'Não sei se minha família estará viva', diz palestina sobre bombardeios
A palestina Maynara Nafe, 21, teme pela segurança de parentes após bombardeios israelenses na Faixa de Gaza. Ao UOL, ela disse que a onda de violência se estende pelo território da Cisjordânia e que palestinos têm sofrido discriminações após o grupo radical Hamas assumir a autoria do ataque contra Israel, no sábado (7).
O que acontece
A escalada da violência na Cisjordânia, território palestino que faz fronteira a leste com Israel, aumentou significativamente nos dois últimos dias. Segundo Maynara, que é secretária de juventude da Fepal (Federação Árabe Palestina do Brasil), foi possível perceber desde ontem o aumento da violência. "O risco de sair de casa e não voltar é muito grande. Ontem e hoje, se uma pessoa sai de casa, é quase certeza que de não vai voltar."
Maynara mora no Brasil, mas relata que vive momentos de intensa preocupação desde ontem, quando recebeu informações de parentes em território palestino. "Tive um momento de colapso pessoal. Não sei o dia de amanhã, não sei se amanhã minha família vai estar viva. Não sei se as pessoas vão estar vivas", afirma.
Ela conta que tem três tios, quatros primos e tios-avós vivendo na Cisjordânia atualmente. "Cerca de 80% da minha família mora lá. Meus avós também viviam lá até 2019, quando faleceram." A jovem conta que, no sábado (7), acordou com uma ligação da prima. "Ela me ligou chorando às 5h, dizendo que não sabia como seria o dia de amanhã."
Maynara afirma que conversou com uma prima e um tio ontem. "O primeiro contato que eu tive foi com a minha prima. Ela me passou essa situação de desespero, foi o primeiro contato. Ela me disse: 'Não sei o que fazer, os bombardeios vão começar.'" Momentos depois, ela relata que conversou com o tio: "Ele disse que não estava com medo, que ele se deparava com a morte todos os dias".
Tive um momento de colapso pessoal. Não sei o dia de amanhã, não sei se amanhã minha família vai estar viva. Não sei se as pessoas vão estar vivas.
Maynara Nafe, palestina-brasileira com parentes na Cisjordânia
Distâncias e fronteiras
A Cisjordânia está localizada a 93,2 km da Faixa de Gaza, segundo Maynara. Isso faz com que os efeitos da violência em Gaza repercutam também em territórios vizinhos. "A gente consegue perceber [os bombardeios] porque o ar muda, surge uma fumaça mais densa no céu. É possível ver as bombas atiradas. Conseguimos ficar sabendo mesmo se não tivéssemos acesso às notícias."
"A Faixa de Gaza é completamente cercada desde 2007. Ninguém entra nem sai sem a autorização de Israel. Ninguém quer deixar a família, ninguém quer sair. Entrar lá é quase impossível", diz Maynara.
A região enfrenta limitações para o acesso à água e à energia. Segundo ela, é proibida a entrada de itens como chocolates no território. Maynara relata que, durante a pandemia de covid-19, não entravam insumos nem alimentos no território da Faixa de Gaza.
Palestinos vivem sob desespero, diz a jovem. "Tudo que está acontecendo lá é muito complicado. A partir da fala do meu tio, entendi uma coisa: as pessoas que vivem não tem o que perder. É como se fosse uma última tentativa essa resistência. É como se nascessem para morrer, como se não tivessem o direito de viver."
Discriminação e medo
Para Maynara, os territórios palestinos vivem sob "um sistema colonial". "Tenho muita admiração pelos palestinos que vivem lá neste momento, sei o quanto é difícil ocupar a Palestina. Mas é um sentimento misto porque sabemos que corremos risco de vida o tempo todo."
Após o Hamas ter assumido a autoria dos ataques contra Israel, a população palestina tem sido alvo de discriminação e xenofobia. "A comunidade palestina no Brasil é muito grande. Estamos vivendo um problema muito grande, estamos sendo constantemente atacados."
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Quero receberMaynara relata que o pai, que também vive no Brasil, está preocupado com as consequências dos bombardeios. "Ele disse que tem muito medo das reações. Não sabemos o que pode acontecer."
Crise humanitária
Os ataques iniciados pelo Hamas contra a Israel abrem um período de incertezas e crise humanitária no território palestino. Nas últimas horas, as autoridades israelenses cortaram o abastecimento de energia elétrica para a região, deixando milhares de pessoas sem luz.
Gaza vive sob o bloqueio de Israel há 16 anos. O isolamento provoca um cenário humanitário considerado crítico, com pobreza e fome dominando os 2 milhões de habitantes.
Neste período, quatro conflitos atingiram a região. De um lado, grupos palestinos acusavam Israel de transformar Gaza em uma prisão a céu aberto. De outro, israelenses acusavam o Hamas de usar o sofrimento dos civis para justificar seus objetivos políticos.
Segundo a ONU, as taxas de pobreza na comunidade de refugiados palestinos, que constituem a maioria da população de Gaza, estão em torno de 81,5%. O PIB per capita de Gaza —de cerca de US$ 1.000 por ano— é atualmente quatro vezes menor do que o dos países vizinhos ou mesmo o da Cisjordânia.
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