Leia a transcrição da entrevista de Aécio Neves ao UOL e à Folha
Aécio Neves, senador e pré-candidato do PSDB à Presidência da República, participou do Poder e Política, programa do UOL e da "Folha" conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 20.mai.2014 no estúdio do Grupo Folha em Brasília.
Aécio Neves - 20.mai.2014
Narração de abertura [EM OFF]: Aécio Neves da Cunha tem 54 anos. É economista formado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Aécio Neves deu seus primeiros passos na política aos 23 anos, como secretário particular do avô, Tancredo Neves, então governador de Minas Gerais.
Em 1986, Aécio Neves elegeu-se deputado federal, pelo PMDB. Filiou-se ao PSDB 3 anos depois.
Aécio Neves reelegeu-se 3 vezes consecutivas para a Câmara dos Deputados. Foi presidente da Câmara no biênio 2001 e 2002.
Após sua passagem pela Câmara, Aécio Neves foi governador de Minas Gerais por 2 mandatos, de 2003 a 2010. Em seguida, elegeu-se para o Senado.
Aécio Neves preside o PSDB desde 2013 e o pré-candidato do partido a presidente da República neste ano de 2014.
Folha/UOL: Olá, bem-vindo ao Poder e Política - Entrevista. Este programa é uma produção do jornal Folha de São Paulo e do portal UOL. A gravação é realizada no estúdio do Grupo Folha, em Brasília.
Esta edição do Poder e Política é com o senador pelo PSDB de Minas Gerais, Aécio Neves, pré-candidato do PSDB a presidente da República.
Folha/UOL: Olá, senador, tudo bem?
Aécio Neves: Tudo bem, é um prazer estar aqui novamente, Fernando.
Se eleito presidente da República, senador, qual deve ser a meta de inflação no Brasil ao longo dos seus quatro anos de mandato?
O primeiro movimento é buscarmos aquilo que nós buscávamos lá atrás, inclusive quando éramos governo, que é o centro da meta. O governo da própria presidente da República...
4,5%.
4,5%. Que a atual presidente da República sempre tratou com indiferença o centro da meta e focou no teto da meta. Dessa que forma que nós estamos vendo o Brasil caminhar ao longo de todos esses últimos anos. Portanto, foco no centro da meta e a diminuição gradual do espaço das bandas é o objetivo pelo qual nós trabalharemos. Eu acho que é um espaço...
Explique melhor em números. O centro da meta é 4,5%, se o mandato, se ganhar, tem quatro anos, ao longo de quatro anos, o centro da meta continua sendo 4,5%?
Continua sendo 4,5%.
Ao longo de quatro anos?
Ao longo de quatro anos, para que nós possamos a partir do alcance desse centro da meta ter uma política realista de diminuição da meta de inflação. É claro que, no horizonte de dois mandatos, é absolutamente razoável você imaginar que possamos ter uma inflação de país desenvolvido, em torno de 2,5%, 3%.
Mas isso é no horizonte de quantos anos, o sr. imagina?
Eu não vou vender terreno na lua, nem nessa e nem em nenhuma outra matéria. Seria fácil eu aqui, Fernando, fixar prazos e datas para determinadas questões que dependem de questões conjunturais.
Claro.
Não seria correto se nós fizéssemos isso. Centro da meta é o primeiro grande objetivo. Diminuição da banda, que de hoje é de dois para cima...
Dois para baixo.
Dois para baixo. Acho que é possível, ainda nesse mandato, nós reduzirmos isso para 1,5% até chegar no final do mandato em 1% de variável. Com isso, nós tornamos mais efetivas as medidas que vão nos levar ao centro da meta inflacionária. Esse é o objetivo final de um projeto de governo? Não. Mas o objetivo realista, hoje, é nos próximos dois, no máximo três anos, termos a inflação alcançando o centro da meta.
E talvez em um horizonte de quatro anos, em um mandato de quatro anos, reduzir a banda, que hoje é de dois pontos percentuais para mais e para menos para até um ponto.
Para até um ponto.
E aí em um projeto seguinte, para um outro mandato de quem quer que seja, daí o Brasil estando preparando para aí reduzir o centro da meta, é isso?
Exato. E aí eu acho que esse segundo momento, talvez, seja mais fácil e mais curto do que esse agora, porque você sabe que a inflação ela vive muito de perspectivas, de confiança. Se você tem um cenário de insegurança no futuro, de possibilidade de recrudescimento da inflação, isso o que, empurra a inflação para cima. No momento em que nós tivermos uma política fiscal absolutamente transparente, no momento em que ficar claro o respeito de regras para que os investimentos voltem ao Brasil. Tudo isso contribui no sentido da estabilidade e da diminuição gradual do centro da meta.
Se eleito, qual deve ser, no melhor do seu juízo, a trajetória ideal da taxa de juros ao longo de quatro anos no Brasil? Estou falando da taxa de juros básica, fixada pelo Banco Central, a Selic.
Sempre declinante, Fernando. Nós não podemos é achar que o voluntarismo e o individualismo de quem quer que seja diminuam taxa de juros. Nós assistimos a isso no Brasil. A diminuição da taxa de juros, ela é consequência, em grande parte, do ambiente adequado que você cria no Brasil para atração de investimentos, para a competitividade da nossa economia. O que eu quero é que nós possamos ter gradualmente a taxa de juros caminhando em sentido declinante e quando nós falarmos de mercado, nós temos que vencer essa época dos juros favorecidos, ou dos juros seletivos para setores da economia. O que eu quero, resumindo, para ser bem objetivo, é no futuro próximo, termos juros do BNDES para o conjunto da economia, mas eu acho que as medidas que nós tomaremos, acredito eu, de curto prazo, de reorganização, buscando equilíbrio fiscal, regularização do tripé macroeconômico, tudo isso apontará para a redução da taxa de juros.
Mas deixa eu fazer uma problematização. Se a inflação for declinante, caminhando para o centro da meta, a taxa de juros para ajudar a controlar a inflação não tem que ser mantida no nível atual, até mais alta, para forçar a queda?
Você tem um conjunto de medidas que podem ajudar para que a inflação seja focada no centro da meta e essas medidas passam, em grande parte, por aquilo que o governo não fez, investir em oferta. O que aconteceu no Brasil nesse último período, Fernando? O Brasil apostou, após 2009, no crescimento da economia via, basicamente, a consumo, através da oferta de crédito farto. Isso foi importante em um determinado momento, mas jamais poderia ter sido o único caminho escolhido. Faltou o quê? A oferta, faltou investimento, faltou a busca de um ambiente adequado para que nós pudéssemos, tanto internamente, estimular investimentos garantindo competitividade, respeito a contratos, quanto externamente, trazendo investimentos que deixaram de vir ao Brasil. Eu aposto muito na criação de um ambiente adequado a retomada do crescimento em bases sólidas e isso, certamente, no momento em que melhorarmos a oferta, tivermos uma recuperação do parque industrial brasileiro, eu acho que tudo isso contribui para que haja menos pressão inflacionária que nós estamos vivendo hoje.
Ou seja, o sr. enxerga como exequível um cenário no qual, tanto a inflação seja declinante, como as taxas de juros?
Eu acho que a médio prazo sim. Eu acho que nós precisamos sinalizar, repito, inflação é sobretudo sinalização. Eu acho absolutamente possível que nós possamos sinalizar de forma clara o mercado. Primeiro lugar, guerra ao custo Brasil. Essa é uma obsessão de um próximo governo nosso. Isso passa pelo início de um processo imediato de simplificação do sistema tributário, um grande choque de infraestrutura no Brasil, sem preconceitos com o setor privado, ao contrário, vamos atrair sim o setor privado, participar conosco, seja em concessões, seja em parcerias público-privadas, onde esse investimento seja necessário a garantir o aumento da competitividade de quem empreende no Brasil. Isso acontecendo, eu acho que nós criamos um ambiente favorável, inclusive para o declínio da taxa inflacionária.
O Banco Central deve ter a sua independência de atuação ampliada? Se sim, como?
Ele deverá ter a independência formal garantida.
Em lei?
No primeiro momento não acho necessário. Através de uma resolução presidencial que determinará que o Banco Central tem a missão, obviamente, de controlar a moeda, de controle da inflação...
