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STF não precisa de aval do Congresso para afastar parlamentar, diz Fachin em voto

Ser ou não ser Supremo? Caso Aécio desafia supremacia do STF

UOL Notícias

Gustavo Maia e Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

11/10/2017 11h34Atualizada em 11/10/2017 14h14

Relator da ação que questiona medidas restritivas (cautelares) aplicadas contra parlamentares pelo STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro Edson Fachin defendeu em seu voto que essas decisões judiciais --como o afastamento do mandato-- não devem ser submetidas ao aval da Câmara e do Senado. O julgamento ocorre nesta quarta-feira (11).

Para Fachin, as medidas cautelares são diferentes dos casos de prisão em flagrante, quando a Constituição determina que a Casa legislativa do parlamentar precisa ser consultada.

Para o ministro, a lei não confere “nem de longe” ao Congresso o poder de revisar decisões técnicas e jurisdicionais sobre medidas cautelares penais do Judiciário, o que implicaria em "ampliar a imunidade para além dos limites” da Constituição.

[Congresso revisar uma decisão do STF] É uma ofensa ao postulado republicano e uma ofensa à independência do Poder Judiciário

Edson Fachin, ministro do STF

A Corte julga nesta quarta-feira a Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) protocolada em maio do ano passado --dias depois de o Supremo afastar o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) mandato e, consequentemente, da Presidência da Câmara-- por três partidos que apoiavam o peemedebista. Os demais ministros do STF ainda precisam votar.

O julgamento da Adin foi a solução encontrada para diminuir a temperatura da crise aberta entre o STF e o Senado depois que a 1ª Turma do Supremo afastou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) do exercício do mandato e determinou o seu recolhimento noturno, há duas semanas.

Congresso revisar uma decisão do STF é uma ofensa, disse Fachin - Pedro Ladeira/Folhapress - Pedro Ladeira/Folhapress
Congresso revisar uma decisão do STF é uma ofensa, disse Fachin
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Na ação, PP, PSC e Solidariedade pediram que o eventual afastamento de parlamentares por decisão judicial seja submetido ao Congresso Nacional em 24 horas, a quem caberia confirmar ou revogar a medida. Eles pleitearam ainda que a regra se estenda para o caso de eventuais prisões preventivas decretadas contra deputados e senadores.

Fachin destacou que há uma diferença "marcante" entre a decretação da perda definitiva do mandato, que só pode ser feita pelo Legislativo, e a suspensão temporária do parlamentar.

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No entendimento do ministro, os poderes conferidos ao Congresso para sustar processos penais não abarcam as medidas cautelares porque elas também são meios utilizados na fase de investigação e da garantia e ordem pública, como para impedir o risco de "reiteração delitiva", ou seja, que ele continue praticando o crime do qual é acusado.

O ministro ressaltou ainda que, mesmo preso, o parlamentar tem o direito à defesa resguardado e a julgamento do STF, e que, portanto, nenhum direito estaria sendo alterado.

Sobre o caso de Cunha, Fachin lembrou que a decisão do STF foi unânime. O caso do ex-presidente da Câmara, segundo o ministro, foi uma “situação de franca excepcionalidade”.

Durante sua manifestação, Fachin citou voto da presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, durante o julgamento de Cunha. Na ocasião, ela afirmou que o STF não estava apenas defendendo e guardando a Constituição.

"[O Supremo] defende e guarda a própria Câmara dos Deputados para resguardar todos os princípios e regras que têm de ser aplicados, uma vez que a imunidade referente ao cargo e àqueles que o detém não pode ser confundido em nenhum momento com impunidade ou possibilidade de vir a ser”, leu o ministro.

Caso Aécio causou atrito entre Senado e Supremo

Depois que a ação julgada nesta quarta-feira foi pautada para o plenário do Supremo, o Senado, que havia marcado uma votação para analisar a validade das medidas contra Aécio, decidiu evitar o confronto direto com o Judiciário e adiar a votação para o próximo dia 17.

Está é a primeira vez que o tribunal discute se dispositivos do CPP (Código de Processo Penal) como medidas alternativas à prisão podem ser aplicados contra membros do Poder Legislativo.

Quando Aécio foi afastado de suas atividades, no dia 26 de setembro, senadores reagiram à decisão com o argumento de que a medida cautelar imposta ao tucano não está prevista na Constituição.

De acordo com o artigo 53 da Carta Magna, os membros do Congresso Nacional não podem ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável.

Três dos cinco ministros da 1ª Turma que votaram a favor das medidas contra Aécio, no entanto, entenderam que cabia aplicar medidas restritivas de direito previstas pelo artigo 319 do CPP, como o recolhimento domiciliar e suspensão do exercício de função pública.

Em dezembro do ano passado, a PGR (Procuradoria-Geral da República) se posicionou contra a Adin, defendendo que submeter medidas cautelares do sistema processual penal ao crivo da Casa legislativa “fragilizaria indevidamente a persecução criminal”.

“Importaria, ao fim e ao cabo, ampliação indevida do alcance das imunidades parlamentares, com manejo de ação de controle concentrado de constitucionalidade para instituir procedimento absolutamente novo, não previsto pelo constituinte de 1988”, escreveu o então procurador-geral, Rodrigo Janot, em parecer. Hoje a PGR é representada pela nova procuradora-geral, Raquel Dodge.

Partidos e Congresso defendem prisão só em flagrante

Por meio do advogado do PP, Aristides Junqueira, os partidos que moveram a ação defenderam nesta quarta-feira no STF que a aplicação do artigo 319 do CPP é possível desde que feita em substituição à única prisão possível ao parlamentar de acordo com a Constituição, a prisão em flagrante.

“Não existindo prisão em flagrante nem havendo possibilidade, portanto, de substituí-la por uma prisão cautelar, não é possível a aplicação do artigo 319. Isso pode gerar impunidade e peca contra o princípio da isonomia”, afirmou.

Ele argumentou ainda que o parlamentar está no Congresso em nome do povo por meio do mandato popular. “Me parece que, em uma democracia, a interpretação tem que ser que este mandato tem de ser preservado sempre e permitindo seu exercício não se podendo afastá-lo como se a função dele ou a profissão dele fosse a do comum dos mortais”, declarou.

Em nome do Senado, o advogado Hugo Souto Kalil afirmou que nenhum Poder é maior do que o outro e criticou o que classificou de saídas fáceis. Para ele, com a medida aplicada pela 1ª Turma do STF, a Constituição foi lida a partir do CPP, e não o contrário. “É uma hermenêutica criativa que não tem fundamento na lei”, disse Kalil.

O deputado federal Evandro Gussi (PV-SP) e corregedor da Câmara foi ao plenário do STF defender o posicionamento da Casa. Ele ponderou que “a imunidade formal dos parlamentares” tem caído em descrença e alertou que, “se estamos a demolir tal instituto”, é preciso saber quais os efeitos dessa atitude.

A advogada-geral da União, Grace Mendonça, representante do presidente Michel Temer (PMDB), foi na mesma linha. “A regra concebida pelo legislador é a regra da não prisão. Em caráter excepcional, é possível sim, mas em numa situação muito específica [prisão em flagrante]”, sustentou.