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Leia a transcrição em português da entrevista de Wendy Sherman à Folha e ao UOL

Do UOL, em Brasília

06/02/2012 07h00

Leia a transcrição da entrevista de Wendy Sherman à Folha e ao UOL

A subsecretária para assuntos políticos do Departamento de Estado dos Estados Unidos, Wendy Sherman, participou do programa "Poder e Política - Entrevista", conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 3.fev.2012 no estúdio do Grupo Folha em Brasília. O projeto é uma parceria do UOL e da Folha.

Leia a transcrição da entrevista e assista ao vídeo:


>>Fotos da entrevista com Wendy Sherman.

Narração de abertura: A embaixadora Wendy Sherman tem 62 anos. É uma das pessoas mais influentes do governo de Barack Obama.

Wendy Sherman assumiu o cargo de subsecretária para assuntos políticos do Departamento de Estado dos Estados Unidos em setembro de 2011. Nessa posição, é a 3ª pessoa mais importante na diplomacia norte-americana.

Antes do governo Obama, Wendy Sherman teve importante posição também no governo de Bill Clinton: foi assessora especial do ex-presidente.

Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo ao “Poder e Política Entrevista”.

O programa é uma parceria do jornal Folha de São Paulo, do portal UOL e da Folha.com. A gravação é realizada no estúdio do Grupo Folha em Brasília.

A entrevistada deste programa é a subsecretária para assuntos políticos do Departamento de Estado dos Estados Unidos, Wendy Sherman.

Folha/UOL: Embaixadora, obrigado pela presença. Começo perguntando o que a traz ao Brasil desta vez?
Wendy Sherman
: Bem, vim ao Brasil... Só me tornei subsecretária para assuntos políticos [do Departamento de Estado] há alguns meses, mas logo ficou claro para mim que eu precisava visitar a América Latina, e que o Brasil era um dos países fundamentais, porque é um dos que crescem mais rápido e tem uma das relações mais expansivas e profundas com os Estados Unidos. O Brasil não é apenas um extraordinário parceiro comercial dos Estados Unidos como um país que vem se tornando líder regional e mundial; o relacionamento com o Brasil é muito importante para os Estados Unidos.

Folha/UOL: Vou me referir a um tópico que se provou quente no Brasil, nas últimas semanas, os direitos humanos. A presidente Dilma visitou Cuba e houve algumas menções à baía de Guantánamo. O que podemos esperar quanto à baía de Guantánamo? A senhora vê mudanças no futuro próximo, o fechamento da prisão que os Estados Unidos mantém lá?
Wendy Sherman
: Bem, o presidente Obama vem insistindo desde o começo de seu governo em que deseja fechar Guantánamo, e reduziu a população de prisioneiros. Creio que é importante que seus espectadores compreendam que o sistema de Guantánamo tem grande transparência. A Cruz Vermelha realiza visitas em base regular, os países cujos cidadãos estão detidos lá contam com acesso consular regular, e acreditamos que é realmente importante que mostremos que, mesmo que preferíssemos que a prisão já estivesse fechada, apesar de ainda não estar –gostaríamos muito que estivesse-, nós estamos respeitando todas as normas internacionais de direitos humanos. Gostaríamos que Cuba fizesse o mesmo, e que permitisse transparência, acesso consular e que, de fato, libertasse todos os prisioneiros políticos que tem encarcerados. Guantánamo abriga pessoas que cometeram crimes realmente atrozes contra a humanidade, em todo o mundo, e estamos adjudicando a situação o mais rápido possível.

Folha/UOL: Mas é possível alegar que algumas das pessoas detidas em Guantánamo não passaram por julgamento justo até o momento, não? O que podemos esperar quanto a isso?
Wendy Sherman
: Bem, as pessoas que estão em Guantánamo são, essencialmente, combatentes inimigos capturados durante a guerra contra o terrorismo, responsáveis por crimes incrivelmente atrozes contra a humanidade. E portanto, fazer comparações não é realmente correto para com as pessoas que podem estar detidas como prisioneiros políticos em Cuba.