Mas isso já tem, né?
... E de manter saudável o nosso sistema financeiro. Essas são as missões do Banco Central. Eu acredito que um governo com o perfil do nosso governo, que não é um governo intervencionista quanto o atual, isso seja, no primeiro momento, suficiente para garantir essa autonomia. Não me fecho a uma discussão, lá adiante, de uma eventual autonomia em lei. Não acho que isso seja necessário, porque é a autoridade presidencial que vai garantir que essa autonomia seja exercida permanentemente.
Se eleito, quais reformas econômicas seriam prioritárias no seu governo?
A primeira delas, Fernando, a reforma política. Ela é a base para qualquer outra. Eu sou um congressista, você sabe disso, estive já por 24 anos no parlamento, se somado meus quatro mandatos como parlamentar, como deputado federal e, agora esse período, como senador. Na verdade, de 20 [anos], 24 [anos] seria complemento do meu mandato. E aprendi algumas coisas: ou nós recuperamos a capacidade de negociação com partidos políticos, com forças que tenham expressão na sociedade, e por isso mesmo obrigação de prestar contas à sociedade, ou nós vamos estar cada vez mais distantes das reformas constitucionais. E não se faz, Fernando.
E quais itens da reforma política, porque ela é muito ampla. Fale dois ou três pontuais.
Vou falar três absolutamente claros, mas eu faço aqui uma introdução para dizer o seguinte: não se vota nenhuma reforma que exija maioria constitucional, portanto, nenhuma reforma constitucional no Brasil sem que o governo central seja o protagonista nessa reforma, seja o sujeito ativo dessa reforma. Você achar que entrega ao Congresso Nacional, pulverizado como está hoje com mais de 20 partidos lá funcionando, qualquer reforma que dependa de maioria constitucional, é você se enganar, se acreditar nisso, ou então enganar as pessoas. Portanto, a reforma política deve estar sendo discutida nos primeiros dias, nas primeiras semanas de governo. E três aspectos...
Quais são eles?
...Eu considero extremamente relevantes. Eu quero rediscutir a introdução, porque já discutimos lá atrás, da cláusula de desempenho. É algo complexo, polêmico, mas eu acho que é necessário. Você pode criar um partido político, ele pode ter seu funcionamento civil, mas ele para ter acesso a fundo partidário, para ter acesso ao tempo de televisão, ele tem que, no prazo que vai se estabelecer, que não precisa ser de uma eleição, como nós fizemos lá atrás, nós criamos um hiato de três eleições para que os partidos possam se estruturar, aqueles que tiverem condições de fazê-lo, portanto com percentual mínimo de votos. Quando nós aprovamos atrás eram 5%...
Em nove unidades da federação 2%, pelo menos.
Eram 3%. Acho até que nesse ponto isso possa ser calibrado para baixo, mas eu acho necessário para resguardar...
Quanto mais ou menos, o sr. tem em mente?
Se lá eram 5%, com 3% em pelo menos nove Estados, alguma coisa em torno de 3% no geral para 2% em pelo menos nove Estados, para que não haja um partido estadual, para que o partido tenha uma característica nacional. Me parece, até porque essas conversas já andaram, algo que poderá ter um apoio suficiente para sua aprovação. Repito, com hiato para que os partidos em uma ou duas eleições possam se preparar.
Primeiro ponto, cláusula de desempenho, segundo...
Porque aí você sabe a consequência disso, você vai começar a negociar com partidos políticos e não com setores, e quase com indivíduos como acontece...
Por esse cálculo aí ficariam de seis a sete partidos, aproximadamente com uma representação formal no Congresso?
De seis a sete, no máximo, de partidos. Isso. Seis meses atrás nós fechamos com sete partidos com esse cálculo. Algo absolutamente razoável em um país como o Brasil. Segundo, voto distrital misto com lista partidária. Metade do parlamento eleito por distritos, onde você cria uma relação direta do representado com o representante, poderá cobrar dele conhecimento sobre a realidade local, econômica, de infraestrutura, de educação, não importa, portanto aproxima o parlamento da realidade das várias regiões brasileiras e metade das vagas pelas listas partidárias, com dois objetivos: fortalecer os partidos políticos e permitir que nomes que não tenham base territorial, base geográfica, mas cuja presença no parlamento seja importante, representantes do segmento da cultura, economistas qualificados, grandes juristas, que possam estar no debate parlamentar criando um bom equilíbrio.
Esse é o segundo ponto. E o terceiro?
Cinco anos de mandato para todos os cargos sem reeleição. Eu acho que aí...
E coincidência de mandatos?
Coincidência de mandatos para todos os cargos. Um ano de eleição e quatro anos para trabalharmos pelo Brasil.
O sr. imagina que é possível aprovar essas três coisas de uma vez só, primeiro aprova uma e depois a outra, e depois a outra?
Não acho que as maiorias sejam as mesmas para aprovar cada um desses temas, mas eu acho que é possível, eu pretendo dizer isso, aliás já estou fazendo, durante da campanha eleitoral. Até porque isso me dará, se tiver possibilidade de vencer as eleições, Fernando, o capital político necessário, autoridade política necessária para dizer “olha, nós vencemos com essas propostas”. E eu acredito muito que um Congresso recém-eleito, portanto sintonizado com o sentimento da sociedade, e acho que nós teremos uma renovação importante nessas eleições, pode tender a caminhar na direção daquilo que foi aprovado pelos eleitores.
Senador, essas suas três propostas para reforma política, no Brasil, terão efeitos ao longo de tempo. Elas não terão efeito imediato. Como é que o sr. vai trabalhar durante os primeiros anos do seu mandato, se eleito, para aprovar reformar econômicas, porque mesmo que o sr. aprove uma reforma política o Congresso vai ficar igual.
Eu acredito muito, Fernando, e fiz isso em Minas Gerais, nas medidas tomadas no início de governo. Se eu tive êxito no meu governo em Minas Gerais, se avançamos em números indicadores, se saí do governo de Minas com alta aprovação, não é pelo que eu fiz nos primeiros seis meses, é pelo que nos primeiros dias de governo. Eu tenho dito que acabarei com metade desses ministérios que aí estão e criarei uma secretaria extraordinária para simplificação do sistema tributário. Eu não teria, hoje, não seria correto e nem teria condições de dizer “olha, vamos iniciar o governo diminuindo a carga tributária”. Com um governo perdulário como esse que está aí, que aumentou os gastos correntes muitas vezes mais do que a arrecadação, mais do que o próprio PIB, não seria correto dizer isso. A minha vantagem nessa eleição, Fernando, é que eu vou fazer uma eleição dizendo a verdade, dizendo as coisas nas quais acredito. Não é por mais que gostem mais uns e menos outros. Essa comissão, cujos trabalhos já começam, porque eu tenho recebido trabalhos, estudos de inúmeras entidades e de classe, inclusive, brasileiras, teriam prazo de no máximo 60 dias, não precisa chegar nele, mas no máximo 60 dias, para apresentar ao Congresso Nacional um projeto de simplificação do sistema tributário atacando fundamentalmente os impostos indiretos. Hoje, o conjunto das empresas brasileiras gasta mais de R$ 20 bilhões anualmente apenas para a máquina pagadora, para operacionalizar a máquina de pagamento. É isso que vai nos permitir, a médio prazo, um espaço fiscal para caminharmos na direção da diminuição da carga horizontalmente.
O sr. não chama de reforma tributária e fiscal, chama de simplificação, por que isso? Explica melhor.
Porque a reforma tributária será feita em dois momentos. O primeiro, realista, é a simplificação do sistema tributário. A simplificação que onera...
Tem um exemplo prático?
Claro, hoje você tem emaranhado de impostos indiretos que se sobrepõe, você tem brigas de ICMS, a questão ainda grave.
ICMS precisa ter acordo de todos os Estados, é difícil.
Mas vamos lá. Por isso que não foi feita até aqui.
Então, como faz?
