Brasil quer entrar no clube dos ricos, mas vai contra recomendações da OCDE
Com o apoio oficial do governo dos Estados Unidos ao ingresso do Brasil na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), autoridades brasileiras deram sinais de que o país poderia ser aceito no chamado "clube dos ricos" nos próximos três anos. O ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), afirmou que o Brasil, "ao internalizar as práticas da OCDE", melhora sua governança interna e a chegada do investimento internacional.
A questão é que, em vários pontos, o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) vai na contramão do que a OCDE recomenda como boas práticas de governança --o governo age de forma contrária inclusive em pontos que a organização sugere para o próprio Brasil.
O UOL selecionou cinco temas entre algumas das recomendações feitas pela OCDE e o posicionamento que o governo Bolsonaro tem proposto adotar nessas situações.
Velocidade nas estradas
Um estudo apresentado no ano passado pelo Fórum Internacional dos Transportes (ITF, sigla em inglês), organismo ligado à OCDE, afirma que a redução da velocidade nas estradas as torna mais seguras.
Segundo o levantamento, o aumento da velocidade média foi acompanhado por um maior número de acidentes e vítimas, a diminuição foi associada a menos acidentes e vítimas e, em nenhum caso, o aumento na velocidade média coincidiu com menos acidentes ou vítimas. Também aponta como benefícios da diminuição da velocidade as reduções de poluentes, do consumo de combustível e da poluição sonora.
Os autores do estudo recomendam ainda a aplicação de um limite de velocidade de 30 km/h em áreas urbanas em que veículos motorizados e usuários vulneráveis compartilhem o mesmo espaço. Define como limite 50 km/h em áreas urbanas com cruzamentos e alto risco de colisões laterais, e 70 km/h em estradas em áreas rurais sem risco de colisões frontais.
A sugestão vai completamente contra o que o governo Bolsonaro defende. O próprio presidente já afirmou que vai retirar radares de rodovias federais, reduzindo a fiscalização sobre a velocidade.
Impostos sobre o cigarro
A OCDE, em seu relatório mais recente, que abrange dados de 2017, adota as recomendações da OMS (Organização Mundial de Saúde) e destaca que altos níveis de impostos e políticas mais rigorosas em relação ao uso do tabaco levaram a fortes reduções no tabagismo na maior parte dos países da organização. Entre as medidas destacadas, estão não só o aumento de impostos, mas também as proibições de publicidade e até mesmo a criação do Dia Mundial sem Tabaco.
O documento destaca ainda o fato de que o Brasil é o país com menor número de fumantes diários (acima dos 15 anos) entre os integrantes e associados.
Mas o governo do presidente Bolsonaro sinalizou que deve ir na direção contrária a essas determinações. O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, criou um grupo de trabalho para analisar a "redução da tributação de cigarros fabricados no Brasil".
A medida, segundo o que foi publicado no Diário Oficial, pretende "diminuir o consumo de cigarros estrangeiros de baixa qualidade, o contrabando e os riscos à saúde dele recorrentes". É fonte de preocupação para vários setores de saúde, mas agrada os grandes fabricantes de cigarro no país, que se queixam da concorrência da mercadoria contrabandeada --e mais barata-- vinda do Paraguai.
Redução do desmatamento
No último relatório econômico com recomendações para o Brasil, a OCDE pede para o país "fortalecer o crescimento verde" ao "garantir a continuidade do declínio do desmatamento, inclusive por meio da aplicação rígida das leis e da manutenção do status de áreas atualmente sob proteção ambiental".
Entretanto, o Ministério do Meio Ambiente de Bolsonaro fechou o Departamento de Florestas e Combate ao Desmatamento, criado em 2007. Dados do Deter (Sistema de Detecção do Desmatamento na Amazônia Legal em Tempo Real), ferramenta do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), revelaram que, levando em conta somente os dos primeiros 15 dias de maio, a Amazônia perdeu 19 hectares de florestas por hora.
Além disso, o governo Bolsonaro quer usar parte do Fundo Amazônia, que deve ser usado para a preservação da floresta, para indenizar proprietários com terras em zonas protegidas --o dinheiro do fundo vem da Petrobras e dos governos da Alemanha e da Noruega.
Dinheiro para a educação
O mesmo relatório econômico recomenda que o Brasil gaste de uma forma diferente o dinheiro investido na educação: "deslocar os gastos com educação superior para os ensinos pré-primário, fundamental e médio elevaria simultaneamente a progressividade e a eficiência". A OCDE sugere ainda que, "na alocação de vagas escassas na educação pré-escolar, a preferência deveria ser dada a famílias de baixa renda e mães solteiras, pois permitiria que mais mulheres participassem do mercado de trabalho".
No discurso, é o que o governo Bolsonaro promete fazer. Mas os congelamentos anunciados pelo MEC (Ministério da Educação) atingiram a educação básica, desde a educação infantil até o ensino médio e as universidades federais.
Segundo a Folha, foram congelados até agora R$ 680 milhões da educação básica, além de parte do orçamento autorizado para a construção e manutenção de creches e pré-escolas. Medidas envolvendo livros didáticos e transporte escolar também foram afetadas. Nem o programa de alfabetização de jovens e adultos escapou dos bloqueios.
Integração de refugiados
Relatório publicado pela OCDE em janeiro faz uma série de recomendações para auxiliar no processo de integração de refugiados, com base no Pacto Global sobre Refugiados da ONU e nos trabalhos da OCDE. Entre elas, o estudo sugere o aumento da cooperação internacional e ajuda mútua, coordenando agentes humanitários; a integração de refugiados e migrantes no mercado de trabalho, reconhecendo suas habilidades e dando suporte ao idioma do país que os recebe; promoção de uma estratégia de integração de longo prazo, incluindo o torno ao país de origem, se for o caso.
Bolsonaro retirou o Brasil do pacto da ONU no começo de seu mandato, assim como os EUA --representantes da direita radical europeia são críticos ao acordo, pois afirmam que ele vai aumentar a imigração na Europa.
O chanceler Ernesto Araújo já afirmou que a "imigração não deve ser tratada como questão global, mas sim de acordo com a realidade e a soberania de cada país".
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