Corpo de mulher achado 3 anos após a morte intriga ingleses e gera críticas
O corpo da secretária médica, Sheila Seleoane, 61, ficou em seu apartamento em Londres, na Inglaterra, por quase três anos, apesar de os vizinhos terem alertado as autoridades sobre seu sumiço. O cadáver foi descoberto em fevereiro, mas novos detalhes surgiram nos últimos dias, após investigação da imprensa inglesa. Esse fato misterioso, envolvendo toda a vizinhança e os parentes da senhora, deixou questões no ar: será que ninguém notou a sua falta?
"Ao agir neste caso, não fizemos a pergunta mais fundamental: Sheila está bem?", disse Ian McDermott, executivo-chefe da Peabody, uma das maiores e mais antigas associações habitacionais de Londres, com mais de 55 mil propriedades britânicas, que encomendou um relatório independente sobre o caso.
De acordo com o The Guardian, o inquérito sobre o ocorrido defende que Sheila era uma inquilina exemplar e o fato de ela ter morrido sem ser chamar atenção por tanto tempo, apesar de não pagar seu aluguel desde 2019 e dos vizinhos terem alertado autoridades, é um fato intrigante.
O corpo de Sheila foi encontrado no sofá de seu apartamento no terceiro andar, no sul de Londres, onde permaneceu sem ser detectados por cerca de dois anos e meio, apesar das repetidas tentativas de moradores locais de pedir à polícia para arrombar sua porta e verificar o seu bem-estar, o que não foi feito.
Ela não tinha amigos ou familiares próximos e seu sumiço foi alertado — mais uma vez — quando foram notados danos causados por uma tempestade na porta da varanda de seu apartamento e os oficiais foram obrigados a forçarem a entrada no apartamento da senhora.
O legista Julian Morris disse que ficou "claro que algo estava errado", com os relatos de que Seleoane parou de falar com o proprietário do imóvel por tanto tempo. Além disso, quando engenheiros de gás e o polícia tentaram entrar em contato com ela sem resposta ao longo desse tempo, a suspeita de algo não estava certo ficou ainda mais clara para ele. "Qualquer morte é triste. Morrer sem ser notado é difícil de compreender", disse o legista ao concluir o inquérito.
União da vizinhança
Há uma ironia silenciosa na forma como a morte de Sheila uniu seus vizinhos. O prédio tem 20 andares, com paredes finas e portas frágeis, mas foi só com seu sumiço que eles foram forçados a se conhecer.
"O padre disse que ela era uma pessoa muito amada", diz Christine (nome fictício dado ao The Guardian), uma gerente de eventos que morava em frente a ela. Ela perguntou à Peabody se ela poderia ir ao funeral, mas ninguém lhe enviou os detalhes. Em vez disso, mais tarde ela recebeu um link por e-mail para assistir a uma gravação do evento. Sheila, que tinha 61 anos quando morreu, recebeu um serviço cristão tradicional; os carregadores de caixão haviam colocado um arranjo de flores brancas em seu caixão de madeira. "Foi muito triste", diz Christine.
Apesar do enorme interesse da mídia na história de Sheila, pouco se sabe sobre ela. Antes de sua morte, poucos vizinhos sabiam o nome da mulher do apartamento 16. "Eu ouvia as chaves dela balançando na porta. Acho que ela tinha um horário comum para entrar e sair do apartamento, das 9h às 17h, mas eu mal a via", comenta Christine.
Foi somente após a morte de sua vizinha que ela descobriu que a senhora trabalhava como recepcionista médica, por meio de uma agência de trabalho temporário. "Era um tipo de trabalho administrativo; ela estava sempre vestida com calças pretas, sapatos formais e uma camisa branca", finaliza.
Parecia óbvio para os outros inquilinos que morava por lá que ela não estava viva. As faxineiras comunitárias tiraram o capacho dela para lavar o chão e o deixaram encostado na parede, onde ficou por meses. Sua caixa de correio no hall de entrada ficou tão cheia que o correio começou a transbordar para o capacho. As crianças brincavam com as cartas, e algumas dessas correspondências acabaram amontoadas no fundo do elevador. No início de 2020, Christine pegou uma das cartas e a abriu.
"Eu sei que não deveria abrir as cartas de outras pessoas, mas eu estava preocupada. Era uma carta da Peabody dizendo que ela não pagava o aluguel desde setembro de 2019". Então, a vizinha ligou para os proprietários para dizer que estava preocupada; a essa altura, ela estava comprando velas perfumadas e colocando toalhas embaixo da porta da frente por conta do cheiro, que causava náuseas.
Ela chamou a polícia duas vezes. "Eles vieram e ficaram do lado de fora da porta, mas disseram que não podiam sentir o cheiro de nada, que talvez ela tivesse ido embora ou deixado um animal de estimação para trás, ou que talvez alguma comida tivesse estragado e apodrecendo. Eu queria que eles arrombassem a porta, mas eles disseram que não podiam sem um mandado e que o proprietário precisava lidar com isso".
Na segunda vez que ela ligou para a polícia, achou a resposta deles ainda menos útil. "Eles pareciam bastante irritados - como se fôssemos apenas um bando de vizinhos intrometidos. Disseram que não podiam fazer nada."
Tratamento desumano
Um relatório independente sobre o caso, encomendado pela Peabody, apurou 89 tentativas de contato com a senhora entre agosto de 2019 e fevereiro de 2022. Depois de encontrarem seu corpo, apenas duas pessoas compareceram ao funeral, que ocorreu em abril: um irmão que se mantinha afastado dela e um representante da associação de moradores responsável pelo bloco de apartamentos onde ela morava
Há relatos de larvas e moscas no apartamento de Seleoane, além do mau cheiro. As autoridades da associação falharam em garantir qualquer "contato significativo" com ela, disse o relatório independente, preferindo uma abordagem distante, e-mail texto, carta ou mensagem telefônica, para evidenciar que o trabalho havia sido feito e não uma ida ao local para tentar falar direto com a senhora.
Em um comunicado, o executivo-chefe da Peabody, Ian McDermott, disse:
"Estamos devastados com o que aconteceu. Sentimos muito por nossa parte nisso e pedimos desculpas a Sheila, sua família e a todos que vivem em Lord's Court.
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