Topo

O liberal e a populista: eleição primária na Argentina respira polaridade

Cristina Kirchner e Mauricio Macri representam a polarização política na Argentina - AFP
Cristina Kirchner e Mauricio Macri representam a polarização política na Argentina Imagem: AFP

Afonso Ferreira

Do UOL, em São Paulo

11/08/2019 14h22Atualizada em 11/08/2019 16h18

Mais de 33 milhões de argentinos vão às urnas hoje para escolher quem vai concorrer à Presidência do país em outubro. As eleições primárias --oficialmente chamadas de Paso (Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias)-- trazem dez pré-candidatos, mas a disputa está concentrada nas duas principais chapas: a do atual presidente, Mauricio Macri, e a da ex-presidente Cristina Kirchner.

As duas frentes têm visões divergentes em vários temas, como economia e política externa, e são reflexo da polarização na Argentina, muito semelhante ao que foi visto nas eleições brasileiras do ano passado, com Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) disputando a Presidência. Veja a seguir o que cada chapa representa para os argentinos.

Maurício Macri tenta reeleição

Miguel Angel Pichetto (à esq.) é vice na chapa encabeçada pelo presidente Mauricio Macri - Ignacio Izaguirre/Reuters - Ignacio Izaguirre/Reuters
Miguel Angel Pichetto (à esq.) é vice na chapa encabeçada pelo presidente Mauricio Macri
Imagem: Ignacio Izaguirre/Reuters

Eleito em 2015, Macri tenta se manter no comando da Argentina por mais quatro anos. Depois de vencer as últimas eleições com promessas de mudanças, dando fim a mais de uma década de kirchnerismo, Macri tem visto sua popularidade cair por não conseguir tirar o país de uma grave crise econômica.

Para tentar ampliar seu eleitorado, foi escolhido como vice na chapa "Juntos pela Mudança" o peronista Miguel Pichetto, presidente do Partido Justicialista no Senado argentino. Apesar de sua inclinação política diferente da de Macri, Pichetto tem buscado se distanciar da ala mais à esquerda do peronismo, liderada por Cristina Kirchner.

Com uma visão mais liberal, Macri propõe um plano de reformas para o país e uma maior abertura comercial. Durante a campanha, fez críticas ao legado do kirchnerismo, incluindo denúncias de corrupção, e falou sobre alguns avanços que teria conquistado em seu mandato, entre eles a liberdade de imprensa, maior transparência e combate ao narcotráfico.

Suas principais promessas ao se eleger eram acabar com o protecionismo e os subsídios de governos anteriores para atrair investidores. Mas pouco disso se concretizou. Agora, Macri aposta no fortalecimento do Mercosul e numa parceria com o governo Bolsonaro para melhorar a situação econômica argentina.

Cristina Kirchner tenta voltar ao poder

Cristina Kirchner e Alberto Fernández - Divulgação/Frente de Todos - Divulgação/Frente de Todos
A ex-presidente Cristina Kirchner participa de ato político ao lado do candidato à presidência Alberto Fernández
Imagem: Divulgação/Frente de Todos

Ex-presidente (de 2007 a 2015) e atual senadora, Cristina Kirchner tenta voltar ao poder na Argentina. Mas, dessa vez, ela é pré-candidata a vice na chapa encabeçada por Alberto Fernández. Com isso, Kirchner tenta, ao mesmo tempo, trazer sua base de apoio a Fernández e reduzir a rejeição ao seu nome, já que não será a mandatária.

O pré-candidato da "Frente de Todos" atuou no primeiro ano de governo de Cristina, mas depois rompeu com a ex-presidente e passou a criticá-la. Fernández é contra algumas bandeiras do kirchnerismo, como o aumento da tributação de grandes empresários.

Os governos Kirchner ficaram marcados pelo protecionismo econômico e por políticas sociais. A chapa tem feito críticas ao governo Macri, especialmente pela escalada da inflação e pelo aumento da pobreza e do desemprego no país nos últimos anos.

Tirar a população da pobreza é justamente a principal promessa de campanha da dupla. Na política externa, Fernández defende uma abertura moderada, mantendo algumas travas protecionistas, e diverge de Kirchner quanto à aproximação de governos com ideais bolivarianos, como o da Venezuela.

Polarização é fenômeno global, diz pesquisador

A polarização política não é exclusividade da Argentina ou do Brasil, mas um fenômeno global, segundo o professor da universidade de George Washington e CEO do instituto de pesquisas Ideia Big Data, Maurício Moura. "Vimos isso acontecer nas eleições americanas, nas francesas e deve se repetir em outros países", afirmou.

Para ele, as eleições argentinas têm algumas semelhanças com a brasileira. A principal é o alto índice de rejeição que as duas principais forças políticas enfrentam nos dois países. "No Brasil, a rejeição ao PT foi maior, o que acabou dando a vitória ao bolsonarismo. Na Argentina, a rejeição é igual. Por isso, pode ser mais imprevisível do que foi no Brasil."

Por outro lado, Moura diz que há uma diferença importante no país vizinho. Enquanto no Brasil, a disputa era entre um candidato do sistema e outro de fora com um discurso contrário à chamada "velha política", na Argentina as duas vertentes representam a política tradicional. O que deve decidir as eleições é a percepção da economia, segundo o especialista.

"Macri representa uma continuidade, para quem acha que melhorou, e Kirchner é uma volta ao passado, para quem acha que antes era melhor. A economia vai ser a chave da disputa", declarou.