Desde que haja um governo, acho que esse é objetivo, Fernando, mas vamos lá. Em um primeiro momento, a simplificação do sistema tributário, ficar mais fácil pagamento de impostos. Nós temos o mais complexo sistema hoje em funcionamento, acho que no mundo, um dos mais complexos. É isso que vai nós dar segurança para avançar naquilo que é essencial. Para que se quer uma reforma tributária? Para simplificar e para desonerar, para diminuir, obviamente, hoje a carga é de 36% a 37% de tributos na economia. Um governo que tem autoridade de garantir no tempo a implementação dessa reforma, com fundos que compensem efetivamente aqueles que tiverem perdas temporárias e circunstanciais é fundamental. Reforma tributária em final de governo ninguém jamais fará. Agora, eu tenho que acreditar que é possível sim fazê-la, por etapas, a primeira é simplificação do sistema e a segunda é interferirmos no processo horizontal de diminuição da carga e obviamente a questão do ICMS terá que ser enfrentada.
Quando começou a falar dessa tema, aqui nessa resposta, o sr. mencionou que diminuiria a metade o números dos atuais 39 ministérios, entre ministérios e secretarias com status de ministérios. Como é que o sr. vai fazer essa diminuição? No primeiro mês de governo já diminui?
Na largada, na largada. Eu tenho hoje, felizmente, ao meu lado e tenho várias áreas auxiliares e assessores extremamente qualificados, o governo Anastasia, que o sr. conhece, agora ex-governador de Minas Gerais, para mim é o mais qualificado gestor público, o mais atualizado gestor público do Brasil, porque além de ter estado no plano federal como secretário executivo do Ministério do Trabalho, do Ministério da Justiça, foi governador de Minas, está incumbido já dessa construção, de fazer esse primeiro desenho. Nós vamos colocar dentro da caixa muitas dessas ações que precisam continuar ocorrendo, são importantes que continuem ocorrendo, sem necessariamente trazer consigo uma estrutura de não sei quantos DAS, de dezenas, centenas de cargos comissionados.
Mas serão o que, 20 ministérios na largada?
Olha, existe um estudo da Universidade Cornell que fez uma avaliação em mais de 120 países, alguma coisa assim, e que dizia que os Estados, os governos que apresentam melhores resultados são aqueles que têm entre 21, 23 ministérios. Se isso serve como parâmetro, pelo menos é um estudo cientifico. Alguma coisa por aí. Não preciso fixar hoje, 21, 22, mas alguma coisa por aí. E algo que eu vou dizer aqui, que eu não disse ainda, talvez pela primeira vez, nós vamos transformar, talvez não, de público é a primeira vez que eu digo, que digo dessa forma, nós vamos transformar o Ministério da Justiça em Ministério da Justiça e da Segurança Pública. Em primeiro lugar com a proibição do contingenciamento dos fundos setoriais. Nós vamos fazer com que os recursos dos fundos penitenciários, do fundo nacional de segurança, tenham o mesmo tratamento, por exemplo, que os recursos da educação. Eles têm que ser transferidos por duodécimos para que os Estados possam planejar os seus investimentos. Nós vamos construir uma política nacional de segurança pública, que não existe hoje. Hoje, Fernando...
Em que consiste essa política nacional de segurança pública?
Vamos lá. 87%, essa é a primeira questão, de tudo que se gasta em segurança pública no Brasil hoje vem dos Estados e municípios. Apenas 13% da União. Portanto, a União, que tem responsabilidade de cuidar das nossas fronteiras, de proteger as nossas fronteiras e de coibir o tráfico de drogas e o tráfico de armas, é, hoje, quem menos gasta, quem menos tem, quem menos gasta. No conjunto dessa nossa proposta estará uma profunda e ágil reforma do Código Penal para diminuir a sensação de impunidade, que hoje existe na sociedade brasileira, e do Código de Processo Penal. Hoje, alguém para ser preso no Brasil, tem que fazer um esforço enorme se não for pobre. A verdade é essa. Alguém que tem um advogado ou tem condições de contratar um razoável advogado tem hoje possibilidades de chicanas que impedem que ele efetivamente cumpra a sua pena. Portanto, fazer o que governo não fez. O governo do PT não tem permitido o avanço de proposta de reforma do Código Penal e nem do Código de Processo Penal. E cito uma, que é complexa também e não é unânime: eu apoiarei a proposta do senador Aloysio Nunes [Ferreira, do PSDB de SP] que permite, é preciso que ela fique bastante claro, se solicitado pelo Ministério Público da criança e do adolescente, ligada a criança e ao adolescente, o juiz pode decretar em casos gravíssimos, ou em reincidências de casos graves, os Champinhas da vida, um jovem de acima de 16 anos que matou a namorada e expôs as fotos da na internet, como se fosse um grande feito, possam ser, se autorizado pelo juiz, solicitado pelo Ministério Público, ele possa responder pelo atual Código Penal. É um exemplo de um conjunto de medidas que nós pretendemos tomar e que aumente, obviamente gradualmente, a solidariedade do governo federal no enfrentamento dessa questão. Fronteiras. É preciso que haja também uma participação das Forças Armadas na construção desse plano nacional de segurança pública que o Brasil não tem hoje.
Já vou falar de maioridade penal também, mas deixa eu perguntar mais. O Ministério da Justiça continuaria sendo Ministério da Justiça, não haveria uma separação dessas funções de Secretaria Nacional de Segurança Pública?
Não.
Porque o que a gente vê é que no Ministério da Justiça, hoje, é um local que abriga questões indígenas, fundiárias, às vezes...
Eu acho que ele pode continuar...
Não vai sobrecarregar? Ele não é sobrecarregado?
Não, ao contrário. Falta a ele uma função clara e definitiva que é coordenar, Fernando, uma política nacional de segurança pública. Eu fui governador de Minas Gerais, eu sei quanto isso faz falta ao Brasil. Todas as ações que você buscava de solidariedade no governo federal, você buscava na Senad [Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas], em uma secretaria, geralmente com alguém que não tinha capacidade de decisão, não tinha poder decisório, então, essa medida que eu estou tomando de impedir, inclusive, esse é um projeto que eu apresentei em 2011 no Senado Federal e o PT ainda não deixou votar, impedindo o contingenciamento desses recursos. No período da presidente Dilma, o Fupen, Fundo Penitenciário, sabe quanto que foi executado? Em 11%. Esse não é um governo que prioriza a questão da segurança pública, porque esse jogo de você transferir responsabilidade para os Estados, empurrar para os Estados permanentemente a responsabilidade e aparecer na hora de uma crise para apontar o dedo, no governo do PSDB isso vai ser transformado em um gesto de absoluta solidariedade com o Brasil e independente do partido político de quem seja o governo.
Isso significa então que o Ministério da Justiça vai trocar de nome, para começar, é isso? “Ministério da Justiça e Segurança Pública”, é isso?
E segurança pública porque ele vai assumir responsabilidade de coordenar uma política de segurança pública, vai coordenar esse grupo de trabalho que já existe no Congresso Nacional, mas que não conseguiu avançar até aqui, que vai propor com o apoio do governo, essa é a grande novidade...
Segurança pública, não é senador, ela é muito responsabilidade das cidades e dos Estados, como é que... E as pessoas se sentem muito inseguras nos grandes centros. Como é que o governo federal poderá atuar, uma vez que isso não é atribuição direta dos Estados?
Fernando, mas você está dando voz para o que diz o PT. É o que o PT diz, sempre diz “isso não é problema nosso”, e nós estamos aí com essa epidemia do crack matando gente todos os dias, esfacelando famílias, a criminalidade crescendo. Claro que é, isso dentro de um país, dentro do Brasil, essa é que é visão equivocada, o que que condicionalmente é dos Estados? Financiamento, planejamento. Eu governei Minas por oito anos, eu fiquei oito anos esperando recursos do fundo penitenciário para construir penitenciárias em Minas e do Fundo Nacional de Segurança. Sabe quando eles vieram? Nunca. Por quê? Porque o governo federal virava as costas e achava que não era com ele. Ao contrário, nós vamos sentar com os Estados, nós sabemos que as realidades são diferentes em cada uma das regiões, mas de forma republicana e nos dispondo a fazer uma parceria. Vou lhe dizer o seguinte: nós temos aí, vamos dizer, R$ 500 milhões...
Acha que falta protagonismo, é isso, do governo federal, é isso?
