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Mensalão e CPMF são maiores fracassos políticos do governo Lula

Presidente do PTB, Roberto Jefferson, em 2004, ao lado de três futuros desafetos: Lula, o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o ministro do Turismo, Walfrido dos Mares Guia - Aílton de Freitas/Agência O Globo
Presidente do PTB, Roberto Jefferson, em 2004, ao lado de três futuros desafetos: Lula, o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o ministro do Turismo, Walfrido dos Mares Guia Imagem: Aílton de Freitas/Agência O Globo

Maurício Savarese<br>Do UOL Notícias

Em São Paulo

31/12/2010 07h00

A maior crise política na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva o fez abandonar a fórmula de governar quase exclusivamente com partidos da esquerda. E a derrota na prorrogação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) demonstrou a fragilidade da agenda do Palácio do Planalto no Poder Legislativo. É essa a avaliação de especialistas ouvidos pelo UOL Notícias.

Para eles, o escândalo do mensalão, detonado em 2005 e ainda com 40 réus a serem julgados no STF (Supremo Tribunal Federal), produziu as mudanças mais profundas e contrárias às intenções de Lula: forçou a demissão do então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, abateu a cúpula do PT, atingiu aliados de vários partidos e levou à recomposição ministerial, com redução de aliados históricos e mais conservadores.

Além dos efeitos políticos imediatos e danosos ao governo, a crise no PT, que empunhava a bandeira da ética desde seu início, na década de 80, se espraiou pelas eleições presidenciais de 2006 e de 2010. O rótulo “mensaleiro” se colou a várias figuras proeminentes no primeiro mandato de Lula, afetando as chances do partido principalmente em São Paulo – Estado mais rico do país e bastião oposicionista.

Já a votação da prorrogação da CPMF, em 2008, mostrou a fragilidade dos governistas no Senado – principal baluarte da oposição nos últimos anos. Lula acreditou que sua proposta de destinar exclusivamente à saúde os cerca de R$ 40 bilhões anuais obtidos com a cobrança sensibiliza os adversários. O resultado foi a derrota de um governo que, para os analistas, teve fraca agenda legislativa.

“O mensalão, além da crise ética, aponta a inviabilidade do desenho do início do governo Lula, apenas com partidos de esquerda no ministério e operando na base do varejo com os outros”, disse o cientista político Luciano Dias, do Ibep (Instituto Brasileiro de Estudos Políticos). “A derrota na CPMF foi forte porque o governo teve pouca agenda no Congresso. E só põe para votar se acha que vai vencer.”

Congresso e Conselho de Segurança

O cientista político Francisco Fonseca, da FGV (Fundação Getúlio Vargas) lembra “entre avanços e problemas”, a eleição para a presidência da Câmara em 2005. Lula preferia Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP) no cargo. O mineiro Virgílio Guimarães, do mesmo partido, dividiu a base aliada. A vitória, com a ajuda da oposição, acabou com Severino Cavalcanti (PP-PE), um deputado do baixo clero.

 

“Mas essa foi a única grande dificuldade na Câmara. No governo Lula as dificuldades históricas se concentraram no Senado, onde muitas CPIs começaram e que teve papel importante durante as denúncias do mensalão”, afirmou. “O caso da CPMF foi mais pontual, com pressão da mídia e de setores organizados. Além do mensalão, o governo teve derrotas pontuais, não persistentes nem impeditivas a Lula.”

Nas arenas internacionais, a principal derrota da chancelaria de Lula foi na pressão pela reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Apesar da ascensão do país nos foros de debate e da recheada agenda de viagens de membros do alto escalão do governo ao exterior, o presidente viu os Estados Unidos, maiores entraves para a mudança, declararem apoio à Índia antes de cogitarem a inclusão do Brasil no grupo.

“Essa perseguição do objetivo máximo de uma cadeira permanente no Conselho, uma meta no mínimo questionável, fez o Brasil gastar oito anos com alinhamento a países pouco relevantes para ter uma base de votação. E não valeu a pena”, afirma o cientista político Cristiano Lohbauer, do Gacint – Grupo de Análise da Conjuntura Internacional da Universidade de São Paulo.

“Ficamos obcecados pelo prestígio que teríamos com a entrada em um órgão que não tem orçamento, em uma ONU que lida com apenas US$ 5 bilhões para tudo que faz e que recebe 25% do financiamento nos EUA. Enquanto isso, não fizemos nada em matéria de aproximação regional, porque o Mercosul estagnou e a Argentina faz o que quiser na área comercial. Terminamos oito anos mais longe da integração regional.”

Lula tem mais de 40 diplomas de doutor honoris causa para receber em universidades do mundo inteiro. Convites para dirigir ONGs, ministrar palestras. Mas, como não poderia deixar de ser após oito anos no Palácio do Planalto, também terá mágoas e fracassos para digerir durante as horas de descanso em São Bernardo do Campo.