Folha/UOL: A senhora certamente está informada sobre as declarações da presidente Dilma durante sua recente visita a Cuba. Ela foi questionada sobre a situação dos direitos humanos em Cuba e, em lugar de se referir à situação, preferiu responder falando sobre Guantánamo. A senhora tem alguma avaliação ou análise sobre essas declarações da presidente Dilma?
Wendy Sherman
: Bem, a história pessoal da presidente Dilma confere a ela uma compreensão profunda quanto aos direitos humanos, e a presidente Dilma, bem como o Brasil, está se tornando, já se tornou, uma voz internacional cada vez mais forte quanto aos direitos humanos. O Brasil trabalhou em estreita cooperação com os Estados Unidos, no Conselho de Direitos Humanos, para garantir que organizações multilaterais trabalhem pela presença universal de direitos humanos em todos os países do mundo. Portanto, creio que ninguém possa criticar as credenciais da presidente Dilma como defensora dos direitos humanos, como alguém que compreende por sua própria experiência de vida como eles são cruciais.

Folha/UOL: Está bem, avancemos para o tópico seguinte –os vistos requeridos para os brasileiros e norte-americano. O presidente Obama recentemente anunciou algumas mudanças nos procedimentos de concessão de vistos de turismo aos brasileiros que desejem visitar os Estados Unidos. Minha questão é: o que impede Brasil e Estados Unidos de abolirem mutuamente a necessidade de vistos de turismo?
Wendy Sherman
: Bem, antes de tudo eu gostaria de agradecer aos brasileiros pelo tremendo interesse em visitar os Estados Unidos. É um grupo grande e rapidamente crescente de pessoas que solicitam vistos de visita mas não imigração aos Estados Unidos. Sei que o embaixador Shannon e toda a equipe de nossa embaixada no Brasil estão trabalhando em jornada dupla, e estamos determinando se precisaremos abrir mais consulados, enviar mais pessoal de Washington e de outros locais no mundo para ajudar a processar vistos. É o que desejamos fazer, e já reduzimos o tempo de processamento de vistos. Como você mencionou, o presidente Obama recentemente anunciou algumas regras novas, para que as pessoas mais jovens e mais velhas não tenham de passar por entrevistas, e também para que pessoas que solicitaram vistos para um determinado período não precisem voltar a passar pelo processo de entrevista para renová-los. Todas essas coisas, creio, resultaram em grandes mudanças para os brasileiros. Quanto à sua questão específica, sobre nosso programa de dispensa de vistos, e o programa de dispensa de vistos do lado brasileiro, posso comentar apenas sobre os padrões norte-americanos. Temos –infelizmente para outros países do mundo, eu sei-, um sistema complicado. Um dos critérios é o de que o volume de recusa de vistos seja inferior a 3%. Não é esse o caso do Brasil, por enquanto. Sei que o Brasil está trabalhando com afinco, da mesma forma que nós, para reduzir as recusas para menos de 3%. Além disso, existe todo tipo de preocupação, de parte do Departamento de Segurança Interna e outras agências do governo norte-americano, que precisam aprovar antes que possamos avançar nesse sentido. Por isso, continuaremos a trabalhar arduamente, em companhia do Brasil, para um dia chegarmos a essa situação, mas enquanto todos nos esforçamos para esse fim, vamos fazer todo o possível para facilitar as visitas dos brasileiros, porque amamos recebê-los.

Folha/UOL: Há algumas disputas conhecidas entre o Brasil e os Estados Unidos no campo comercial. Dois exemplos são as exportações brasileiras de álcool combustível e suco de laranja. Será que esses temas serão discutidos quando os presidentes Obama e Dilma se reunirem em Washington, dentro de alguns meses?
Wendy Sherman
: Creio que quando os presidentes Obama e Dilma se reunirem em Washington, teremos uma das mais bem sucedidas visitas de chefes de Estado dos últimos tempos. A amplitude e a profundidade do relacionamento entre os Estados Unidos e o Brasil são extraordinárias. No momento temos mais de 20 diálogos em curso sobre os mais variados tópicos, de energia a desarmamento nuclear e liderança mundial, e, claro, nossas relações econômicas e comerciais. Assim, eu anteciparia que as discussões venham a ter base ampla, mas acima de tudo creio que esse encontro que acontecerá em breve entre nossos presidentes seja uma continuação do que aconteceu quando o presidente Obama visitou o Brasil, e isso significa não apenas grande número de acordos, como realizamos, mas uma definição mais precisa do nosso relacionamento cada vez forte, do que podemos fazer bilateralmente, do que podemos fazer juntos pela região e, francamente, quanto ao que podemos fazer pelo mundo.

