quando a gente melhora a vida de um cidadão, é a humanidade que dá um salto de qualidade. Então não vamos votar no menos pior. Vamos enxergar um Brasil de esperança, um Brasil de futuro, um Brasil com muito mais amor, com muito mais acolhimento. Brasileiro é um povo decente, é um povo que a gente só precisa dar oportunidade pra ele crescer. Então conheçam nossas propostas, foram consideradas, no âmbito da economia, as propostas mais justas pro povo brasileiro. Então eu queria agradecer também vocês pela oportunidade de estar aqui falando com o povo brasileiro e dando uma oportunidade, uma via de esperança pro Brasil.

[Kennedy Alencar]: Senadora, eu agradeço muito a entrevista da senhora, muito obrigado, e até uma próxima que a gente possa falar com a senhora novamente, tá bom? Obrigado mesmo.

[Mara Gabrilli]: Tá bom, obrigada.

[Fernanda Mena]: Obrigada, senadora.

[Leonardo Sakamoto]: Obrigado, senadora, boa sorte.

[Kennedy Alencar]: Fernanda, obrigado, Sakamoto, obrigado, quarta-feira, quinta-feira temos mais trabalho. Quero agradecer a sua audiência, chegamos ao final da sabatina com a senadora Mara Gabrilli, do PSDB, ela é a vice-candidata à presidência da república na chapa da Simone Tebet, do MDB. Na quarta-feira, vamos entrevistar a vice do candidato Ciro Gomes, Ana Paula Matos, na quinta-feira, Geraldo Alckmin, vice de Luiz Inácio Lula da Silva. E o Braga Netto, vice do presidente Jair Bolsonaro, tá convidado, mas ainda não respondeu. Agradeço sua audiência, muito obrigado e até a próxima.