Análise: Fogo amigo do PMDB a Temer e Pezão não é autofagia; é 2018 já na rua
A crise dos governos do PMDB aumentou a artilharia do "fogo amigo" para cima do presidente Michel Temer e do governador do Rio, Luiz Fernando Pezão.
Nos últimos dias, peemedebistas têm disparado contra seus próprios líderes. Para cientistas políticos ouvidos pelo UOL, passar à oposição é uma estratégia porque 2018 já está na rua e o partido tenta garantir a formação de bancadas legislativas, diante da iminência de não lançar nomes ao Executivo federal e fluminense.
Entre os casos que chamaram a atenção nesta semana, o presidente da Assembleia Legislativa do Rio, Jorge Picianni (PMDB), antes um aliado, defendeu a saída de Pezão por impeachment ou mesmo intervenção federal.
No Senado, o PMDB foi derrotado na segunda-feira (20) na votação da reforma trabalhista na Comissão de Assuntos Sociais por um voto --entre eles, o do senador Hélio José (PMDB-DF). Nos dias seguintes, ele chamou o governo de corrupto e teve os cargos federais indicados retirados por Temer.
Outros nomes do Senado já deixaram claro a insatisfação com o governo, com frequentes críticas. O líder do partido na Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), chegou a comparar o governo com a seleção de Dunga. Senadores peemedebistas como Eduardo Braga (AM), Kátia Abreu (TO) e Roberto Requião (PR) também já manifestaram críticas ao governo Temer.
Nada de autofagia
Apesar de o "fogo amigo" poder passar a impressão de que o partido está se autodestruindo num processo de autofagia, o cientista político Ricardo Ismael, da PUC (Pontíficia Universidade Católica) do Rio, os ingressos à oposição fazem parte de uma estratégia visando as eleições de 2018.
"Se esse movimento der certo, vão votar em um monte de gente do PMDB em 2018 porque não conseguem identificar nos parlamentares vínculo com governos impopulares. É uma manobra, não é autofagia. A lógica leva a fazer bancadas nos Estados", diz.
Ismael vê diferenças e semelhanças entre os casos federal e do Rio e usa como exemplo Renan e Picianni --a quem chama de "profissionais". "Eles fazem discurso de oposição, mas devem ter cargos no governo para jogar dinheiro em suas bases. É algo ambíguo", afirma.
Para ele, no caso do Rio, com o PMDB "praticamente inviabilizado" para 2018 em termos de candidatura majoritária, Picciani passou a comandar a lógica da luta pela sobrevivência.
"O caso do Rio tem um componente: é o fato de o ex-governador [Sérgio Cabral] estar preso e respondendo a 11 processos. O ciclo do PMDB a nível do Estado se encerrou, seja pelo Cabral, seja pelo colapso financeiro que faz com que os servidores não recebam em dia", afirma.
A ideia dele [Renan Calheiros] é a mesma da maioria do PMDB na região: se descolar do Temer e ficar perto de Lula; 2018 já está na rua
Ricardo Ismael, cientista político
Em meio ao cenário de terremoto político, o PMDB age diferente de partidos como PT e PSDB --que sempre lutam para defender governos e líderes.
"O PMDB é uma federação, sempre foi um partido dividido. Difícil imaginar um candidato à Presidência, uma liderança nacional. A briga do Renan com o Temer é porque no Nordeste quem está liderando é Lula. A ideia dele é a mesma da maioria do PMDB na região: se descolar do Temer e ficar perto de Lula; 2018 já está na rua", aponta.
Ismael diz que tanto Picciani como Renan movem-se no tabuleiro eleitoral como "profissionais", calculando os custos e as vantagens de apoiar de governos de baixa popularidade.
Muito cacique para pouco índio
O cientista político e professor da Universidade Federal de Alagoas Ranulfo Paranhos afirma que o PMDB sempre foi um partido marcado por líderes regionais sem muita ligação ideológica --o que explicaria os ataques. "Em síntese: é muito cacique para pouco índio", compara.
Paranhos lembra que o PMDB mantinha uma tradição de não ser um partido homogêneo, mas sim, de ser uma frente partidária. E que isso fica mais acentuado no momento em que o partido assume cargos executivos nacionais.
"Ele tem subdivisões, gerenciadas sempre por um cacique. São alas bastante moderadas, mas há grupos de interesses. Eles detêm forças regionais, mas não correspondem a uma força única. Tudo é uma estratégia, correlação de forças, e aí vem o 'fogo amigo' visando o lado eleitoral", conclui.
Sobre Renan, ele avalia que o senador alagoano ainda é o nome mais forte do partido abaixo do presidente Temer, por ter arregimentado apoios fortes e confiabilidade dentro do partido.
"Ele vislumbra que um racha com o presidente Temer traz vantagens no futuro. Ele e todos: sempre isso é medido a partir das próximas eleições", afirma.
Paranhos diz que a ascensão de Temer --apesar de ser um correlegionário-- tirou poder de Renan dentro do partido e explica parte dos ataques. "Ele está numa negociação com o governo desde o impeachment. Ele não queria o Temer porque sabe que, dando mais poder a ele, por tabela tirou o dele no PMDB", explica.
O PMDB tem subdivisões, gerenciadas sempre por um cacique. Não correspondem a uma força única. Tudo é uma estratégia, visando o lado eleitoral
Ranulfo Paranhos, cientista político
Situação "melancólica"
Já o professor de ciências políticas da Universidade Federal de Pernambuco Michel Zaidan Filho define a situação de farpas no PMDB como "melancólica e lastimável ao mesmo tempo".
Para ele, a disputa interna e a busca por afastamento de peemedebistas do governo Temer são grandes causas da ingovernabilidade. "É um desses males do chamado presidencialismo de coalizão", explica.
Ele diz acreditar que um dos problemas mais clássicos do PMDB são os parlamentares "sempre prontos a mudar o voto" em troca de vantagens políticas.
"Não é mais possível manter nenhuma um aparência de normalidade. Cada um conta o que ganhou e o que pode perder com a saída do chefe. E há os que temem a Justiça e a prisão", complementa.
Cada um conta o que ganhou e o que pode perder com a saída do chefe. E há os que temem a Justiça e a prisão
Michel Zaidan Filho, professor de ciências políticas
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