Folha/UOL: Mas a senhora conseguiria apontar para um, dois ou três tópicos que encabeçarão a agenda da visita, ou acredita que isso não seja possível no momento?
Wendy Sherman
: Bem, creio que seja um pouco prematuro, mas penso que a visita envolverá as três dimensões que mencionei. Nosso relacionamento bilateral em crescimento, nosso comércio em crescimento, o desenvolvimento de interesse mútuo entre os dois países. Creio que a visita discutirá o que estamos fazendo juntos regionalmente para reforçar aquela que já é uma das grandes histórias mundiais de crescimento. Enquanto o restante do mundo enfrenta dificuldades econômicas, o Brasil e a América Latina continuam a ver crescimento e uma maior integração do continente, de maneira positiva para a estabilidade do mundo. Terceiro, creio que veremos discussões sobre como os Estados Unidos e Brasil podem trabalhar juntos, seja quanto ao Oriente Médio, a África, o Haiti ou outras questões, tanto quando o Brasil esteve presente no Conselho de Segurança e no Conselho de Direitos Humanos quanto em outras organizações multilaterais, como compartilhamos a liderança mundial, e como isso é importante.

Folha/UOL: Já faz algum tempo que o Brasil não interfere nas negociações com o Irã. Qual é, no momento, a avaliação do Departamento de Estado sobre a posição do Brasil e Turquia durante as negociações para conter o programa nuclear do Irã? Na época, recordo que o discurso oficial do Brasil era que estava agindo de acordo com o Departamento de Estado e os Estados Unidos, mas aparentemente essa não é a história completa. O que a senhora pode nos dizer, hoje, sobre aquele episódio?
Wendy Sherman
: O que acredito que seja importante agora é onde estamos e para onde estamos caminhando. E em minhas discussões com autoridades brasileiras, certamente falamos sobre o Irã. O assunto preocupa toda a comunidade internacional. O Irã se isolou da comunidade internacional, em sua recusa de tratar diretamente das preocupações que a comunidade internacional –incluindo, é claro, o Brasil e os Estados Unidos- tem sobre seu programa nuclear e suas intenções bélicas com ele. A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) realizou uma visita ao Irã nos últimos dias para tentar responder a essas perguntas. A ONU solicitou respostas a essas questões, por intermédio da agência e do Conselho de Segurança, em termos mais amplos, e os Estados Unidos são parte do que agora é conhecido como P5+1, ou seja, o grupo formado pelos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU e mais a União Europeia e a Alemanha; estamos dizendo ao Irã que estamos abertos a um diálogo mais amplo, estamos abertos a discussões e negociações sobre o programa nuclear, se os iranianos quiserem conversar. Até o momento, eles não parecem dispostos a fazê-lo. Portanto, enquanto isso, a comunidade mundial como um todo levou adiante suas sanções contra o Irã, porque desejamos que o Irã compreenda que precisa dialogar, porque a comunidade mundial está muito preocupada.

Folha/UOL: A senhora vê papel específico para o Brasil nessas negociações? Por exemplo, o Brasil poderia eventualmente abordar o Irã para oferecer sua intermediação, de novo, caso, como a senhora diz, o Irã quiser dialogar? A senhora vê papel específico para no Brasil nessas negociações?
Wendy Sherman
: Bem, creio que o Brasil é uma potência mundial importante, é um país que os Estados Unidos e o P5+1 consultarão, como evidentemente consultamos a Turquia; e creio que todos os países do mundo que se preocupam seriamente com o desarmamento nuclear e desejam garantir que não surjam armas nucleares adicionais no planeta deveriam ser parte de nossas consultas regulares, como são. Fico feliz por ter visitado o Brasil e discutido esse tópico entre os muitos assuntos que discutimos com as autoridades brasileiras.

Folha/UOL: Mas permita-me, uma vez mais, ser um pouco mais específico quanto a isso. A senhora acredita que seria desejável que o Brasil se oferecesse para tentar convencer o Irã a negociar, ou não é algo que seja interessante no momento?
Wendy Sherman
: Creio que qualquer país que tenha um relacionamento com o Irã deveria encorajá-lo a negociar com o P5+1, e garantir que as preocupações da comunidade internacional sejam resolvidas. E por isso recebemos positivamente o encorajamento de todos os países para que o Irã aja da forma certa, faça escolha certa e realmente ponha fim às preocupações da comunidade internacional.