Falta liderança, que o governo federal tem a responsabilidade de exercer. Em um momento que você tem, vamos dizer R$ 500 milhões aprovados em determinado orçamento para o Fundo Penitenciário, você tem que definir com os Estados, e você tem a visão macro, o governo federal, onde é prioritário, seja parcerias para penitenciárias locais, seja estaduais, ou para os complexos federais. Vamos estabelecer, por exemplo, o que nós fizemos em Minas, parceria com o setor privado, PPP no sistema prisional, por que nós não vamos estimular as boas experiências que ocorrem em outra unidade da federação para ocorrer no país como um todo? As APACs, um sistema que nós temos em Minas Gerais, extremamente exitoso, que os próprios presos de menor periculosidade cuidam do seu entorno, dos outros presos que estão naquele ambiente. Existem experiências hoje individuais –individuais que eu digo de Estados, algumas até municipais– que precisariam de uma coordenação nacional que não existe hoje. Hoje o governo federal é criminosamente omisso no que diz respeito à segurança pública e nós queremos um ambiente novo onde haja capacidade, Fernando, do governador saber a cada mês com quanto que ele vai contar do governo federal a partir de determinada estratégia montada, porque ele vai definir se ele vai investir em inteligência, se ele vai investir em armamento, se ele vai investir em aumento de contingente, em viaturas, em outras parcerias com os municípios. Não existe hoje. Esse recurso de segurança, ele fica até o final do ano contingenciado, os amigos do rei vão lá, ou da rainha, soltam alguma coisa e o resto vai para o superávit. Segurança pública será tratada como prioridade um de um governo que quer transformar o Brasil e é o que o nosso governo quer fazer e vai fazer.
Sobre maioridade penal. O sr. falou que é a favor desse projeto esposado pelo senador Aloysio Nunes, que é do seu partido, de São Paulo, sobre, em casos mais graves de adolescentes de 16 até 18 anos, que hoje, enfim, não podem ser tratados como adultos poderiam ser em casos específicos. Há quem é a favor, como o sr., e há também quem é contra, que argumenta o seguinte: “Olha, se fosse assim tão fácil a gente reduzia até para a partir de 10 anos de idade, não ia mais ter crime porque todos seriam punidos. Essa é uma ideia regressiva que não resolve os problemas”.
É um argumento que não precisa nem ser respondido por mim, né. Não vale o tempo que nós estamos aqui. O que eu estou falando é de algo extremamente sério. Estou falando de 2%, dos crimes violentos, reincidentes cometidos por adolescentes, 16 a 18 anos de idade. Isso vem crescendo ao longo do tempo. Deixar como está? Não acho adequado. Não estou acabando com a maioridade penal não. Ela existe e continuará existindo para 98% dos casos, mas existem casos extremamente graves hoje que precisam ser enfrentados com a gravidade devida. Eu tenho um projeto que se acoplou a esse do senador Aloysio que chega, Fernando, a triplicar a pena para os jovens de 16 a 18 anos utilizados para o cometimento de crimes. Quer dizer o seguinte: se uma quadrilha –eu falo triplicar a pena dos maiores de idade de uma quadrilha que levam o jovem a praticar do crime, vamos ser mais claro aqui– uma quadrilha que vai assaltar um banco, leva um jovem, há um assassinato, morre o guarda do banco, o menor assume o crime –isso é comprovado por pesquisas no país inteiro– o menor assume o crime mais grave porque é coagido a fazer isso e os outros pegam a pena menor. Qualquer quadrilha, qualquer bando onde estiver um jovem, quando condenado, o maior de idade terá a sua pena agravada dependendo do caso em até três vezes. Nós temos que reagir ao que está acontecendo hoje. Não podemos simplesmente fazer como o governo do PT vem fazendo, virar as costas do ponto de vista do financiamento, não se dispor a arbitrar essas questões. A epidemia do crack hoje é devastadora, nós temos hoje 300 mil pessoas, hoje, viciadas em crack espalhadas pelo Brasil inteiro. Não tem mais cidade grande, cidade média. Como vamos enfrentar isso? Como questão de saúde pública? Sim. Mas nós temos que enfrentar a outra ponta dessa corrente que é essa da estruturação de uma política nacional de segurança.
Deixa eu fazer um desvio, de novo, para a economia. A atual política de reajuste do salário mínimo, que tem dado reajustes acima da inflação para o salário mínimo, é a ideal para o Brasil e deve ser mantida?
O ganho real do salário mínimo será mantido. Essa é a política que nós temos aí. E para impedir que ela fosse mais um vez utilizada irresponsavelmente de forma eleitoreira, eu autorizei que o líder do meu partido na Câmara Federal, Antônio Imbassahy [PSDB-BA], assinasse uma proposta que prorroga para até 2019 essa política...
Essa fórmula.
Essa fórmula que está aí. Ganho real é uma conquista, e é uma conquista que não começa no governo do presidente Lula. Vou, talvez, vou-lhe fazer uma única pergunta: no governo do presidente Lula o ganho real do salário mínimo chegou a alguma coisa em torno de 54%, os oitos anos do presidente Lula. Sabe quanto foi no governo do presidente Fernando Henrique? 45,5%. Não é tão diferente assim, e em um momento em que nós debelávamos a hiperinflação e tínhamos um ambiente econômico muito menos favorável do que o que teve o presidente Lula, com crises sucessivas, enfim. O aumento do salário mínimo no governo da presidente Dilma não chega a 12%. Então querer trazer isso como uma conquista política e não como uma conquista dos trabalhadores é um grande equívoco. O aumento real do salário mínimo é uma conquista da classe trabalhadora e será mantida, só que no nosso governo, como nós vamos trabalhar efetivamente com tolerância zero em relação à inflação, esse ganho vai ser mais expressivo porque se ganha por um lado hoje e se perde com a inflação. Porque a inflação, Fernando, não é essa inflação que está aí, nós sabemos. Inflação de alimentos, há mais de quatro anos ela já ultrapassou os dois dígitos. Eu vi há pouco tempo uma análise nas regiões metropolitanas, de 14 capitais, a menor era 10%, região metropolitana de Salvador, e chegava a 17%. E alimentos, para quem ganha até três salários mínimos, corresponde a 30% da sua renda, da sua receita.
Sobre salário mínimo, é raro encontrar alguém que diga que vai parar com a política de reajuste real do salário mínimo. Agora, tem uma dúvida grande na cabeça das pessoas que acompanham a economia, que vem a ser o vínculo do salário mínimo com outros reajustes que ocorrem na economia, sobretudo no caso da Previdência. Como resolver isso?
Olha, é um desafio. Nós temos hoje uma caixa preta no Brasil, Fernando, uma caixa preta na previdência. Você se lembra, você acompanha muito de perto a economia, no começo do ano o ministro da Previdência disse que o déficit da Previdência era de R$ 50 bilhões. O ministro da Fazenda chamou atenção, que era de R$ 40 [bilhões] e demitiram o funcionário, o técnico que tinha apontado esse outro número. Não dá para você hoje entrar em detalhes, não pelo menos responsavelmente, estabelecer números ou medidas pontuais sem conhecer efetivamente a herança que nós vamos receber desse governo. Não há nada mais inconfiável hoje no Brasil do que dados desse governo, Fernando.
Mas a vinculação do reajuste do salário mínimo, que hoje existe, com as contribuições, os benefícios da Previdência é um fato real. Sem saber o rombo total. Isso é um fato. Isso deve ser mantido essa veiculação?
Não está no nosso norte, não está na nossa bússola hoje mexer nisso. Até porque nós temos...
Mas aí fica sustentável?
