Campanha de Temer pagou quase R$ 2 milhões a gráfica de cliente de ministro
O comitê da campanha de Michel Temer (PMDB) à Vice-presidência da República em 2014 pagou quase R$ 2 milhões a uma gráfica cujo proprietário é cliente do escritório de advocacia do ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha. Na época, Padilha era deputado federal e integrava a coordenação nacional do PMDB na eleição presidencial.
A Noschang Artes Gráficas tem sede em Tramandaí, no litoral do Rio Grande do Sul, cidade onde Padilha foi prefeito entre 1989 e 1992. O proprietário da empresa é Paulo Noschang.
Reportagem publicada pelo UOL em outubro mostrou que Noschang é cliente do escritório de advocacia da mulher do ministro, Simone Camargo. Eliseu Padilha também é sócio do escritório. Empresas ligadas à família de Noschang receberam R$ 851 mil em 2015 da FUG (Fundação Ulysses Guimarães), entidade vinculada ao PMDB e que foi presidida por Padilha entre 2007 e 2015.
Noschang contratou o escritório de Padilha em 2011 para se defender das acusações feitas por autoridades gaúchas de que ele faria parte de um esquema de desvio de verbas destinadas à educação após a deflagração da Operação Cartola. Em 2015, Noschang foi julgado e considerado inocente.
Documentos disponibilizados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) referentes à prestação de contas de 2014 do comitê de campanha de Temer mostram que houve 39 pagamentos à empresa de Paulo Noschang entre 7 de agosto e 17 de outubro de 2014. Somados, eles totalizam R$ 1.988.716,00 (66% de tudo o que a empresa recebeu em 2014 por serviços prestados a campanhas eleitorais).
Em apenas dois anos (2014 e 2015), a Noschang recebeu ao menos R$ 2,839 milhões do comitê de campanha de Temer e da FUG.
Para o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco, tanto Temer quanto Padilha precisam explicar em que circunstâncias uma empresa tão próxima ao ministro da Casa Civil foi escolhida pela campanha de Temer.
"O ideal é que esse tipo de proximidade entre contratante e contratado não existisse, mas, como se tratam de duas figuras públicas do peso de Temer e Padilha, acho que eles precisam explicar essa relação. Quanto mais transparência nessa relação, melhor", afirmou.
Eliseu Padilha afirmou, por meio de sua assessoria, que não sabia que a empresa de seu cliente havia sido contratada pela campanha de Temer. Os advogados responsáveis pelas contas de campanha de Temer disseram que os pagamentos feitos pelo comitê do presidente à gráfica do cliente de Padilha "não são alvos de questionamentos" judiciais.
Despesas separadas
Apesar de fazerem parte de uma chapa única, Michel Temer e a então candidata à reeleição, Dilma Rousseff (PT), tinham comitês de campanha que administravam seus recursos de forma independente, inclusive com dois CNPJs (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) e contas bancárias diferenciadas.
Os documentos do TSE também mostram que pessoas próximas a Padilha, como a coordenadora nacional do programa de formação à distância da FUG, Elisiane da Silva, atuaram diretamente na liberação de pagamentos para a empresa de Paulo Noschang durante a campanha de Temer à Vice-presidência.
Além de ter sido subordinada de Padilha durante o período em que o ministro presidiu a FUG, Elisiane é sócia de Simone Camargo, mulher dele, na empresa Amanhecer Empreendimentos. A sede da Amanhecer fica em Porto Alegre, no mesmo prédio onde funciona o escritório de advocacia de Padilha e sua mulher.
Contas sob investigação
As contas da chapa formada por Dilma e Temer estão sendo investigadas pelo TSE. Há suspeitas de que parte do dinheiro utilizado pela campanha tenha sido obtido por meio o pagamento de propina oriunda do esquema investigado pela Operação Lava Jato e repassado sob a forma de doações eleitorais legais.