Folha/UOL: A senhora discutiu esse tema com qualquer autoridade brasileira, durante sua atual visita ao Brasil?
Wendy Sherman
: Sim, como eu disse, me encontrei com autoridades brasileiras e conversamos sobre nosso relacionamento bilateral e as preocupações específicas de parte a parte. Discutimos os aspectos regionais de nosso relacionamento, dados todos os eventos regionais que estão por acontecer. A Conferência das Américas, a reunião do Grupo dos 20 (G20), a conferência Rio+20 que acontecerá aqui no Brasil. Portanto, conversamos sobre os eventos regionais e multilaterais que devem acontecer na região. Também falamos sobre nossa liderança mundial compartilhada, incluindo questões como o Irã, os acontecimentos mais amplos no Oriente Médio, o progresso que vem sendo obtido na África, e sobre outras questões em todo o mundo. As discussões foram bastante amplas, como é apropriado no caso de visita a uma grande potência.

Folha/UOL: Falando especificamente do Irã, qual foi a resposta das autoridades brasileiras quando da discussão desse tema?
Wendy Sherman
: Tivemos discussões muito úteis e construtivas sobre o Irã, durante minha visita.

Folha/UOL: Mas os brasileiros se ofereceram para fazer alguma coisa?

Wendy Sherman: Creio que quanto a aspectos específicos de conversações diplomáticas, é melhor que fiquem entre as partes. Mas posso certamente caracterizar as discussões como muito construtivas, muito úteis, e sempre aprecio os comentários de meus colegas brasileiros.

Folha/UOL: O Brasil optou por uma abordagem mais suave, em lugar de uma abordagem dura, por exemplo no caso da Líbia. A abordagem brasileira quanto a esse caso ajudou a resolver a situação na Líbia, em sua opinião?
Wendy Sherman
: Bem, creio que, no que tange à Líbia, e todas as transições no Oriente Médio e na África do Norte, o Brasil vem sendo um parceiro valioso, ao prover um modelo real do que acontece quando um país avança rumo à economia de mercado, uma economia de mercado democrática. O Brasil, ao longo de sua história, passou por muitas reviravoltas, e creio que isso diga às Líbias do mundo, e a outros países do Oriente Médio e da África do Norte, que, caso perseverem, se criarem instituições democráticas, os resultados podem ser tremendos e propiciar grande sucesso. Por isso acredito que o envolvimento brasileiro em todas essas questões é muito, muito importante, tanto como potência mundial quanto na condição de país que encontrou grande sucesso em sua História.

Folha/UOL: Mas a senhora acredita que o Brasil agiu de maneira apropriada, no momento da crise, ao adotar posição diferente da norte-americana quanto a Líbia?
Wendy Sherman
: Bem, creio que seja importante que o Brasil e os Estados Unidos respeitem ambos o princípio da responsabilidade de proteção, ou seja, de que a comunidade internacional tem alguma responsabilidade quando o contrato entre os cidadãos de um país e seu governo se desfaz, quando os cidadãos estão enfrentando conflitos reais e a possibilidade de perder a vida. A comunidade internacional tem uma responsabilidade a cumprir nesses momentos, e creio que isso tenha surgido da situação que enfrentamos com o genocídio de Ruanda; os países do mundo não desejam que algo parecido volte a acontecer. As diferenças que creio existir se referem às circunstâncias, critérios, para uma ação, e a comunidade mundial está realizando uma discussão muito construtiva quanto a isso. Cada caso é diferente. E a comunidade mundial evidentemente precisa reagir com rapidez. Acredito que essa espécie de discussão sobre como proceder e para onde nos encaminharmos nessas situações terríveis é excelente e muito importante porque, quando mais conversarmos, maior capacidade a comunidade internacional terá de tomar decisões rapidamente em momentos de dificuldade.

Folha/UOL: Existem alguns temores de que a crise internacional tenha influência negativa sobre a Conferência de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, a chamada Rio+20, que será realizada em junho no Rio de Janeiro. O que a senhora acredita possa ser feito para prevenir um fracasso, e como atrair ao Rio de Janeiro os líderes mundiais que precisam comparecer para dar peso à conferência?