Fernando, eu espero que sim. Eu não vou aqui avançar em detalhes de, enfim, de políticas que nós vamos tomar sem conhecer efetivamente os números do governo. Seria uma irresponsabilidade da minha parte, até porque o rombo pode ser até maior do que se imagina. Superávit primário, 1,9% superávit anunciado, alcançado no ano passado. Eu tenho muita dúvida se isso aconteceu efetivamente. Metade disso, desse 1,9% foi [leilão do Campo de] Libra, R$ 15 bilhões, Refis, R$ 20 bilhões, 0,3% desse 1,9 bilhões, então já estamos passando para mais da metade, foram os pagamentos que o governo deixou de fazer no ano passado, passou para esse ano, inclusive transferências de saúde para Estados e municípios atrasando inclusive o dinheiro para hospitais e tudo mais. Então, esse foi o superávit que nos entregaram. Isso não é um superávit corrente. Nós não vamos ter por essas mesmas fontes, você concorda comigo, como alcançar o superávit proposto esse ano. Então o grande desafio é nós conhecermos efetivamente qual é o déficit real da Previdência, do ponto de vista fiscal, quais são efetivamente as fontes de receita que vão nos permitir alcançar o superávit desse ano, o efeito das desonerações, o que isso abalou efetivamente o caixa do Tesouro. Hoje você tem o Tesouro devendo ao BNDES. Você sabe disso. Uma fábula, chegou a ser R$ 17 bilhões atrás, fala-se em R$ 400 bilhões, como é que isso vai ser ajustado? Então hoje há uma caixa preta que precisa ser aberta, enquanto ela não estiver, você vai concordar comigo, ela não for aberta eu tenho que ter uma cautela enorme para falar das medidas que nós vamos eventualmente tomar.
Ainda sobre a reestruturação da organização do governo e da redução do número de ministérios. Quando a gente olha o número de ministérios, os suspeitos usuais para serem cortados são alguns muito simpáticos a alguns grupos da sociedade: Secretaria da Pesca, Secretaria da Igualdade Racial, dos Direitos Humanos, das Mulheres. São secretarias com status de ministério. Posso entender que esses são os mais prováveis a serem cortados?
Fernando, me desculpe aqui dizer o seguinte: de gestão pública eu entendo, e Minas sabe que eu entendo. O que é importante é que tenhamos políticas públicas para inúmeros setores da sociedade que se sintam contemplados pelas políticas públicas, e não necessariamente pelo status ministerial dado a alguém. Os ministérios hoje, a grande verdade é essa, Fernando, não servem à população brasileira. O ministério não serve as pessoas ligadas à pesca, às pessoas que se preocupam com infraestrutura, às pessoas vinculadas às causas das minorias. Eles servem a pessoas individualmente. Os ministérios hoje servem para que o governo construa uma base política, ganha aí alguns segundos de televisão para tentar vencer as eleições. No momento em que nós invertemos essa lógica, e eu se vencer as eleições inverterei essa lógica, os ministérios, seja ministério, secretarias, virão para funcionar, terão metas para serem alcançadas. Eu fiz isso em Minas, Fernando. Em Minas 100% dos servidores têm meta para serem alcançadas. Eu acho que todos esses setores que eventualmente, ou outros, e aqui não tomei nenhuma decisão ainda porque esse estudo, inclusive, ainda não está pronto, deixarem de ter um cargo de ministro para orientar essas políticas, terão políticas muito mais eficazes, políticas com transparência, com metas a serem alcançadas e que atenderam aos interesses da população. Os ministérios atendem a partidos, hoje. Nós queremos, no futuro, que os ministérios atendam à população.
A convenção do seu partido PSDB nacional está marcada para o dia 14 de junho, de acordo com a lei tem que ser do dia 10 ao dia 30 de junho, quando o sr., ao que tudo indica, será indicado candidato a presidente pelo PSDB. Seus principais adversários hoje já têm nomeados, pré-nomeados, os seus candidatos a vice-presidente. A sua expectativa é que no dia 14 de junho o seu partido e o sr. estejam prontos para fazer a chapa completa ou isso não é um problema porque tem mais tempo até o dia 30?
É. Você coloca corretamente, Fernando. Eu poderia até o dia 30 estar definindo isso, mas pretendo definir até o dia 14. O que me deixa feliz, em primeiro lugar, é ter o PSDB completamente unido nessa caminhada, como jamais na sua história tem estado, um conjunto de forças políticas crescentes que se aproxima de nós, nomes extremamente qualificados que surgem até por geração espontânea alguns deles...
A quem o sr. está se referindo?
Temos muitos. Todos esses nomes que você falou que são válidos, que estão sendo apontados, são nomes extremamente qualificados. Se eu citar um eu vou excluir outro. Tem cinco ou seis nomes que recorrentemente citados extremamente qualificados e que poderiam honrar qualquer governo e qualquer trajetória eleitoral. Essa não será uma decisão individual do candidato, é uma decisão desse conjunto de forças que está no nosso entorno e será feito sem traumas. Eu acredito muito nas coisas naturais da política, Fernando, são essas que dão resultado. Então o que me preocuparia se eu não tivesse hoje alternativas. Como eu tenho várias alternativas, é como o Felipão na Seleção, está cheio de alternativas, ruim é quando você não tem nenhum time para escalar. Temos vários e tenho certeza que aquele que for o indicado, ou aquela que for a indicada terá o apoio, o entusiasmo daqueles que querem mudar o Brasil. A minha candidatura, Fernando, não é a candidatura do PSDB apenas, é a candidatura de um segmento de pensamento na sociedade brasileira que está percebendo o mal que esse governo vem fazendo ao país e a necessidade urgente de rompermos com tudo isso que está aí e iniciarmos um novo e virtuoso ciclo no Brasil. Isso é positivo para nós, para as futuras gerações de brasileiros e é isso que me motiva estar aqui hoje e é isso que me motiva estar nessa disputa.
O ex-governador de São Paulo, seu colega de partido, José Serra vem sendo citado, vinha sendo, como um possível colega seu como candidato a vice-presidente. No domingo, publicou uma nota, em um perfil em uma rede social, dizendo que não, não quer ser candidato, nunca pleiteou ser candidato a vice-presidente. Existe a possibilidade ainda de José Serra vir a ser o seu candidato a vice-presidente?
Fernando, eu agradeço até essa pergunta porque você me dá oportunidade de registrar aqui mais um gesto de grandeza de José Serra. José Serra é um dos mais preparados e qualificados homens públicos do Brasil. Quem não gostaria de ter Serra no seu palanque, não gostaria de ter Serra na formulação de um programa de governo e mesmo na execução desse programa de governo? Eu quero muito tê-lo e tenho certeza que ele estará, essa questão não surgiu por uma motivação ou por uma iniciativa dele. Se o nome dele acabou sendo colocado, eu recebi isso com muita honra pela imprensa, e ele fez um gesto para dizer simplesmente o seguinte –é assim que eu entendi, inclusive fez isso publicamente em Cotia [SP], na última sexta-feira, quando estivemos juntos em um grande evento partidário– contem comigo, eu estou aí Aécio para estar ao seu lado para encerrarmos esse ciclo e mudarmos o Brasil, qualquer que seja a posição. Ele disse isso com absoluta clareza e eu recebo esse gesto como um gesto de grandeza política de um grande homem público.
Mas o sr. acha que ele poderia ser o seu candidato a vice-presidente?
Olha, é uma possibilidade colocada. Eu nunca conversei com ele pessoalmente sobre essa possibilidade. Ele acena com a possibilidade de disputar uma cadeira na Câmara ou no Senado. Onde ele estiver, seja vice, seja na Câmara e no Senado, para a tristeza dos nossos adversários ele estará ao nosso lado, e estaremos juntos para ganhar a eleição e para governar, porque não vejo um futuro governo nosso sem a presença importante e decisiva de José Serra.
O sr. ligou para ele ou falou com ele depois que ele publicou a nota no domingo, a respeito desse tema?
Até meus telefonemas privados, meus telefonemas privados você quer saber [risos]. Eu converso muito mais com o Serra do que você imagina. A nossa relação...
Mas ligou?
A nossa relação tem um ponto de convergência: o interesse público, o interesse do país. Isso é muito mais relevante do que qualquer visão diferente do que essa ou aquela. Eu tenho conversado com ele e...
Mas depois de domingo não falou?
No reino tucanato reina a tranquilidade e a paz absoluta.
Mas falou com ele depois de domingo?
Eu tenho falado sempre com ele, Fernando.
Seria desejado que o seu vice-presidente na campanha, candidato, fosse do Estado de São Paulo?