Delatores como o ex-presidente da empreiteira Andrade Gutierrez Otávio Azevedo, por exemplo, afirmaram que a campanha de Dilma foi abastecida com dinheiro de propina.
O advogado de defesa de Dilma na ação que tramita no TSE, Flávio Caetano, nega que a campanha da petista tenha usado recursos oriundos de propina. Já o advogado de Temer, Gustavo Bonini Guedes, afirma que a campanha do peemedebista não deve ser responsabilizada por condutas atribuídas ao PT.
Segundo o TSE, a campanha de Dilma gastou R$ 350 milhões. Os dados totais referentes aos gastos feitos pelo comitê de campanha de Michel Temer e de outros candidatos a vice-presidente em 2014 não estão disponíveis no sistema de prestação de contas do tribunal.
Nesta quarta-feira (9), a "Folha de S.Paulo" revelou que R$ 1 milhão da empreiteira Andrade Gutierrez doados à sua campanha em 2014 entraram pela conta de Temer.
Outro lado
Questionado sobre sua proximidade com o empresário Paulo Noschang e os contratos que o PMDB firmou com comitê de campanha de Temer, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse, por meio de sua assessoria de imprensa, não ter influenciado na escolha da empresa de seu cliente durante as eleições de 2014. “Não recomendou. O então deputado federal, Eliseu Padilha, integrava a coordenação nacional da eleição presidencial e dava expediente no Comitê Central em Brasília”, disse um trecho da resposta enviada por sua equipe.
Em outro trecho, a assessoria diz que Padilha não sabia que a Noschang Artes Gráficas havia sido contratada pelo partido. “Não tinha conhecimento. Eliseu Padilha não sabe do PMDB ter contratado gráfica na eleição presidencial. O sócio da mencionada gráfica é cliente de escritório de advocacia do qual Eliseu Padilha é um dos sócios e está afastado de sua gestão e do exercício da advocacia”, afirmou.
Questionado sobre se Padilha vê algum impedimento “ético ou moral” no fato de o PMDB ter contratado uma empresa cujo proprietário é um de seus clientes, o ministro, por meio de sua assessoria de imprensa, foi sucinto. “Nenhum!”, respondeu.
A reportagem do UOL telefonou, no dia 3 de novembro, para a FUG em Porto Alegre, onde Elisiane trabalha, para solicitar esclarecimentos sobre sua atuação durante a campanha, mas foi informada de que ela não estava no local. Até o encerramento desta reportagem, Elisiane não respondeu ao recado deixado pela reportagem.
No dia 14 de outubro, a reportagem do UOL enviou um e-mail para a assessoria de imprensa do PMDB questionando sobre os critérios que levaram o partido a contratar a Noschang Artes Gráficas para produzir material de campanha pago com recursos do comitê de Michel Temer.
No mesmo dia, a reportagem telefonou para a assessoria, que confirmou o recebimento do e-mail. Entre os dias 31 e 3, a reportagem voltou a ligar para a assessoria do PMDB, mas as chamadas não forma atendidas.
Questionado sobre como sua empresa foi contratada pelo PMDB com recursos do comitê de campanha de Temer, o empresário Paulo Noschang disse, por e-mail, que “todo o serviço” prestado por ele “é público e está no site do TSE”. Perguntado sobre quem era o seu “contato” junto à direção do PMDB, Noschang não respondeu.
O escritório Bonini Guedes Advocacia, que faz a defesa de Temer na ação movida pelo PSDB junto ao TSE e que questiona a origem dos recursos que financiaram a campanha da chapa Dilma/Temer em 2014, disse, também por e-mail, que “não há questionamentos a respeito” dos pagamentos feitos pelo comitê de campanha de Temer à Noschang Artes Gráficas e que as “perguntas [enviadas pela reportagem] devem ser direcionadas aos envolvidos”.
A Secretaria de Imprensa da Presidência, que responde pelo presidente da República, Michel Temer, disse que o órgão “somente pode responder a demandas que digam respeito ao exercício do mandato atual do senhor Presidente da República”.
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