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Do combustível à crise política: o que está acontecendo no Equador?

Carlos Garcia Rawlins - 7.out.2019/Reuters
Imagem: Carlos Garcia Rawlins - 7.out.2019/Reuters

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

09/10/2019 16h17

Resumo da notícia

  • Equador vive onda de protestos após aumento no preço de combustíveis
  • Manifestantes criticam medidas de austeridade de Lenín Moreno
  • Acordo foi feito com o FMI para liberar dinheiro de empréstimo

O aumento nos preços de combustíveis em meados de setembro desencadeou uma onda de protestos no Equador. Os mais fortes aconteceram ontem, quando houve tentativa de invasão de manifestantes a prédios públicos. As ações são contra as medidas econômicas adotadas pelo governo do presidente Lenín Moreno.

Moreno cortou os subsídios dos combustíveis. A medida de austeridade veio após um acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional) para que o país, que tem problemas financeiros, possa conseguir crédito de R$ 17,2 bilhões.

Agências internacionais apontam que a dívida pública externa do Equador está em cerca de R$ 162 bilhões, algo como 36% do PIB (Produto Interno Bruto). O presidente diz querer acabar com todas as "distorções na economia".

Além do fator econômico, o político também teria incentivado os protestos no país. Moreno é sucessor do ex-aliado Rafael Correa. O atual presidente do Equador foi eleito com uma plataforma semelhante à de Correa, ligado à esquerda, mas, na prática, tem um governo com uma pauta mais liberal. Moreno comanda o país desde 2017 e culpa Correa por tentar tirá-lo do poder. O ex-presidente nega.

Desde o início dos protestos, na semana passada, já houve registro de morte e de centenas de detenções. Em alguns atos, policiais chegaram a ser feitos reféns. A onda de protestos levou o governo a decretar estado de exceção. A sede da Presidência também foi transferida da capital, Quito, para Guayaquil.

O estado de exceção permite ao governo ações como restrição à livre circulação, uso do Exército para controlar as ruas e até censura prévia à imprensa.

Segundo agências internacionais, o preço do galão de diesel passou de US$ 1,03 para US$ 2,30 (R$ 4,22 para R$ 9,43), e o da gasolina foi de US$ 1,85 a US$ 2,40 (R$ 6,47 para R$ 9,83)

Congresso do Equador é invadido durante protesto

Band Notí­cias

Para Cristina Pecequilo, doutora em ciência política e professora de relações internacionais da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), o valor dos combustíveis foi apenas um "gatilho" para os protestos.

"Desde o início [do governo], já vem uma insatisfação muito grande com a postura dele [do presidente]", citando a mudança na agenda. "Existe toda uma situação de insatisfação popular. Com o aumento dos combustíveis, houve um gatilho natural para que essa insatisfação se transformasse em manifestações mais pesadas, que, agora, o governo não está sabendo como resolver."

A elevação do preço dos combustíveis --a alta teria chegado a 123%-- teria levado ao aumento de itens da cesta básica. Comerciantes foram presos por subir preços de produtos.

"Medidas de austeridade, em nenhuma circunstância na história, foram populares, bem vistas pela população, porque você tem um impacto real no dia a dia. E isso é explosivo", avaliou a doutora em relações internacionais Manoela Miklos, especialista em América Latina. "Esse governo teve que tomar medidas que iam na contramão do que tinha prometido e isso, em si, já gera um desconforto, uma disposição para se opor", complementou.

O Brasil —assim como Argentina, Colômbia, El Salvador, Guatemala, Paraguai e Peru— demonstrou apoio a Moreno. Em comunicado conjunto, os governos disseram expressar "repúdio a qualquer tentativa de desestabilizar os regimes democráticos legitimamente constituídos".

Eles também demonstraram "forte apoio às ações empreendidas pelo presidente para recuperar a paz, a institucionalidade e a ordem, utilizando os instrumentos concedidos pela Constituição e pela lei, assim como ele vem fazendo".

Já a OEA (Organização dos Estados Americanos) disse que "a liberdade de expressão e de protesto pacífico são direitos fundamentais". "Não obstante, é injustificável que alguns atores convertam em direito a violência, o saque e o vandalismo."

Agora, é preciso avaliar quais serão os próximos acontecimentos no país e se haverá uma escalada na onda de protesto, segundo as especialistas. "Quando a gente tem esse choque entre o que é a expectativa da população e o cenário de miséria e desencanto social, é uma panela de pressão", diz Pecequilo.

O Equador pode servir de lição. "Tanto no Brasil como nos demais países que têm que lidar com sérios ajustes fiscais, vale observar o que acontece lá para não cometer os mesmos erros", afirmou Miklos.

Uma pessoa morre durante protestos no Equador

AFP