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Governo recorre ao STF para tentar barrar impeachment; Fachin será relator

"História não perdoa violência contra democracias", diz Cardozo

UOL Notícias

Do UOL, em São Paulo e em Brasília

14/04/2016 12h03Atualizada em 14/04/2016 14h57

A AGU (Advocacia-Geral da União) entrou nesta quinta-feira (14) com um recurso no STF (Supremo Tribunal Federal) para anular o processo de impeachment contra Dilma Rousseff alegando que a defesa da presidente foi cerceada. O recurso é um mandado de segurança sob o número 34.130 e será relatado pelo ministro Edson Fachin.

Segundo o texto, “diversos atos praticados pela Câmara dos Deputados revelaram frontais agressões às garantias devidas aos acusados em qualquer âmbito de apuração, causando concretos e inaceitáveis prejuízos à participação e defesa do impetrante”.

A peça assinada pelo advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo, afirma que o processo ultrapassou os dois pontos da denúncia aceitos pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que foram os decretos de créditos suplementares e a operação com o Banco do Brasil no plano Safra, conhecida como pedalada fiscal.

Em entrevista a jornalistas para falar do mandado, Cardozo disse que a citação de outros fatos no relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO) na comissão especial do impeachment, como a Operação Lava Jato, “feriu de morte o processo e a defesa da presidente Dilma”.

Segundo o advogado, a inclusão de outros fatos também desrespeita o regimento da Câmara. Para que a comissão especial do impeachment pudesse tratar de outros fatos, disse Cardozo, seria preciso que algum parlamentar recorresse contra a decisão de Cunha de aceitar somente dois pontos da denúncia. No entanto, não houve recurso. A comissão especial criada pela Câmara para analisar o impeachment emitiu parecer favorável ao impedimento.

Nesta ação, a AGU trata somente do que considera inválido na tramitação do processo, e não do mérito das acusações contra a presidente. Cardozo diz ainda que é possível a AGU ingressar com outras ações posteriormente.

"Eu não estou pedindo a anulação do processo desde o início", disse o ministro. Segundo ele, o que a ação pede é a anulação dos procedimentos a partir da junção da delação do senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS).

Governo quer urgência no STF

Sobre o relator do processo, Cardozo elogiou Fachin, mas disse que a decisão deve ser examinada pelo plenário do Supremo com urgência.

"O ministro Fachin é correto e um jurista. Eu tenho o ministro Fachin em altíssima conta", disse.

"Não cabe ao Supremo analisar o mérito. Isso não quer dizer que os pressupostos jurídicos, como a justa causa para o impeachment, como também os requisitos formais do processo, têm que ser controlados pelo Supremo."

Cardozo elogia Fachin, mas diz que decisão deve ser do plenário

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Cardozo disse ainda que o governo respeitou a tramitação do processo na Câmara e por isso só entrou com o recurso agora. 

"Eu poderia ter, por exemplo, impetrado antes o mandado de segurança, antes mesmo da decisão do relatório. Não me pareceu correto que o fizesse. Eu queria oferecer à Câmara o processo, e dar à Câmara a possibilidade de corrigir os problemas do processo."

Cardozo reclamou do fato de Cunha não ter acatado seu pedido para falar ao plenário no domingo, dia da votação, e reforça que a ação não tem "nada a ver" com a avaliação política. "Fiz um pedido para que pudesse falar na sessão [da Câmara], justamente para colocar aos parlamentares os vícios." 

Tópicos

O mandado de segurança é dividido em nove tópicos.
1. Do caso dos autos;
2. Da competência desse Supremo Tribunal Federal para assegurar o transcurso regular do rito da apuração de suposto crime de responsabilidade, em respeito às normas constitucionais aplicáveis;
3. Do cabimento de mandado de segurança. O pedido cita “cristalinas e multiplicadas” causas que anulem o procedimento adotado, “todas passíveis de serem comprovadas por meio de documentação que acompanha esta petição inicial”. Segundo o texto, “o papel da Câmara não é semelhante ao de um tribunal de pronúncia, mas de implementação de uma condição de procedibilidade da apuração que se pretende fazer”. O pedido afirma ser “lamentável” que as garantias legais da presidente Dilma em um processo de impeachment não se efetivaram “no plano prático”. “Os atos ora impugnados constituem uma sucessão de violações à Constituição Federal”.;