Falo aqui mais uma vez com absoluta franqueza, aliás como tenho falado sempre. É uma possibilidade, existe uma corrente política no nosso entorno que advoga a tese de que São Paulo, pelo contingente eleitoral, pela importância política, seria decisivo nessa campanha. Admito essa como uma alternativa, nós temos alternativa que inclui as outras forças partidárias que já se manifestaram em torno do nosso nome. O Solidariedade apresentou o nome do presidente da Força, o nome do presidente do Democratas sempre é lembrado, que é um grande líder, um grande senador, meu parceiro nessa construção desde o início, o senador Agripino [Maia]. Então eu terei muita serenidade para ouvir o conjunto dessas forças e em um momento que tomarmos a decisão, repito, não há ninguém, a decisão é de todos, não há ninguém impondo, esse é o fato positivo e novo, não há ninguém que condicione o apoio por indicação dessa ou daquela figura para o cargo de vice-presidente da República.
Nesta semana, o sr. foi questionado pelo fato de, em Minas Gerais, estar junto em um evento da sua pré campanha, em Minas Gerais, o ex-senador Eduardo Azeredo. Isso o incomoda?
Não, de forma alguma. Eu conheço Eduardo há muitos anos. Talvez você o conheça. O Eduardo é um homem de bem. Ele está tendo a oportunidade de se defender. Não vamos ocupar aqui o papel da Justiça. Vamos deixar que ele se defenda. Fizemos um ato, em Minas Gerais, com mais de quatro mil lideranças de todo o Estados, apenas liderança importantes, há um sentimento em Minas contrário ao sentimento que nós colhemos no Brasil. Minas quer o avanço das conquistas que nós trouxemos ao longo desses 12 anos e eu tenho a absoluta convicção que mais uma vez vamos vencer as eleições em Minas Gerais e temos que ter, pelo menos, o respeito de deixar que o ex-deputado Eduardo possa se defender na Justiça. Só que, isso é importante ficar claro, eu não agirei como agiram ou agem a liderança do PT. Se alguém amanhã for condenado pela Justiça, se cometer alguma ilicitude, não estou dizendo que ele cometeu, não conheço a fundo o processo, ele não sera transformado em herói nacional pelo meu partido. Pelo contrário, cumprirá eventualmente a pena se for condenado, mas há hoje no seu entorno, enfim, as pessoas que estão mais próximas ao Eduardo, uma enorme expectativa pela sua absolvição.
E ele deve participar ativamente da sua campanha, pelo menos no Estado de Minas Gerais?
Fernando, da forma que ele quiser. Eu acho que todos...
Ele é bem-vindo?
Olha, ele é. Ele é um homem de bom. Agora, com a forma como participar como, enfim, eu acho que a forma de participar o Pimenta [da Veiga] que vai dar, que é candidato a governador em Minas Gerais, é a nossa aliança. A nossa aliança em Minas, Fernando, é bom deixar isso muito claro, é uma aliança de homens de bem, de pessoas que têm uma história de vida pública respeitada. Olha o governador Anastasia, o próprio Pimenta, enfim, há um conjunto de forças políticas hoje que nos apoiam em Minas Gerais porque, ao longo dos últimos 12 anos, nós fizemos com que Minas tivesse a melhor educação do Brasil, a melhor saúde da região Sudeste, o mais inovador programa de parcerias com o setor privado em execução no Brasil, e eu, depois de oito anos de mandato, posso olhar para trás e ver esse reconhecimento da população de Minas Gerais. Esse é o fato concreto. Nós vamos de novo trabalhar e, eu acredito, vencer as eleições em Minas.
O sr. mencionou Minas Gerais, havia um pré-acordo entre o sr. e o seu, agora, adversário na disputa pelo Planato, Eduardo Campos do PSB. O PSB, em tese, poderia apoiar o candidato do PSDB ao governo de Minas Gerais. Há indicações claras de que isso não vai mais ocorrer. Por que isso aconteceu e isso significa uma mudança de relacionamento entre o sr. e Eduardo Campos?
Da minha parte, não. Eu tenho visto algumas notícias na imprensa, mas para mim vale o entendimento, até hoje pelo menos, os compromissos que nós fizemos, e na verdade, essa aliança do PSB com o PSDB em Minas Gerais, há uma leitura um pouco equivocada de setores da imprensa de que é um troca-troca com Pernambuco, enfim, não, e seria se o PSB viesse agora nos apoiar em Minas Gerais por uma determina troca. O PSB participa do meu governo em Minas Gerais desde a minha primeira eleição e participa de forma importante porque tem quadros muito qualificados. A secretária de Educação que faz um extraordinário trabalho em Minas Gerais, Ana Lúcia Gazzola, é do PSB. O secretário que cuida da Copa, da área de esportes é do PSB. Então é uma coisa natural. O que não seria natural é uma ruptura a partir de um interesse eleitoral, aí eu não sei como seria recebido pela sociedade.
Alguns colegas seus têm dito que há um certo sinal de traição do PSB, em Minas Gerais, o sr. vê assim?
Eu não vi nenhuma movimentação concreta da direção do partido ainda. Terem postulantes discutindo o quadro local é muito natural. As últimas conversas que tive com Eduardo, o sentimento que eu colhi dele, até me disse isso o governador Anastasia há poucos dias que esteve com ele em Belo Horizontes, colheu dele um sentimento de que esse era o caminho natural. Até porque uma ruptura nisso penalizaria fundamentalmente o próprio partido que teria dificuldades, inclusive, de eleger parlamentares. Da minha parte não mudou nada. Fernando, eu estou me dispondo a conduzir algumas forças políticas hoje para enfrentar o governo que está aí porque eu acredito que isso é bom para o Brasil. Vou fazer isso no limite das minhas forças, com todo o meu vigor, e não vou me distrair ao longo do caminho e não vou cair na armadilha do PT e sobretudo essa armadilha de querer dividir as oposições. Esse é um esforço permanente que faz o governo. O foco hoje, o que me move, o que me faz estar andando pelo Brasil, reunindo as figuras mais talentosas, as cabeças mais qualificadas, é podermos construir um projeto alternativo a esse que está aí. E os meus compromissos eu vou honra-los todos.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deve aparecer nos seus comerciais de televisão ao longo da campanha?
Sim, como já apareceu. Ele próprio vai definir a forma como quer participar. Olha, é um privilégio para o Brasil ter hoje, Fernando, um quadro da qualidade do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso discutindo o Brasil. Quando eu vejo a postura do ex-presidente Fernando Henrique com as declarações de um outro ex-presidente da República aí nós vemos quão tamanha é a diferença de postura, de compromisso para com o Brasil. O presidente Fernando Henrique disse algo curioso recebendo uma homenagem em Nova Déli, onde foi?
Acho que foi em Israel.
Foi isso. Foi em Tel Aviv.
Isso.
Nova Déli foi de uma outra viagem, se eu não me engano. Tel Aviv, Israel, e ele dizia que nessa propaganda em que o PT quis vender o medo e a desesperança a sociedade brasileira, que mostra uma falência e um fracasso absoluto de um governo que depois de 12 anos não tem mais esperança, não tem mais legado sequer para apresentar ao país, ele disse algo muito curioso, e eu acho correto, que o PT se esqueceu de dizer que o passado é ele, porque esses últimos 12 anos quem governou o Brasil foi o PT. Não dá mais para terceirizar responsabilidades. E aí eu acho que PT cometeu seu primeiro equívoco grave nessa caminhada. Ninguém vota olhando para trás. As pessoas querem saber de futuro, quem vai melhorar a sua vida, quem vai dar mais segurança as suas famílias, quem vai criar maiores condições de empregabilidade aos seus filhos e o PT ao focar a sua campanha no passado, onde ele próprio é o protagonista, ele abre espaço para que nós sejamos o que somos, nós somos a esperança, nós somos o futuro, nós somos a mudança de verdade que o Brasil precisa viver.
Mas, senador, na comparação dos dois ex-presidentes mais recentes, Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, e Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, pesquisas depois de pesquisas sempre continuam a mostrar que o ex-presidente Lula tem um poder eleitoral sempre muito mais muito superior ao do ex-presidente Fernando Henrique, que, ao contrário, às vezes, até prejudica quando colocado ao lado de algum candidato do ponto de vista eleitoral.
Não questiono isso, é óbvio que isso existe, sobretudo em setores da sociedade que foram beneficiados pelos programas...
Grandes setores porque são...
