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Incas usavam bebidas calmantes em sacrifícios de crianças, aponta estudo

Traços de substâncias do ayahuasca foram encontrados nos restos mortais de duas crianças sacrificadas - Reprodução/ Johan Reinhard
Traços de substâncias do ayahuasca foram encontrados nos restos mortais de duas crianças sacrificadas Imagem: Reprodução/ Johan Reinhard

Colaboração para o UOL, em São Paulo

17/05/2022 04h00Atualizada em 17/05/2022 11h28

Um recente estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Varsóvia, na Polônia, revelou que, há mais de 500 anos, Incas utilizavam calmantes naturais em rituais de sacrifício. A descoberta foi publicada no Journal of Archaeological Science: Reports.

Segundo o site especializado em estudos científicos Science News, tudo começou em uma expedição de 1995, quando restos mortais de duas pessoas foram encontrados perto da montanha Ampato, no Peru. Os corpos provavelmente pertenciam a uma menina e um menino, ambos com idades entre 4 e 8 anos, sacrificados em uma cerimônia inca.

Anos depois da inusitada descoberta, a bioarqueóloga Dagmara Socha decidiu investigar os corpos e, em seu mais novo estudo, identificou evidências químicas de um dos principais ingredientes da ayahuasca, um chá conhecido por seus potenciais alucinógenos, nos corpos das duas crianças.

De acordo com a especialista, foram encontrados traços das substâncias harmina e harmalina, ambos produtos químicos das videiras Banisteriopsis caapi, nos cabelos da menina mumificada e também nas unhas do menino. É importante pontuar, no entanto, que não foram identificados quaisquer indícios dos fortes alucinógenos do ayahuasca.

Esta é a primeira [evidência] de que B. caapi poderia ter sido usada no passado por suas propriedades antidepressivas", narrou Socha, no estudo.

Nesse sentido, a arqueóloga Christine VanPool, da Universidade de Missouri, nos Estados Unidos, que não participou da pesquisa, acredita que as substâncias foram usadas de propósito nas duas crianças. "Eu provisoriamente digo que sim, os Incas entenderam que a B. caapi reduzia a ansiedade em vítimas de sacrifício", narrou ela.

Para a especialista, a teoria é sustentada por documentos escritos logo após a queda do Império Inca, nos quais espanhóis afirmam que o álcool era usado para acalmar aqueles que seriam sacrificados. VanPool acredita, entretanto, que os europeus teriam confundido uma bebida de B. caapi com a cerveja de milho popular na época — nenhum traço de álcool, inclusive, foi identificado no corpo das crianças.

Além dos indícios de harmina e harmalina, a pesquisa da Universidade de Varsóvia ainda revelou que ambas as jovens vítimas sacrificadas também mascaram folhas de coca semanas antes de passarem pela cerimônia. O uso das folhas, de acordo com documentos espanhóis, era bastante comum em ritos de passagem dos Incas.

Por fim, o arqueólogo Lidio Valdez, da Universidade de Calgary, não se surpreendeu com a possível administração de folhas de coca e de uma bebida calmante de B. caapi para as crianças. Isso porque as duas pequenas vítimas poderiam não compreender que seriam sacrificadas, mas tiveram que lidar com a longa viagem entre a região onde moravam e o local da cerimônia. Tal peregrinação, de acordo com a bioarqueóloga Dagmara Socha, poderia durar semanas e até meses.