Wendy Sherman: Bem, em minha opinião a conferência é importante em seu começo, meio e fim, ponto. E é importante porque trata do desenvolvimento sustentável. O mundo inteiro está tentando descobrir como garantir que as pessoas tenham empregos hoje e empregos no futuro, e que esses empregos tenham boa qualidade, tenham por base a energia renovável e o desenvolvimento sustentável, que construamos empregos para o futuro com a ajuda de tecnologia ecológica e garantamos que a energia seja eficiente e portanto sustentável. Para o futuro de nossos filhos, de nossos netos, e de seus filhos e netos. E por isso acredito que o fato de que o Brasil sedie a Rio +20 seja crucial, porque isso manterá o foco na importância do desenvolvimento sustentável, em um momento no qual o mundo vem tentando equilibrar muitas questões distintas.

Folha/UOL: Mas, evidentemente, se os líderes mundiais não comparecerem, isso de certa maneira diminuiria a importância política da conferência. A senhora acredita que o presidente Obama poderia considerar comparecer, ou por enquanto ainda não sabe?
Wendy Sherman
: Bem, não faço ideia. Não cuido da agenda do presidente, uma função muito desafiadora. Creio que deixarei ao pessoal da Casa Branca responder sobre isso, mas a agenda de qualquer presidente é sempre assunto complicado, e tenho certeza de que isso vale para a presidente Dilma quando sua equipe tenta decidir de que eventos ela deve participar, e facilitar sua participação naqueles a que ela gostaria de comparecer. Creio, no entanto, que eu instaria a todos que tenhamos por foco a substância, o conteúdo e o propósito da Rio+20. Creio que a conferência terá sucesso, e muitos líderes comparecerão, mas também acho que o importante é que a imprensa, a mídia, todos usem a ocasião como oportunidade para falar dos objetivos da Rio+20, em termos de desenvolvimento sustentável, criação de empregos, tecnologia, ciência.


Folha/UOL: O Supremo Tribunal, ou o equivalente britânico a isso, está a ponto de decidir sobre a extradição de Julian Assange para a Suécia. Caso ele seja extraditado à Suécia, a senhora acredita que os Estados Unidos possam buscar sua extradição para lá, onde poderia ser processado pelas suas atividades no chamado Cablegate?
Wendy Sherman
:Não quero discutir um processo específico de investigação ou extradição, a essa altura, e francamente creio que já tenhamos todos falado demais sobre Julian Assange. Creio que o que ele fez foi atroz e colocou em risco as vidas de muitas pessoas, e creio que uma das coisas importantes para todos, no futuro, é compreender que, sim, desejamos transparência na diplomacia, e acreditamos na liberdade de informação e acesso a ela, mas ao mesmo tempo precisamos exercer o nosso juízo crítico e garantir que as vidas das pessoas fiquem protegidas, no futuro.

Folha/UOL: A senhora acredita que a possibilidade de que ele venha a ser processado no futuro pelo governo dos Estados Unidos está descartada?
Wendy Sherman
: Essa decisão cabe ao Departamento da Justiça, e, como se diz, não é da minha alçada.

Folha/UOL: O governo dos Estados Unidos está preocupado com a crescente influência da China na América Latina, região sobre a qual os Estados Unidos vêm exercendo influência há décadas, agora que a China está crescendo tanto e se tornou parceiro comercial maior que os Estados Unidos, para muitos países da região?
Wendy Sherman
: Bem, creio que acima de tudo os Estados Unidos continuem sendo um parceiro vibrante em toda a região, e estamos certos de que o crescimento de nosso comércio continuará. Estamos bastante confortáveis com as ações da China no mundo, quanto a isso, porque acreditamos que o crescimento e integração da América Latina sejam favoráveis para a estabilidade da região e a estabilidade do planeta. Assim, somos todos parceiros comerciais da América Latina, porque o investimento lá favorece o crescimento e a estabilidade. Sabemos, evidentemente, que a China é um concorrente. Só queremos garantir que a concorrência aconteça de forma leal, e quando acreditarmos que não seja esse o caso, nos pronunciaremos. Conversaremos diretamente com a China a respeito. Xi Jinping, o atual vice-presidente da China e que deve assumir a presidência este ano, visitará Washington este mês. Estou certo de que as conversações com ele serão muito produtivas, e também estou segura de que os Estados Unidos tratarão das áreas em que veem deslealdade, e nas quais consideram que seja necessário mudar.

