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Ministro do STF reforça prevalência do negociado sobre o legislado em causa trabalhista

O ministro Teori Zavascki - Alan Marques - 22.jun.2016/ Folhapress
O ministro Teori Zavascki Imagem: Alan Marques - 22.jun.2016/ Folhapress

Por Bárbara Pombo e Guilherme Pimenta

Do Jota, em Brasília e São Paulo

14/09/2016 17h49

Em meio a propostas de reforma trabalhista ventiladas pelo governo Michel Temer, o ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que um acordo coletivo firmado entre sindicato e empresa prevaleça sobre uma regra da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Na decisão publicada nesta terça-feira (13/9), o ministro do Supremo reformou acordão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que havia derrubado acordo coletivo por entender que os termos acordados iriam contra regras previstas na legislação trabalhista. Para a Corte do trabalho, a supressão da verba “atenta” contra os preceitos constitucionais de garantia às condições mínimas de proteção ao trabalho.

Leia a decisão

O caso

No caso concreto, a Usina Central Olho D’agua S/A e os Sindicato de Trabalhadores Rurais de seis municípios negociaram a supressão dos pagamentos de horas in itinere, que são pagas pela empresa quando não existe transporte público regular no trajeto entre a casa do empregado e o local do trabalho. Em substituição ao pagamento da verba, empresa e sindicato negociaram que os cortadores de cana receberiam cesta básica durante a entressafra, seguro de vida e acidentes além do obrigatório e sem custo para o empregado, pagamento do abono anual aos trabalhadores com ganho mensal superior a dois salários-mínimos, pagamento do salário-família além do limite legal, fornecimento de repositor energético e adoção de tabela progressiva de produção além da prevista na Convenção Coletiva.

“Os trabalhadores são transportados por vans, mas o cálculo das horas in itinere era dificultado porque são vários empregados – alguns moram há 20 minutos do serviço, outros há quatro horas. Por isso, a empresa e o sindicato acordaram substituir a verba por outras vantagens”, afirma o advogado da empresa, Mauricio de Figueiredo Corrêa da Veiga. A usina é situada em Pernambuco, quase na divisa com o Estado de Piauí.

As horas in itinere tem natureza salarial, e são consideradas uma espécie de hora extra. A verba está prevista no artigo 58, § 2o da CLT, segundo o qual “o tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução”.

Segundo advogados e especialistas em direito do trabalho, o TST nunca admitiu supressão integral das horas in itinere. A Corte, afirmam, autorizava apenas a negociação sobre 50% da verba – a outra metade deveria ficar intocada.

“A decisão do Supremo traz um paradigma bastante distinto em relação ao que o TST vinha decidindo”, afirma Ricardo Calcini, assessor no Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo.

“O STF reconheceu que as verbas podem ser transacionadas. Quem vai avaliar se a compensação com outras vantagens é pertinente é o sindicato. Por isso, os trabalhadores devem devem ter maturidade e discernimento para escolherem bem seus representantes”, afirma Corrêa da Veiga.

Autonomia

A decisão do ministro Teori é baseada no julgamento da repercussão geral RE 590.415, julgado em maio de 2015. Na ocasião, a Corte fixou a tese de que “a transação extrajudicial que importa rescisão do contrato de trabalho, em razão de adesão voluntária do empregado a plano de dispensa incentivada, enseja quitação ampla e irrestrita de todas as parcelas objeto do contrato de emprego, caso essa condição tenha constado expressamente do acordo coletivo que aprovou o plano, bem como dos demais”.

Para o ministro, a decisão do TST no caso vai na contramão da decisão do Supremo que, segundo ele, “conferiu especial relevância ao princípio da autonomia da vontade no âmbito do direito coletivo do trabalho”.

Segundo Teori, o STF reconheceu que a Constituição prestigiou a autonomia coletiva da vontade como forma de o trabalhador contribuir para a formulação das normas que regerão a sua própria vida, inclusive no trabalho (artigo 7o, inciso XXVI, CF). Fixou ainda que o trabalhador não está em condição de hipossuficiente quando representado pelo sindicato.

“Ainda que o acordo coletivo de trabalho tenha afastado direito assegurado aos trabalhadores pela CLT, concedeu- lhe outras vantagens com vistas a compensar essa supressão. Ademais, a validade da votação da Assembleia Geral que deliberou pela celebração do acordo coletivo de trabalho não foi rechaçada nesta demanda, razão pela qual se deve presumir legítima a manifestação de vontade proferida pela entidade sindical”, afirmou o ministro, na decisão.

Anamatra

Ao JOTA, o presidente da Associação Nacional dos Juízes do Trabalho (Anamatra), Germano Siqueira, afirmou que vê com “preocupação muito grande” decisões em que o negociado prevalece sobre o legislado.

“Com todo respeito ao ministro do STF, mas o negociado só pode valer sobre o legislado quando for para avançar, e não regredir direitos”, criticou.

Ele disse que, por ser uma decisão monocrática, a Justiça do Trabalho ainda não é obrigada a seguir a jurisprudência do Supremo. “Ao menos que o caso seja decidido em repercussão geral, após o trânsito em julgado, e virar súmula vinculante”, explicou Germano.

O magistrado declarou que no atual momento, em que uma reforma trabalhista é discutida e deve ser enviada pelo governo Temer ao Congresso Nacional em dezembro, é de “extrema importância” que o Supremo decida questões trabalhistas, como previsto na pauta desta semana.