Falsa bomba, jornalista preso: como e por que Belarus desviou voo da Grécia
Um avião comercial da Ryanair que voava de Atenas, na Grécia, para Vilnius, na Lituânia, foi obrigado a desviar da rota e fazer uma parada em Minsk, capital de Belarus, por causa de uma suposta ameaça de bomba. O alerta, no entanto, era falso. O desvio foi uma desculpa para que o governo bielorruso pudesse prender o jornalista — e opositor — Roman Protasevich.
O caso aconteceu no último domingo (23) e já provocou protestos furiosos de líderes internacionais. Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, definiu as ações de Belarus como "ultrajantes e ilegais", pediu a libertação de Protasevich e defendeu punição aos responsáveis por sua prisão.
O comportamento ultrajante e ilegal do regime de Belarus terá consequências. Os responsáveis pelo sequestro do avião da Ryanair devem ser punidos. O jornalista Roman Protasevich deve ser solto imediatamente. A Comissão Europeia discutirá amanhã [25] as medidas a serem tomadas.
Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia
O incidente aconteceu um dia antes de a Comissão Europeia se reunir justamente para discutir o endurecimento das sanções já existentes contra Belarus, em resposta à repressão imposta pelo governo de Alexander Lukashenko — considerado "o último ditador da Europa" — a manifestantes da oposição.
Mas como e por que o governo de Belarus desviou um avião para prender um único opositor? Como reagiram os países europeus?
Quem é Roman Protasevich
O jornalista bielorrusso Roman Protasevich, 26, iniciou seu ativismo ainda adolescente, na internet. Em 2012, aos 17 anos, foi preso por coordenar dois grupos na rede social russa Vkontakte contra o presidente Alexander Lukashenko, que governa Belarus desde 1994. Um deles se chamava "Estamos cansados deste Lukashenko".
Ele também trabalhou como fotógrafo para meios de comunicação de Belarus e, entre 2017 e 2018, recebeu uma bolsa Vaclav Havel para aspirantes a atuar como jornalista independente.
Protasevich abandonou Belarus em 2019, depois de começar a trabalhar para o Nexta ("Alguém", em bielorrusso), influente canal opositor no aplicativo Telegram, de onde foi editor-chefe. O canal teve um papel importante na organização dos protestos contra Lukashenko ao informar detalhes, horários e datas das manifestações.
O ativista, que vive entre a Polônia e a Lituânia, dois centros de exilados bielorrussos, é atualmente editor do canal BGM, que tem 260 mil assinantes. Sua companheira, Sofia Sapega, detida no domingo junto com ele, é estudante de Direito na Universidade Europeia de Humanidades (EHU) de Vilnius.
Em novembro, o governo de Belarus emitiu uma ordem de detenção contra Protasevich por seu trabalho no Nexta, alegando que o jornalista estaria envolvido em "atividades terroristas". Se a acusação for confirmada, o jornalista pode ser condenado à morte.
Falsa bomba e voo desviado
No domingo (23), a tripulação do voo FR4978 da Ryanair decidiu pousar em Minsk, "o aeroporto mais próximo", após ser informada de uma ameaça de bomba, segundo afirmaram hoje as autoridades bielorrussas.
De acordo com Igor Goloub, comandante da Força Aérea bielorrussa, a ameaça ao avião foi enviada por e-mail ao aeroporto de Minsk, em uma mensagem que se autoproclamava do Hamas palestino. "A decisão foi tomada pelo comandante da tripulação sem interferência externa", acrescentou.
A assessoria de imprensa de Lukashenko disse em seu próprio canal no Telegram que o presidente deu a ordem para desviar o voo e para que um caça MiG-29 acompanhasse o avião. O regime nega que tenha forçado o pouso da aeronave apenas para deter seu opositor.
Para a Organização da Aviação Civil Internacional (OACI), porém, o pouso forçado "pode ser uma violação da Convenção de Chicago", que protege a soberania do espaço aéreo das nações.
"A Organização da Aviação Civil Internacional (OACI) recebeu um pedido de investigação e diversas outras medidas, como a suspensão dos sobrevoos do território bielorrusso pelas companhias aéreas, a proibição de aterragem imposta à empresa nacional Belavia nos aeroportos europeus, a suspensão dos tráfegos, incluindo terrestres, para a União Europeia", disse a entidade em comunicado.
Reações furiosas
Os líderes europeus "não querem deixar [o caso] passar" e classificaram o desvio do voo da Ryanair como um ato de "terrorismo de Estado". "O incidente não ficará sem consequências", garantiu o presidente do Conselho da União Europeia, Charles Michel.
A posição europeia foi comunicada hoje ao embaixador de Belarus em Bruxelas, convocado pelo serviço diplomático do bloco e pela ministra belga dos Assuntos Estrangeiros, Sophie Wilmès. "Estamos trabalhando em um pacote de medidas, além de simples sanções individuais", disse uma fonte diplomática da RFI.
A unanimidade dos 27 países da UE é indispensável para qualquer punição.
A Lituânia decidiu proibir a partir de amanhã (25) qualquer voo de ou para aeroportos lituanos de cruzar o espaço aéreo bielorrusso. Já a Alemanha, por meio de seu Ministério das Relações Exteriores, decidiu convocar o embaixador bielorrusso em Berlim para prestar esclarecimentos.
Londres também convocou o embaixador de Belarus no Reino Unido. O chefe da diplomacia britânica, Dominic Raab, denunciou "um ataque ao direito internacional" e reiterou que seu país está preparando novas sanções contra o regime de Alexander Lukashenko.
Raab ainda afirmou que é "difícil acreditar" que Moscou não tenha dado seu aval ao desvio do voo da Ryanair para Minsk.
Os detalhes que temos não são claros sobre este assunto, mas é muito difícil acreditar que este tipo de ação pudesse ter ocorrido sem pelo menos o acordo das autoridades em Moscou [que constituem o principal apoio de Belarus].
Dominic Raab, Secretário de Estado do Reino Unido
Já o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky instruiu o governo a implementar sua "decisão de interromper as ligações aéreas diretas entre a Ucrânia e Belarus e fechar o espaço aéreo biolerrusso para voos a partir da Ucrânia ou destinados ao nosso país", de acordo com um comunicado de imprensa divulgado por Kiev.
O ministro das Relações Exteriores da Itália, Luigi Di Maio, chamou de "sequestro de Estado" a "inaceitável" interceptação do avião. "É claro que isso não é apenas uma questão europeia, mas uma questão de comunidade de valores que compartilhamos com muitos de nossos aliados, inclusive do outro lado do Atlântico ", acrescentou.
(Com informações da AFP e da RFI)
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