Pelos programas de transferência de renda que foram iniciados no governo do presidente Fernando Henrique. Será que se o presidente Fernando Henrique fizesse dos programas sociais uma bandeira eleitoral permanente, se apropriasse partidariamente deles como fez o PT, isso seria diferente? Não sei. Eu sempre tive uma relação republicana com o presidente Lula. Nunca prejudicou Minas Gerais, faço aqui esse registro. Durante o nosso governo, porque fomos governantes juntos. Tenho respeito por ele, agora, eu não troco a companhia do presidente Fernando Henrique pela de ninguém hoje do ponto de vista do aconselhamento, sabe, da visão estratégica de país, de uma visão de mundo muito mais adequada, Fernando, sabe? Muito mais contemporânea em relação ao que precisa viver ao Brasil quando o presidente Lula que, infelizmente, o que eu percebo é o seguinte: ele, nesses últimos meses, tirou a bandeira do Brasil da lapela e botou a bandeira do PT. É uma opção, tem que ser respeita, mas eu acho que um ex-presidente da República deveria ter um pouco mais de cuidado com determinadas afirmações ou até o seu nível de envolvimento em disputa eleitoral.
Estou tendo que voar aqui, pedir para o sr. concisão nas respostas se possível. Programas sociais. Quais programas sociais o PSDB, no caso de o sr. ser eleito, seriam mantidos e quais seriam modificados ou eliminados?
Para deixar aqui de forma muito clara, como constatado, eu apresentei há algum tempo um projeto que transforma o Bolsa Família em programa de Estado. O Bolsa Família é a unificação do Bolsa Escola e do Bolsa Alimentação que vieram do PSDB. Hoje, o governo do PT prefere que ele seja um programa coordenado por uma secretaria, dentro de um ministério para poder a toda véspera de eleição praticar o terrorismo usual de que ele vai extinto. Por exemplo, tem um programa que constitucionaliza o Bolsa Família a partir do momento que eu incluo na LOAS [Lei Orgânica da Assistência Social], e a Constituição é a que regula a lei orgânica da assistência social para dizer que ele é permanente, ele será aprimorado, ele será qualificado ao longo do tempo, mas não pode mais ser instrumento de moeda eleitoral. Hoje mesmo assistimos a algo deplorável. Fiquei sabendo no final de semana. Infelizmente, até um senador da República da base governista, na falta de coisa melhor para dizer, faz uma declaração e foi acionado judicialmente para dizer “olha, o candidato fulano de tal –no caso eu– vai acabar com o Bolsa Família”. Coisa mais primária da política pequena, da política dos grotões, da política atrasada que o Brasil não merece mais viver, mas é o retrato de que essa é uma estratégia de campanha deles. O Bolsa Família será continuado, será aprimorado, até porque para nós ele é um ponto de partida, para o PT ele é só um ponto de chegada. Essa é a apenas a diferença que nós temos de visão.
O programa Mais Médicos será mantido?
O programa Mais Médicos é um programa, vamos chamar, circunstancial, temporal. Nós temos que enfrentar a questão da saúde de forma mais orgânica, de forma mais ampla. Isso passa, obviamente. E você sabe que nesses três últimos anos apenas o governo do PT permitiu que 13 mil leitos hospitalares fossem extintos, fechados no Brasil, apenas para contrabalancear um pouco esse discurso do Mais Médicos. O que eu defendo é mais saúde, nós defendemos progressivamente o aumento da participação do governo federal no financiamento da saúde, que diminuiu em 10% praticamente no período do governo do PT...
Quanto que o governo deve investir do Orçamento em São Paulo?
...Era 54% quando eles assumiram o governo. Hoje é alguma coisa em torno de 45%. A proposta...
Em relação a quê? Ao que tudo se investe no país?
Ao conjunto dos investimentos em saúde pública no Brasil, 54% era da União em 2002, hoje é 45%. A nossa proposta é que possa chegar a 10%.
Do Orçamento?
Do Orçamento. Como você tem os municípios hoje... Empregam pelo menos 15% [do Orçamento]. Você não encontra ninguém empregando menos de 25% [do Orçamento], mas a lei determina 15% [do Orçamento] dos municípios, 12% [do Orçamento] dos Estados. Nós programamos 10% [do Orçamento da União], mesmo que gradualmente, ao longo dos próximos anos.
Não é muito 10% do Orçamento para engessar com um item apenas?
Não, desde que o dinheiro seja aplicado com eficiência. Uma grande questão, Fernando, é que...
Mas com eficiência não dá para dar conta com o dinheiro atual?
Não, eu acho que gestão é muito importante. Não é só saúde. Mas eu acho que precisa ser... Não se justifica essa diminuição da participação da União porque qual que é a contrapartida dela, Fernando? São os municípios, principalmente, compensando esses 9%. Estrangulados. Nós temos municípios hoje, talvez 30%, talvez até 40%, 40% no meu Estado, de municípios que são hoje operadores de folha de pagamento. Então você dá um alívio fiscal, dá um alívio para os municípios, em contrapartida ao incremento dos investimentos da União, é algo razoável, equilibrado. Isso era feito sempre com uma discussão ampla, com transparência. Gestão dos recursos da saúde é absolutamente essencial. Mas eu volto ao Mais Médicos, para não perder a sua pergunta. O Mais Médicos continuará, mas nós não faremos a discriminação que hoje o governo federal faz em relação aos médicos cubanos. Na nossa avaliação, eles têm os mesmos direitos e têm que ter a mesma remuneração do que recebe os médicos de outras partes do mundo.
O sr. alteraria essa parte do convênio?
Isso. Certamente. Até porque não se justifica o Brasil se submeter a uma legislação de uma entidade internacional, latino-americana, que por sua vez segue a legislação cubana. Não tem sentido, isso mostra a fragilização do Brasil. Mas não é só isso. O que nós temos que nos preocupar é em criar mais vagas nas escolas de medicina espalhadas pelo Brasil. Elas vieram diminuindo ao longo desse ano, e o governo do PT não percebeu que elas vinham diminuindo. Eu acho que é importante que nós discutamos uma carreira para os médicos, uma carreira federal acho que seria importante para permitir que eles alcancem esses grotões. E nós estamos com um grupo extremamente qualificado de pessoas discutindo a segunda etapa do programa Mais Médicos. Mais Médicos não é a solução para o problema da saúde brasileira.
Se eleito, como o sr. pretende trabalhar o sistema de nomeação dos diretores das agências reguladoras?
Meritocracia, e ponto. Em Minas Gerais eu fiz isso. Para você ocupar um cargo, Fernando, na área administrativa ou financeira...
Nenhum deputado ou senador vai poder indicar diretor de agência?
Não vai passar nem perto. E nem ministro, e nem diretor de nada. Essa não é a lógica que funciona. Nós temos que inverter isso de forma definitiva, essa lógica perversa onde os espaços públicos são feudos de grupos partidários, de grupos dentro dos próprios partidos.
Ou grupos econômicos também, né?
Também, o que é mais grave. Ou tão grave. E grupos dentro dos próprios partidos políticos. Eu criei uma regra, que alguns outros... São Paulo inclusive depois, felizmente, a seguiu, de forma muito positiva. Para você ocupar um cargo na área financeira ou administrativa, na administração direta do Estado, você tem que passar por uma certificação feita por um órgão externo ao Estado. No nosso caso, a Universidade Federal de Minas Gerais. Todos os nomes indicados para as agências terão que passar por essa qualificação. Por essa avaliação, para estarem disponíveis. Nós vamos substituir, Fernando –e acredite nisso, você vai comprovar lá na frente–, esse aparelhamento absurdo da máquina pública, pela meritocracia. É gente qualificada, que tem essa satisfação a dar à sociedade e à sua própria história de vida. E não a um padrinho, e não a partidos políticos. O que o governo do PT fez com as agências reguladoras foi um crime. Elas geraram um balcão de negócios, muitas vezes negócios escusos, e instrumento para composição de base parlamentar. Isso não vai acontecer no nosso governo.
Zona Franca de Manaus. Até quando deve existir a Zona Franca de Manaus? Quantos anos?
Eu acho que ela é definitiva, esse projeto de extensão por 30 anos é algo hoje consensual, Fernando. Eu estive na Zona Franca recentemente. Ela já faz parte da paisagem econômica e social daquela região. O que nós temos é que ir além, transformá-la numa grande plataforma de exportação. Ela pode dar um grande salto, sobretudo em relação aos nossos vizinhos. Mas ela está consolidada, ela é uma realidade, e essa realidade não pode ser alterada.
