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O que separa o "Diretas Já" de hoje do movimento dos anos 80?

Manifestação pelas Diretas Já em 1984 e protesto contra Temer em 18 de maio - Arte UOL
Manifestação pelas Diretas Já em 1984 e protesto contra Temer em 18 de maio Imagem: Arte UOL

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

27/05/2017 04h00

Com o governo do general João Figueiredo prestes a terminar e ainda nas franjas da ditadura militar, milhares de brasileiros saíram às ruas em todo país pedindo “Diretas Já” em 1984. Trinta e três anos depois, já não são os militares, mas a instabilidade política e a possibilidade de uma segunda mudança de presidente em pouco mais de um ano devido a suspeitas sobre Michel Temer que fazem com que o lema ressurja.

Análise realizada pela Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro identificou até a última quarta-feira (24) mais de 54 mil postagens com as palavras “Diretas Já”; a hashtag #diretaspordireitos, usada em protesto às reformas promovidas pelo governo, por sua vez, teve 33 mil menções no Twitter. O pleito também aparece nas manifestações de rua nas principais capitais. Já no dia seguinte à revelação da gravação da JBS envolvendo o presidente, bandeiras de "Fora Temer" surgiam lado a lado com faixas de "Diretas Já" em protesto que reuniu milhares de manifestantes no centro do Rio de Janeiro.

Enquanto isso, as frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, que reúnem grupos sindicais e movimentos de esquerda, organizam para domingo (28) em Copacabana, no Rio de Janeiro, um show/ato com Caetano Veloso, Criolo e outros artistas em prol da votação direta para presidente.

Mas o que separa um movimento do outro?

Enquanto nos anos 1980, o desejo por eleições diretas e o fim do regime militar era um consenso entre os diferentes segmentos da sociedade, diz o cientista político e professor do ICS-Uerj (Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro) Paulo D'Avila, hoje o pedido de diretas já ainda está limitado a grupos da sociedade, em especial partidos de esquerda.

“Não é um movimento amplo. Antes você tinha todos os partidos, sindicatos, juntos, mesmo os patronais”, diz. “Hoje a grande certeza é que a sociedade está dividida.”

O cientista político e professor da UFABC (Universidade Federal do ABC) Vitor Marchetti pontua ainda a diferença no ambiente político. “Você olhava para frente [nos anos 1980] e tinha um ambiente futuro de democracia. Agora a democracia está um pouco para trás, vivemos um momento conturbado, polarizado.”

D’Avila afirma que, para além do debate de eleições diretas, a “verdadeira agenda” é a aprovação ou não das reformas previdenciária e trabalhista que vêm sendo tocadas pelo governo Temer. “A oposição quer barrar e a situação quer dar continuidade às reformas”, diz ele, ao lembrar que, no momento, nenhum dos caminhos pacificaria a sociedade.

“Passam as diretas, um lado vai dizer que é coisa de petistas. Se não passam, outro lado vai afirmar que foi golpe.”

De acordo com a Constituição, eleições diretas são convocadas se a Presidência ficar vaga até a primeira metade do mandato, prazo encerrado em dezembro passado. No entanto, corre no Congresso uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) que defende que o pleito indireto ocorra somente nos últimos seis meses do mandato.

O STF (Supremo Tribunal Federal) também analisa ação que considera válida a escolha pelo voto popular, mesmo se a Presidência ficar vaga nos dois anos finais do mandato, em caso de cassação via TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Marchetti considera que uma votação direta daria mais legitimidade ao eleito. Segundo ele, os controles que se exercem sobre uma pessoa eleita são muito diferentes daqueles que ocorrem em uma eleição indireta. “O eleito de forma direta tem a obrigação de prestar contas ao seu eleitor, tem em mente a construção de uma carreira política”, diz.

“Mesmo a lista de nomes possíveis em caso de novas eleições é completamente diferente --os possíveis nomes para concorrer a eleições indiretas não sem nem cogitados em caso de votação popular.”

E é a pressão popular, acredita o professor, que vai definir a possibilidade de a PEC ser aprovada ou não. “O termômetro vai ser a capacidade que essas manifestações que estão sendo marcadas a favor das eleições diretas terão para mobilizar ou não a sociedade. As ruas vão decidir.”

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