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Comissão da Verdade: militante foi morto em hospital do Exército no Rio

De acordo com o médico-legista Nelson Massini, Amaro torturado e morto dentro do Hospital Central do Exército - Hanrrikson de Andrade/UOL
De acordo com o médico-legista Nelson Massini, Amaro torturado e morto dentro do Hospital Central do Exército Imagem: Hanrrikson de Andrade/UOL

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

11/08/2014 11h01Atualizada em 11/08/2014 17h21

A Comissão da Verdade do Rio de Janeiro informou nesta segunda-feira (11) ter constatado a tortura e morte do preso político Raul Amaro Nin Ferreira durante o regime militar. Segundo relatório feito por familiares da vítima, em parceria com o projeto Armazém Memória, Amaro foi espancado em três oportunidades, das quais duas dentro do HCE (Hospital Central do Exército), onde morreu. Esse é o primeiro caso que se tem notícia de tortura ocorrida nas dependências do hospital.

A última delas ocorreu no dia 11 de agosto de 1971, quando a vítima chegou a pedir a um enfermeiro, de acordo com o relatório, que a retirasse "desse horror". "Esse relato não é de alguém que está sendo tratado em um hospital", afirmou o sobrinho da vítima, Felipe Nin, um dos responsáveis pela investigação dos fatos. As lesões que provocaram a morte de Amaro foram "oriundas de um processo de sofrimento físico", de acordo com laudo do médico-legista Nelson Massini, que já atuou em casos emblemáticos como a chacina da Candelária, o massacre do Carandiru e a morte de Chico Mendes.

Amaro era engenheiro mecânico e militava contra o regime militar na década de 70, quando foi capturado em uma blitz no bairro das Laranjeiras, na zona sul do Rio de Janeiro, no dia 1º de agosto de 1971. As primeiras agressões ocorreram nas dependências do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna). Na época, o Exército argumentou que as lesões eram decorrentes de uma briga seguida de resistência à prisão.

No entanto, relato do soldado Marco Aurélio Magalhães, que presenciou a primeira sessão de tortura, indica que Amaro foi brutalmente espancado a golpes de coturno. No dia 4 de agosto, o militante foi levado para o Hospital Central do Exército, já com várias lesões graves, de acordo com o relatório.

Análise técnica do médico-legista Nelson Massini indicam que, entre os dias 6 e 7, Amaro foi novamente espancado durante interrogatório dentro do HCE. A última sessão de tortura ocorreria no dia 11 de agosto, também dentro do hospital. A morte oficial de Amaro foi comunicada oficialmente aos familiares no dia 12 de agosto.

"Médicos omitiram a real condição de morte do Raul. Acho que cabe neste caso um pedido de perdão dos conselhos de medicina à família. Este caso comprova e dá início à investigação de possíveis novos casos", afirmou o médico-legista.

"Nós temos certeza que essa vítima foi torturada e morta dentro de uma instalação do Exército. Não iríamos realizar essa audiência se qualquer dúvida pairasse sobre isso", afirmou a presidente da CEV-Rio, Nadine Borges.

O sobrinho de Raul Amaro, Felipe Nin Ferreira, divulgou uma nota da família em que pede que o Conselho Federal de Medicina acompanhe a reconstrução dos fatos. "Como uma instituição médica poderia permitir e tolerar que atentados à vida de paciente pudessem ocorrer em suas dependências? A família se sente chocada com a contradição entre o que já é público sobre o caso Raul Amaro e as versões oficiais de que a instituição militar desconhece torturas ocorridas em pessoas mantidas presas sob sua responsabilidade durante a ditadura militar e manifesta a expectativa de algum procedimento das autoridades sobre o caso", escreveram os parentes do engenheiro e preso político.