O economista francês Thomas Piketty, que está sendo muito falado ultimamente, escreveu um livro chamado “O Capital no século 21”, no qual ele argumenta que só o aumento do tamanho das economias, do PIB, não resolve a desigualdade na sociedade. E ele propõe fórmulas para dividir a riqueza. Uma delas é a criação de um imposto sobre a herança e uma coordenação até mundial para isso. O que o sr. acha dessa proposta?
Ela é instigante. Porque ela permite, em determinado momento, que haja usufruto daquele patrimônio, mas num momento em que você, enfim, morre, aquele patrimônio passa a ser um patrimônio, ou parte dele, possa ser um patrimônio coletivo. É um bom tema para discussão. Obviamente ainda não me detive sobre ele. Esse tema já existia lá atrás, Fernando, quando se falava...
E um imposto sobre grandes fortunas...
Imposto sobre grandes fortunas. Que vinha mais ou menos na mesma lógica. Taí. É um tema que eu estou aberto a discutir.
Mas o sr. não tem posição, a favor ou contra?
Não tenho, até porque essa proposta é algo absolutamente novo, incipiente. Mas é uma discussão que vai vir. Eu estou aberto, Fernando, para todas as discussões. Agora, acredite numa coisa, eu vou assumir os compromissos que eu tiver convencimento, num primeiro momento, e condições efetivas de cumprir. Mas eu acho que essa é uma boa discussão para os economistas, para a sociedade. É uma discussão inclusive para a classe política fazer.
O sr. é a favor ou contra a manter as atuais regras e a legislação a respeito da prática do aborto?
As regras atuais, já respondi isso mais de uma vez. Não acho...
Se o Congresso decidir flexibilizar as regras atuais e dar mais o direito à mulher de decidir, o sr., como presidente da República, se eleito, seria contra?
Essa é uma decisão do Congresso Nacional. Na minha concepção, já respondi isso mais de uma vez, as regras atuais são adequadas e elas suprem as nossas necessidades no momento.
No Brasil, a Justiça já decidiu que é legal o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Casamento gay. O que o sr. acha de casais gays terem o direito consolidado de adotar e educar uma criança?
Olha, Fernando, eu me dediquei muito no Congresso a esse tema da adoção. E é hoje arrepiante, constrangedor, você ver o cadastro nacional de adoção, você tem hoje cerca de 30 mil famílias cadastradas para adoção e apenas 5 mil crianças –esse número é recente–, 5.200 crianças em condições de adoção. Mais de 80% dessas crianças são acima de 7 anos de idade, onde já não há um interesse nessa adoção. Portanto, tudo que envolver afeto e condições adequadas e, obviamente, assistentes sociais, profissionais do setor, vão fazer essa avaliação, eu não me oporia. O que eu defendo é uma facilitação do processo de adoção no Brasil, inclusive no que diz respeito ao poder pátrio, que é o que engessa, impede que as crianças sejam colocadas mais cedo para adoção. O último dado que eu tive, 84% dessas famílias que querem adotar, querem adotar crianças até 3 anos de idade, no máximo. E mais da metade até um ano de idade. Meninas, brancas. Então, enfrentar essa questão da adoção com maior agilidade, permitindo que as crianças que efetivamente não tenham condições de ser criadas nos seus lares, eu acho que é algo que mereceria uma atenção especial nossa. E essa é uma questão...
Casais homoafetivos, o sr. acha que poderiam adotar?
Se houver, por parte dos profissionais da área, avaliação de que há condições adequadas desses casais criarem criança, talvez ela fique ali melhor do que nos abrigos em nos albergues hoje.
Financiamento público de campanha. O Supremo já decidiu, por maioria, mas ainda não terminou de julgar. Que deve ser banido do país. Financiamento público não, financiamento privado, de empresas privadas. O sr. tem posição sobre isso?
Acho que o fim do financiamento privado teria que ter uma relação com o fortalecimento dos partidos. Era importante que nós avançássemos pelo menos na lista partidária, ou pelo menos uma parcela dos parlamentares eleitos pela lista partidária. Porque isso significa o quê? Que nós vamos estar fortalecendo o financiamento público. E não pode ser individualizado. E nós temos que tomar cuidado para a contrapartida disso não ser o recrudescimento do caixa 2. Eu acho que essa discussão tem que caminhar de forma conjunta. Acho que não valerá, segundo estou informado, para essas eleições. Mas é uma discussão que nós temos que nos aprofundar sem viés ideológico, sem buscar saber quem é o esperto da vez, o beneficiário imediato dessa modificação. Eu acho, por exemplo, que limitar o financiamento privado seria extremamente adequado, mas eu acho extremamente curioso que o partido político mais financiado hoje pelo setor privado, pelas elites brasileiras, como foi o PT, num ano não eleitoral... O PT, num ano não eleitoral, que foi no ano passado, recebeu mais que nós recebemos no ano eleitoral anterior. Cerca de R$ 80 milhões. Seja aquele que promova hoje o financiamento público. Acho que uma coisa tem que vir casada com outra. Financiamento público puro, sem que haja pelo menos uma parcela eleita por lista partidária, eu temo que vá haver um descontrole na distribuição desses recursos. E, obviamente, descontrole nunca é bom em questões dessa ordem.
O Brasil deve regulamentar a prática da eutanásia?
É uma discussão que eu não sou especialista para, talvez, ter uma decisão aqui. Mas eu te diria que eu sou e sempre fui a favor da vida. Da dignidade. Nós temos que tratar é da dignidade das crianças ao nascer, da dignidade das pessoas para viver, e também da dignidade para morrer. Mas eu não me colocaria a favor, isso é uma questão que envolve uma questão religiosa, de crenças, mas é uma discussão que a sociedade vai enfrentar. Eu nunca me detive sobre ela. E quero me deter, até porque essa tem sido a minha história de vida, em dar dignidade às pessoas para nascer e para viver.
Vizinho do Brasil, o Uruguai legalizou a produção e o consumo de maconha, que é proibida no Brasil. O Brasil deve olhar essa experiência e eventualmente segui-la?
Deve olhar essa experiência, como outras, em outras partes do mundo, mas não acredito que segui-la.
Por quê?
Eu não gostaria de ver o Brasil como cobaia de uma experiência que não se sabe qual é o resultado. Já me manifestei sobre essa questão mais de uma vez. Não acho que essa seja uma agenda para o Brasil. Não sou a favor, para ficar claro, da descriminalização.
O sr. sabe que um quarto da população carcerária no Brasil, que é mais de meio milhão [de pessoas], é por conta de algum tráfico de drogas. Pequenas quantidades, às vezes. E vão para a prisão. É bom isso?
Não, claro que não é bom, por isso eu estou propondo uma inflexão profunda na reforma do Código Penal, do Código de Processo Penal, onde nós possamos dar vigor, agravar as penas dos traficantes, é esses que nós temos que buscar. E, obviamente, compreender que esse tipo de pequeno delito pode ter punição e deve ter, sim, mas punições paliativas, trabalhos comunitários. Nós não falamos sobre sistema prisional, que é hoje uma tragédia no Brasil, mas é preciso dizer que o Brasil não tem só Pedrinhas, como nós assistimos. Tem sistemas prisionais, como o de Minas Gerais, feitos com parcerias com o setor privado, absolutamente adequados, e é um modelo que eu gostaria de levar para o Brasil.
O sr. tem 54 anos, em outra época da vida já consumiu algum tipo de droga considerada ilícita no Brasil?
Já respondi isso mais de uma vez, quando tinha 18 anos experimentei maconha e ficou por aí. E não recomendo que ninguém faça.
O sr. é convicto quando diz a respeito de o Brasil não adotar alguma flexibilização para drogas leves? Acha que isso não poderia ajudar a diminuir a população carcerária e dar um tratamento mais correto para essas pessoas?
Quando eu falo na discussão de um novo Código Penal, essa questão tem que estar inserida. E vamos discuti-la. Agora, eu não tomaria nenhuma medida que viesse na direção oposta, do estímulo ao consumo de drogas.
Senador Aécio Neves, muito obrigado por sua entrevista.
Eu que agradeço.
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