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Delator confirma pagamento de R$ 3 mi, mas diz não saber se era para Bendine

Bendine, ex-presidente da Petrobras e do BB, vira réu na Lava Jato - Nacho Doce/Reuters
Bendine, ex-presidente da Petrobras e do BB, vira réu na Lava Jato Imagem: Nacho Doce/Reuters

Do UOL, em São Paulo

04/10/2017 19h51Atualizada em 04/10/2017 19h55

Em audiência com o juiz Sergio Moro, Fernando Migliaccio, um dos responsáveis pelo departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht --área da distribuição de propina --, confirmou nesta quarta-feira (4) que foi feito um pagamento de R$ 3 milhões em favor do codinome "Cobra" em meados de 2015. O delator disse, no entanto, desconhecer qual seria o nome real do receptor da propina. Para o MPF (Ministério Público Federal), "Cobra" fazia referência à Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil.

Migliaccio foi ouvido como testemunha de acusação no processo no qual Bendine é réu sob acusação de ter recebido R$ 3 milhões em propinas pagas pela Odebrecht. Ele responde aos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, organização criminosa e embaraço à investigação de organização criminosa. 

Também viraram réus pelos mesmos crimes os irmãos André Gustavo da Silva Júnior e Antônio Carlos Vieira da Silva Júnior, supostos operadores de propina de Bendine, que foram presos preventivamente junto do ex-presidente da Petrobras. Os três foram detidos em 27 de julho, na Operação Cobra, a 42ª fase da Lava Jato

Durante a audiência, a procuradora Jerusa Burmann Viecilli perguntou à Migliaccio se ele conhecia os recibos destinados ao codinome "Cobra". "Eu participei na confecção desses recibos na época", disse o delator. O ex-funcionário da Odebrecht disse ter criado as senhas -- Rio, Oceano e Lagoa -- para cada um dos três recibos com o valor de R$ 1 milhão. 

Ao ser questionado sobre quem era "Cobra", Migliaccio afirma desconhecer quem tinha esse codinome. Moro também perguntou a quem seriam destinados os R$ 3 milhões. "Provavelmente tinha [um destinatário], mas eu não sei quem é", afirmou. 

O delator também afirmou que, se os recibos foram encontrados nos sistemas eletrônicos chamados de "MyWebDay" e "Drousys", os pagamentos foram devidamente efetuados. 

Delator diz conhecer suposto operador

Em relação ao supostos operadores de Bendine, Migliaccio confirmou que conhecia um deles, André Gustavo da Silva Júnior. "Ele [André] foi à minha sala algumas vezes para saber destes pagamentos." Moro pediu ao delator para detalhar a quantidade e como foram os encontros. "Talvez umas duas vezes. A primeira vez, o Fernando Reis [ex-executivo da Odebrecht] o levou à minha sala. Tenho mensagens com ele [André] no telefone. Ele me cobrava quando ia ser o pagamento." 

No mesmo processo contra Bendine, completam o rol de réus o ex-presidente do grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht; Fernando Reis, executivo da companhia; e o doleiro Álvaro José Galliez Novis. Odebrecht e Reis foram denunciados por corrupção ativa e lavagem de dinheiro, enquanto a Novis só foi imputado o último crime.

Na audiência desta quarta, também foi ouvido como testemunha de acusação Hilberto Mascarenhas Alves da Silva Filho, chefe do setor de operações estruturadas da Odebrecht. Ele confirmou que não dava para identificar quem eram as pessoas que respondiam pelos codinomes na lista de propinas da empreiteira. De acordo com o ex-executivo, eram mais de 500 codinomes. Os pagamentos constavam do sistema chamado MyWebDay e eram feitos no Brasil e no exterior, em real e dólar, com auxílio de operadores.

Paulo Roberto Costa, chefe do setor de operações estruturadas da Odebrecht, que também depôs como testemunha de acusação, reafirmou que havia pagamento de propina por parte de empreiteiras a partidos políticos e a ele em contratos com a estatal, e que a Odebrecht fazia a maior parte deles no exterior. Em nenhum momento ele se referiu a pagamentos a Bendine, uma vez que atuou na Petrobras até abril de 2012, bem antes do executivo assumir a estatal.

A ex-presidente Dilma Rousseff será ouvida na ação como testemunha de defesa de Bendine. O depoimento ao juiz Sergio Moro foi marcado para o próximo dia 25, às 14h, por meio de videoconferência com Porto Alegre. Já Emílio Odebrecht, pai de Marcelo Odebrecht, será ouvido no dia 31, às 9h30, por meio de videoconferência com São Paulo como testemunha do filho. A ex-presidente da Petrobras Maria das Graças Silva Fostes será ouvida no mesmo dia por videoconferência no Rio como testemunha de Fernando Reis.

Entenda o caso

As investigações da PF apontam que Bendine e pessoas ligadas a ele teriam solicitado vantagem indevida, em razão dos cargos exercidos, para que a Odebrecht não viesse a ser prejudicada em futuras contratações da Petrobras. Em troca, o grupo empresarial teria efetuado o pagamento de ao menos R$ 3 milhões, em espécie. Ainda de acordo com a PF, os pagamentos só foram interrompidos depois da prisão de Marcelo Odebrecht, em junho de 2015.

Bendine esteve à frente do Banco do Brasil entre abril de 2009 e fevereiro de 2015, quando deixou o banco para assumir a presidência da Petrobras. O executivo renunciou ao cargo de presidente-executivo da Petrobras em carta enviada ao Conselho de Administração em maio de 2016.

Segundo o MPF-PR, há evidências indicando que um pedido de propina no valor de R$ 17 milhões foi feito por Aldemir Bendine na época em que era presidente do Banco do Brasil para viabilizar a rolagem de dívida de um financiamento da Odebrecht Agroindustrial. 

Além disso, há provas apontando que, na véspera de assumir a presidência da Petrobras, Bendine voltou a solicitar propina a executivos da Odebrecht para que a empresa não fosse prejudicada em contratos com a petroleira. Delatores indicam que, desta vez, a Odebrecht aceitou pagar a propina de R$ 3 milhões.

Segundo a denúncia do MPF-PR, o valor foi repassado em três entregas em espécie, no valor de R$ 1 milhão cada uma, em uma apartamento alugado para Antônio Carlos Vieira da Silva em São Paulo. Esses pagamentos foram realizados em 2015 pelo setor de Operações Estruturadas da Odebrecht --o "departamento de propina" da empresa-- com a atuação de Álvaro Novis.