4. Da inexistência de prevenção na distribuição da presente ação. O texto afirma que não há qualquer outra ação no STF capaz de “gerar prevenção de qualquer de seus ministros”. Ou seja: é a primeira ação apresentada para tentar debater os temas apresentados até aqui;
5. Da inexistência de mero ato interna corporis da Câmara dos Deputados. Da sindicabilidade dos atos que desbordam da Constituição Federal e da lei. Da ausência de ofensa à separação de poderes;
6. Dos parâmetros que devem ser adotados pela Comissão Especial. Da decisão desse Supremo Tribunal da ADPF nº 378. Do rito da lei 1079/50. Da aplicação do Código de Processo Penal. O texto lembra que o processo de impeachment “constitui exercício atípico de função judicial por parte do Poder Legislativo”. Assim, defende a invocação de “garantias inerentes ao processo judicial, sob pena de deturpação da própria função atípica conferida àquele Poder”;
7. Dos fatos ocorridos na Câmara dos Deputados que eivam de vícios o procedimento adotado nos autos da DCR nº 01/2015.  O fato é dividido em cinco questões: “da ilegal ampliação do objeto das imputações feitas contra a Presidenta da República”, cobrando que Eduardo Cunha receba alguns dos argumentos recusados na denúncia; “da ilegal juntada de documento estranho ao objeto do procedimento de apuração de crime de responsabilidade”, alegando que a anexação da íntegra da delação premiada do senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS) constituiu prática ilegal de Cunha; “da ilegalidade decorrente do pronunciamento dos subscritores da denúncia, perante a Comissão Especial, sobre conteúdos estranhos ao processo”, referindo-se à manifestação sobre conteúdo integral da denúncia apresentada por subscritores da mesma; “da ilegalidade assumida pelo parecer da Comissão Especial ao formular imputações e considerações desconectadas da denúncia”, citando “diversas imputações e considerações de cunho persuasivo, desconectadas do teor da denúncia” no processo; e “da ilegalidade em razão da negativa de efetiva participação dos defensores da Presidenta da República”;
8. Da necessidade de concessão de medida liminar. Da necessidade de apreciação plenária do pedido. Segundo o texto, existe “evidente risco de dano imediato aos direitos da acusada, ao interesse público e, em última instância, à própria democracia brasileira, pois as arbitrariedades cometidas no âmbito da Comissão Especial podem conduzir ao mais gravoso ato que poderia acorrer a uma República Presidencialista, que é o eventual afastamento de seu Presidente”.

O documento cobra uma postura dentro das leis no julgamento do caso. “Não se pode admitir (...) que atos marcados por um sem número de ilegalidades produzam seus resultados sem qualquer impugnação”, cobra.
9. Dos pedidos

Novos pedidos

Além do objeto principal do mandado de segurança, no 9º tópico do texto, o governo faz uma série de pedidos caso a ação principal não seja aceita.
- pede a nulidade do parecer pró-impeachment aprovado na comissão especial da Câmara;
- pede a elaboração de um novo parecer na comissão;
- pede que sejam desentranhados dos autos os documentos relativos a colaborações premiadas de qualquer pessoa;
- pede a nulidade da realização da sessão de oitiva dos denunciantes em 30 de março de 2016
- pede que seja reaberto o prazo de 10 (dez) sessões para que se possa fazer a apresentação da defesa

Defesa não vê "tapetão"

Na quarta-feira, o próprio ministro da AGU, José Eduardo Cardozo, já havia admitido a possibilidade de recorrer ao STF. Entretanto, afirmou que a manobra estava dentro da lei e não configurava “tapetão”.

“O dia em que o Judiciário for entendido como um tapetão, nós rasgamos de vez o Estado de Direito no Brasil. A Constituição é clara: nenhuma lesão de direito pode ficar afastada de apreciação do Poder Judiciário. Se um cidadão comum, se qualquer pessoa ou um presidente da República tem uma lesão, vamos ao Judiciário. Isso sinceramente não é tapetão”, disse Cardozo.

O processo de votação na Câmara começa esta sexta-feira (15), com discursos dos parlamentares sobre o processo, e será votado no plenário da Câmara neste domingo. É necessário o voto de 342 dos 513 deputados.

Se aprovado na Câmara, o processo segue ao Senado, onde é preciso o voto de 42 dos 81 senadores para que o processo seja aberto. Apenas se os senadores aceitarem o processo de impeachment a presidente é afastada do cargo, temporariamente, por 180 dias, ou até a conclusão do julgamento no Senado.