Organização de prêmio internacional que tem Lava Jato na final teme atos de violência
A possibilidade de protestos de grupos contrários à Operação Lava Jato tem assustado os organizadores do prêmio Allard, que celebra pessoas ou grupos que atuam contra a corrupção. Ele será entregue na quinta-feira (28), na University of British Columbia, no Canadá. A força-tarefa do MPF (Ministério Público Federal) que investiga esquemas de desvios na Petrobras é um dos três finalistas da premiação.
Alguns grupos de brasileiros que vivem no país prometem se manifestar na sede da universidade em Vancouver. “Vamos ter segurança no campus”, diz a diretora-executiva do prêmio, Nicole Barrett, que disse temer atos de violência. “Por sermos de uma universidade, encorajamos o diálogo, o debate. Espero que sejam respeitos”.
Barrett afirmou que tem recebido mensagens por e-mails --alguns, segundo seu relato, chegam a ser ofensivas-- criticando o fato de o grupo de procuradores ser um dos três finalistas. Ela faz referência principalmente a uma carta enviada por um grupo intitulado “Coletivo Advogadas e Advogados pela Democracia”.
“Foi até assinada por um ex-ministro da Justiça, o senhor Aragão”, salientou, em entrevista por telefone ao UOL, referindo-se a Eugênio Aragão, que ocupou o cargo durante o segundo mandato do governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
Na carta, datada de setembro deste ano, o coletivo diz ter verificado “inúmeros abusos, arbitrariedades e violações legais cometidas pela força-tarefa”. Os membros do grupo dizem acreditar que a mera indicação da Lava Jato ao prêmio “maculará inexoravelmente a credibilidade dessa tão conceituada entidade perante toda a Comunidade Internacional que preza pelos Direitos Humanos”.
O fato de, na carta e em algumas mensagens, haver menções ao juiz federal Sergio Moro, que comanda os processos da Lava Jato na primeira instância, intrigou Barret. “Ele nem faz parte da força-tarefa”, observou. O grupo é formado apenas pelos procuradores do MPF, que possuem o papel de acusadores nas ações penais.
Barret repassou algumas das mensagens críticas para a direção da University of British Columbia, instituição canadense que promove a premiação. O site “The Talon”, que se identifica como um veículo de imprensa alternativo sobre a universidade, critica a indicação da Lava Jato. Ele chega a qualificar os procuradores como corruptos, autoritários e regressivos, e ainda tenta ligar o impeachment de Dilma ao trabalho da força-tarefa.
O UOL entrou em contato com a assessoria de imprensa da força-tarefa para comentar a premiação e as críticas que a Lava Jato vem sofrendo, mas foi informado que os procuradores estão em viagem e não teriam como falar.
No radar
A equipe responsável pela premiação diz saber que a força-tarefa está sofrendo críticas, mas ressalta que o conselho e os comitês que definem os finalistas fizeram uma ampla pesquisa a respeito dos concorrentes.
A diretora-geral também diz que há um trabalho de pesquisa acerca dos indicados antes de se chegar aos finalistas. “Eles passam por comitês avaliadores”, explica Barret sobre o processo de seleção.
Ela pontua que o processo de escolha segue seis critérios: coragem, liderança, luta contra corrupção, transparência, prestação de contas e respeito ao estado de direito. Por esses conceitos, a Lava Jato já “estava no radar” da premiação, explicou Barret. “Eles estão mudando o debate sobre corrupção no Brasil, estão fazendo algo diferente”.
Além da Lava Jato --a princípio, ela será representada pelos procuradores Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, e Paulo Roberto Galvão, que já estão no Canadá--, duas mulheres também disputam o prêmio de 100 mil dólares canadenses (cercam de R$ 256 mil): Khadija Ismayilova e Azza Soliman.
Concorrentes
Ismayilova, jornalista no Azerbaijão, escreve sobre corrupção e abuso de poder. Há três anos, ela foi sentenciada a sete anos e meio de prisão por evasão de divisas e abuso de poder, mas ganhou a liberdade no ano passado com a condição de não viajar para fora do país sem autorização oficial.
Com seu trabalho, ela revelou, em 2010, um esquema de corrupção envolvendo o presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev. A esposa e os filhos do presidente tinham propriedades imobiliárias nos Emirados Árabes Unidos no valor de US$ 44 milhões. Acredita-se que seu julgamento tenha sido motivado por questões políticas.
Já Soliman, uma advogada que atua em prol dos direitos humanos das mulheres no Egito, foi acusada de fazer um protesto não autorizado e de atentados à ordem pública após depor contra um policial que, durante uma manifestação, matou uma defensora dos direitos humanos das mulheres.
Em resposta, ela fundou a “Coalizão de Proteção a Testemunhas e Denunciantes” que tem como objetivo a promoção do estado de direito. Soliman está proibida pelo governo de viajar para fora do Egito. Ela também sofre o bloqueio dos serviços de sua firma de advogados e o congelamento de seu próprio patrimônio.
O prêmio Allard é entregue a cada dois anos para pessoas ou grupos que promovam “ações contra a corrupção e fomento dos direitos humanos”. Os primeiros vencedores foram o ativista indiano Anna Hazare, em 2013, por sua atuação em busca da transparência e contra a corrupção em seu país, e os jornalistas John Gitongo e Rafael Marques de Morais, em 2015, por expor casos de corrupção em seus países, o Quênia e Angola, respectivamente. Para a premiação deste ano, houve o registro de 244 candidaturas de 70 países.
A cerimônia de premiação está marcada para as 18h30, hora local (22h30, em Brasília), no auditório da University of British Columbia, no campus de Vancouver, e será conduzida pelo jornalista americano Glenn Greenwald, que divulgou, em 2013, informações fornecidas pelo analista de sistemas Edward Snowden sobre esquemas de vigilância feitos pela NSA (sigla, em inglês, para Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos).
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