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Mercosul impõe nova suspensão à Venezuela

Talita Marchao

Do UOL, em São Paulo

05/08/2017 12h49Atualizada em 05/08/2017 19h26

Os chanceleres de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai decidiram pela suspensão política da Venezuela do Mercosul, em reunião realizada na Prefeitura de São Paulo, neste sábado (5).

O Mercosul anunciou suspender a Venezuela do bloco por ruptura da ordem democrática. A decisão, unânime, é sanção máxima prevista nas regras do bloco.

"A suspensão da Venezuela foi aplicada em função das ações do governo de Nicolás Maduro e é um chamado imediato para o início de um processo de transição política e restauração da ordem democrática", declara o comunicado assinado pelos ministros após uma reunião em São Paulo.

A suspensão está prevista no Protocolo de Ushuaia, que trata dos compromissos democráticos a serem seguidos pelos membros do bloco.

Esta é a segunda vez que a Venezuela é suspensa do Mercosul. A primeira, em dezembro, foi por descumprir regras de adesão ao bloco por questões técnicas, como a não-aplicação de acordos e normas no país. A nova suspensão é decidida com base no Protocolo de Ushuaia, a cláusula democrática do Mercosul, por conta da Assembleia Constituinte instalada na sexta-feira.

Com a suspensão pelo Protocolo de Ushuaia, a Venezuela só pode voltar ao bloco após uma mudança de regime, com eleições democráticas.

Participaram do anúncio na prefeitura de São Paulo, sede do encontro, além do ministro de Relações Exteriores brasileiro, Aloysio Nunes, os chanceleres da Argentina, Jorge Faurie, do Uruguai, Rodolfo Nin Novoa, e do Paraguai, Eladio Loizaga.

Aloysio explicou que a Venezuela não foi expulsa porque o bloco quer que ela integre o grupo. "É um elemento a mais para contribuir para que a Venezuela possa chegar a ter o direito de voltar ao Mercosul como país democrático", disse.

Na prática, a decisão não afeta as poucas exportações brasileiras para o país vizinho. "Só exportamos alimentos atualmente. Suspender isso agora só agravaria a crise", disse o chanceler brasileiro.

Entre as condições para o levantamento das sanções estão a libertação dos presos políticos, a restauração das competências do Legislativo, a retomada do calendário eleitoral e a anulação da Assembleia Constituinte.

"Na ditadura brasileira, nos queríamos que isolassem o regime que nos oprimia", disse Aloysio, ressaltando que a suspensão política é extremamente grave. Segundo ele a Venezuela se recusou a vir ao Brasil para consultas e diálogo com o bloco --o Brasil tem a presidência pro tempore do grupo. Após assumir a presidência pro tempore do Mercosul, a diplomacia brasileira, chegou a convidar Maduro e membros da oposição venezuelana para virem a São Paulo, em uma tentativa de intermediar o diálogo. No entanto, não obteve resposta.

Segundo o chanceler uruguaio, a decisão do bloco foi em favor do povo venezuelano. "Sem renunciar ao diálogo, estamos comprometidos com a democracia", disse Rodolfo. Ele ainda lembrou que a "Venezuela recebeu pessoas que fugiram das ditaduras dos nossos países".

Para o chanceler argentino, a decisão é política e deixa claro que "sem democracia, não há como fazer parte do Mercosul". "É ruim colocar um irmão fora da porta. É triste. Vemos lá mortos, vermos a repressão. Basta desta Venezuela repressora e ditatorial".

A reunião foi convocada de forma extraordinária pelo Brasil, que ocupa a presidência rotativa do bloco, após a Venezuela promover eleição para a Assembleia Nacional Constituinte, no último domingo (30). O pleito foi rejeitado por boa parte da comunidade internacional por ser considerado uma manobra do presidente venezuelano Nicolás Maduro contra o Parlamento do país, formado, em sua maioria, por oposicionistas.

Veja abaixo a nota divulgada pelo ministério brasileiro das Relações Exteriores sobre a reunião do Mercosul:

A República Argentina, a República Federativa do Brasil, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai,
 
CONSIDERANDO
 
Que, de acordo com o estabelecido no Protocolo de Ushuaia sobre Compromisso Democrático no MERCOSUL, subscrito em 24 de julho de 1998, a plena vigência das instituições democráticas é condição essencial para o desenvolvimento do processo de integração;

Que toda ruptura da ordem democrática constitui obstáculo inaceitável para a continuidade do processo de integração;
 
Que, nas consultas realizadas entre os Chanceleres dos Estados Partes do MERCOSUL, constatou-se a ruptura da ordem democrática na República Bolivariana da Venezuela, consignada na "Declaração dos Estados Partes do MERCOSUL sobre a República Bolivariana da Venezuela", de 1o de abril de 2017, e, desde então, celebraram consultas entre si e solicitaram ao Estado afetado a realização de consultas;
 
Que as consultas com a República Bolivariana da Venezuela resultaram infrutíferas devido à recusa desse Governo de celebrá-las no marco do Protocolo de Ushuaia;
 
Que não foram registradas medidas eficazes e oportunas para a restauração da ordem democrática por parte da República Bolivariana da Venezuela;
 
Que o espírito do Protocolo de Ushuaia sobre Compromisso Democrático é o restabelecimento da institucionalidade democrática no Estado afetado;
 
Que a aplicação do Protocolo de Ushuaia não deve interferir no funcionamento do MERCOSUL e de seus órgãos, nem produzir qualquer prejuízo ao povo venezuelano;
 
Que os Estados Partes do MERCOSUL se comprometem a trabalhar em favor do restabelecimento da ordem democrática na República Bolivariana da Venezuela e da busca de uma solução negociada e duradoura em prol do bem-estar e do desenvolvimento do povo venezuelano.
 
DECIDEM:
 
1) Suspender a República Bolivariana da Venezuela de todos os direitos e obrigações inerentes à sua condição de Estado Parte do MERCOSUL, em conformidade com o disposto no segundo parágrafo do artigo 5º do Protocolo de Ushuaia.
 
A suspensão a que se refere o parágrafo anterior terá efeito a partir da data da comunicação da presente Decisão à República Bolivariana da Venezuela, de acordo com o disposto no artigo 6º do Protocolo de Ushuaia.
 
2) Os Estados Partes definirão medidas com vistas a minimizar os impactos negativos desta suspensão para o povo venezuelano.
 
3) A suspensão cessará quando, de acordo com o estabelecido no artigo 7º do Protocolo de Ushuaia, se verifique o pleno restabelecimento da ordem democrática na República Bolivariana da Venezuela.
 
4) Enquanto durar a suspensão, o disposto no inciso III do artigo 40 do Protocolo de Ouro Preto dar-se-á com a incorporação realizada por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, nos termos do inciso II do referido artigo.