Protestos de exilados podem ter sido estopim em explosão na Coreia do Norte
Protestos por parte de norte-coreanos exilados no país vizinho podem ter sido o estopim para a explosão do escritório de ligações com o Sul na tarde desta terça (16) em Kaesong. Desde o início do mês, o governo de Kim Jong Un já vinha mostrando descontentamento com o envio de balões por cima da fronteira.
O envio de balões com críticas ao regime norte-coreano por parte de desertores é uma prática antiga que tem se intensificado. No geral, são enviados panfletos anticomunistas, com denúncias contra Kim Jong Un e itens provocadores, como comida.
Desde o fim de maio estas manifestações têm sido mais frequentes e organizadas. Elas são atribuídas a parte de um grupo de exilados chamado "Fighters for Free North Korea" (Guerreiros pela Coreia do Norte Livre). Isso tem irritado a cúpula de Kim Jong Un.
"Manifestantes estavam enviando panfletos com críticas ao Kim Jong Un e até conteúdo pornográfico para provocar as autoridades. Este é o tipo de coisa que, para o governo norte-coreano, após diversas notas de repúdio, é considerado muito reprovável", avalia Raphael Puig, membro do CEPS (Centro de Estudos da Política Songun), especializado em política e história da Coreia do Norte.
Por meio da rede estatal KCNA, Pyongyang declarou que este tipo de conteúdo era uma provocação "mais grave do que o uso de armas e exercícios militares".
A situação chegou a um ponto que, de acordo com Choe Sang-Hun, correspondente sul-coreano do "The New York Times", até o governo sul-coreano estava ficando incomodado e passou a tentar barrar os protestos, para evitar retaliações.
Escalada começou em 9 de junho
Embora as ações sejam consideradas repentinas, o governo norte-coreano já vinha mostrando sinais de insatisfação. Como protesto, o país já havia rompido em 9 de junho a comunicação no escritório conjunto, que estava fisicamente desativado desde janeiro.
Neste dia, a Coreia do Sul tentou fazer a chamada na linha de diálogo, mas, pela primeira vez em 21 meses, não teve resposta do país vizinho.
Na última sexta (13), Kim Yo Jong, irmã de de Jong Un e chefe das Relações Exteriores no país, subiu o tom ao relatar a insatisfação quanto às manifestações. "Sinto que já é hora de romper com as autoridades sul-coreanas. Tomaremos as próximas ações em breve", afirmou, por meio da KCNA.
Neste mesmo dia, as autoridades norte-coreanas já haviam criticado duramente a Coreia do Sul, chamando de "absurdas" as declarações de Seul sobre o diálogo a respeito de armas nucleares interrompido com o governo dos Estados Unidos.
"A tensão começou a ficar grande. E, como houve o aumento da barreira militar sul-coreana, a Coreia do Norte passou a entender que eles não querem mais diálogos", avalia Puig.
'Situação não está resolvida'
Para o estudioso da Coreia do Norte, a explosão do escritório é um comunicado claro de que, pelo menos por enquanto, o país não está interessado em continuar os diálogos acerca do tratado de paz assinado em 2018.
"Aquele foi um acordo histórico, e este escritório era importante, utilizado já há décadas para o diálogo. [A explosão] foi uma radicalização por parte do governo norte-coreano, o que é muito simbólico", afirma Puig.
Para ele, no entanto, isso não deve avançar para ações bélicas. "O fim do armistício significaria algo muito maior. Envolve esferas políticas, econômicas, sociais, além de outros países. Em ciências humanas não há resposta exata, mas não é provável", afirma.
A jornalista Ankit Panda, biógrafa de Kim Jong Un, afirmou à rede britânica BBC que este pode ser um lembrete, por parte do líder do norte, de que os dois países ainda estão em guerra e a situação não está resolvida.
"Nos próximos dias, nós podemos ver outros passos por parte da Coreia do Norte, que podem incluir demonstrações militares provocadoras, explosão de mísseis de artilharia próximas ao território sul-coreano ou medidas para reverter as conquistas do tratado militar de 2018 entre as duas Coreias", afirmou Panda.
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