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Já ouvir falar em fazenda de bile? Ursos são criados para gerar medicamento

Do UOL, em São Paulo

07/10/2016 06h00

Em alguns países da Ásia, empresas farmacêuticas transformam a bile (ou bílis) de ursos-negros-asiáticos (Ursus thibetanus) em um pó que é usado na produção de medicamentos que, segundo a medicina oriental, servem para curar doenças no fígado e nos olhos. Os animais são mantidos em gaiolas e passam por "ordenha" do líquido, produzido pelo fígado para ajudar na digestão e absorção de nutrientes.

O procedimento é legalizado na China, mas mal visto pela população. No Vietnã, lei aprovada em 2005 tornou ilegal a extração e venda de bile e a posse de animais selvagens sem registro, embora a fiscalização seja fraca. E enquanto em alguns países há um esforço para colocar fim à prática, no Laos ela está começando a se desenvolver e ganhando espaço após a decisão vietnamita.

Estudo da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, estimou que o número de ursos presos para retirada da bile tenha aumentado de 10 em 2008 para 122 em 2012, o que pode aumentar a caça aos animais e prejudicar a população de ursos em países asiáticos.

Reação na China

Apesar de milenar, a produção de bile é duramente condenada por ativistas dos direitos dos animais e tem sido cada vez mais atacada pela população chinesa.

Em 2011, a farmacêutica Guizhentang, maior produtora chinesa de extrato, decidiu fazer uma oferta pública inicial de ações e enfrentou uma forte ação contrária. Manifestantes fantasiados de urso fizeram piquetes em farmácias, hackers derrubaram o website da Guizhentang e mais de 70 celebridades chinesas circularam um abaixo assinado pedindo que a bolsa de valores rejeitasse a oferta de ações da farmacêutica.

Depois de alguns dos maiores veículos noticiosos da China exibirem imagens dos animais em jaulas onde mal conseguiam se mexer, a empresa revogou o pedido. Mas, apesar das denúncias de que os animais resgatados eram encontrados com sinais de tortura, o chefe da administração estatal de medicamentos tradicionais chineses, Fang Shuting, sugeriu na ocasião que os ursos gostavam do processo, que era "natural, fácil e indolor".

Quatro anos depois, outra farmacêutica, a Kaibao, anunciou ter encontrado uma fórmula sintética com as mesmas propriedades da bile de urso, o que pode significar o fim das fazendas de extração. O projeto recebeu investimentos do governo chinês, mas um dos maiores desafios é convencer a população a abandonar o consumo dos medicamentos que usam a matéria-prima.

A fundação Animals Asia, que atua pelo fim da prática, calcula que mais de 10 mil ursos vivem em fazendas de extração na China e cerca de 1.200 no Vietnã, mas também há relatos de criações no Laos e em outros países asiáticos.

Gaiolas para ordenhas

De acordo com organização, os ursos são capturados ainda filhotes, vendidos às fazendas por cerca de US$ 2.000 e mantidos em gaiolas entre 10 a 20 anos. Quando adultos, sofrem uma incisão no abdômen por onde são inseridos os tubos que recolhem o líquido biliar.

A "ordenha", como é chamado o procedimento, acontece enquanto os animais se alimentam, momento em que a bile circula pelo organismo.

A organização construiu santuários ao norte de Hanói, capital vietnamita, e na China, onde abriga ursos resgatados --na China, são cerca de 250 animais no local.