Folha/UOL: Quando a senhora fala sobre relações internacionais e diplomacia internacional, acredita que hoje o G20 tenha papel mais importante que o do Grupo dos 8 (G8), ou os vê como complementares? Como vê os papeis desses grupos, hoje? E sua importância?
Wendy Sherman
: Creio que o G20 seja muito importante. Quando encaramos juntos a crise econômica mundial de 2008, ficou claro que a arquitetura do século 20 já não era suficiente no século 21. O mundo já não é mais como era quando se dividia entre os Estados Unidos e a União Soviética e todos escolhiam seu lado. Agora, o mundo é muito mais complexo, com muitos protagonistas econômicos e muitas potências; os Estados Unidos continuam obviamente a desempenhar papel importante, há quem diga indispensável, no planeta. Mas ainda assim existem muitos outros agentes importantes. O G8 ainda representa as grandes nações industrializadas. Creio que mantém uma voz ainda importante, e acredito, francamente, que os mercados tanto desenvolvidos quanto em desenvolvimento ainda esperam que os grandes países industrializados exerçam responsabilidades especiais, e que ofereçam esforços especiais ao resto do mundo para tentar garantir a futura viabilidade econômica. Por isso, acredito que o G20 seja uma importante coleção de líderes. Ainda não se institucionalizou, claro, mas é uma organização nova, jovem, que em minha opinião ainda tem muito trabalho a fazer para tornar reais as aspirações delineadas na primeira reunião do grupo.

Folha/UOL: Quanto ao mesmo assunto, também se fala muito em reforma nas Nações Unidas, reforma no Conselho de Segurança. A senhora acredita que possamos esperar um passo adiante dos Estados Unidos no que tange a apoiar uma mudança no Conselho de Segurança da ONU? E a senhora evidentemente sabe que o Brasil sempre renova sua proposta de se tornar membro permanente do conselho. Podemos esperar alguma coisa nesse sentido como resultado da visita da presidente Dilma ao presidente Obama em Washington?
Wendy Sherman
: Bem, creio que o presidente Obama tenha falado disso quanto esteve no Brasil, ao repetir sua declaração de que o Conselho de Segurança deveria refletir uma arquitetura do século 21, e não a arquitetura do século 20.

Folha/UOL: A senhora acha que...
Wendy Sherman
: Permita-me concluir. Ele mencionou as aspirações do Brasil a um posto permanente no Conselho de Segurança e declarou que apreciava e estava ciente da liderança mundial exercida pelo Brasil, porque, se um país deseja ser membro permanente do Conselho de Segurança, precisa ser um líder mundial e aceitar a responsabilidade que essa liderança e autoridade acarretam. Ele na verdade endossou a realidade da liderança brasileira quanto a isso. No que tange à conferência de cúpula, seria prematuro da minha parte comentar quanto ao que presidente pode dizer ou decidir. Creio que o Brasil, e muitos outros interessados, estão se dedicando muito a descobrir um caminho para o avanço do Conselho de Segurança, e que os Estados Unidos acreditem que uma mudança é necessária.

Folha/UOL: O que a senhora crê que vá se concretizar no futuro quanto à reforma das Nações Unidas e do Conselho de Segurança? O assunto já está em discussão há duas décadas. O que a senhora vê como cronograma viável para que mudanças aconteçam?
Wendy Sherman
: Bem, seria pretensioso que eu tentasse opinar sobre um cronograma viável, quando tanta gente, como você diz, vem tentando promover mudanças há tanto tempo. Não sei qual poderia ser o cronograma. Mas creio que seja inevitável que o Conselho de Segurança mude. Os Estados Unidos desejam, claro, manter o processo de veto atual do P5, mas sempre declaramos abertamente que a composição do Conselho de Segurança deveria mudar, e sei que há diversos esforços em curso, alguns dos quais com a participação do Brasil, para promover essas mudanças. Mas estamos falando das Nações Unidas, que representam virtualmente o mundo inteiro, e por isso as coisas demoram um pouco.

Folha/UOL: Muito bem. Obrigado pela entrevista, embaixadora Sherman.
Wendy Sherman
: Muito obrigada.

(Tradução de Paulo Migliacci)