Topo

Gilmar Mendes diz ser preciso evitar "lendas urbanas" sobre foro privilegiado

Ministro do STF Gilmar Mendes em palestra na Fiesp - Marlene Bergamo/Folhapress
Ministro do STF Gilmar Mendes em palestra na Fiesp Imagem: Marlene Bergamo/Folhapress

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

23/11/2017 13h18

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes afirmou nesta quinta-feira (23) que o julgamento sobre a restrição ao foro privilegiado, previsto para a tarde de hoje, trata de um tema “complexo” e que devem ser evitados argumentos que ele comparou a “lendas urbanas”.

“Essa é uma questão muito complexa, ela tem uma série de implicações e deve ser pautada com toda a serenidade como devem decidir os tribunais”, disse.

“Nós temos que melhorar a Justiça como um todo, e sobretudo a justiça criminal. Então, há muita lenda urbana nesse tema que precisa ser considerada. E, claro, o Congresso tem toda legitimidade de fazer essa avaliação”, afirmou o ministro.

Você é a favor do fim do foro privilegiado?

Resultado parcial

Total de 151620 votos
8,61%
79,07%
12,32%

Valide seu voto

O Congresso Nacional analisa uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que restringe o foro privilegiado. O projeto já passou pelo Senado e na quarta-feira (22) foi aprovado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara.

Como exemplo de “lenda urbana” Gilmar citou o argumento de que os processos criminais que tramitam nos tribunais superiores seriam mais lentos que os da justiça de primeira instância.

“Vocês não podem esquecer nunca que nós temos uma das justiças criminais mais ineficientes do mundo. Só 8% dos homicídios, esse dado é do CNMP [Conselho Nacional do Ministério Público], são revelados no Brasil. Nós deixamos prescrever crime de júri, homicídio e tentativa de homicídio dolosos, prescrição de 20 anos. Isso tudo na primeira instância”, disse.

“Portanto, quando se faz a comparação: o foro por prerrogativa de função é ineficiente? Vamos olhar como que está funcionando a vara de homicídios aqui no Distrito Federal, em Planaltina de Goiás, lá em Cabrobó”, afirmou o ministro.

O foro privilegiado, oficialmente chamado de “foro por prerrogativa de função”, estabelece que ocupantes de determinados cargos públicos, como políticos e autoridades, sejam julgados por tribunais e não por juízes de primeira instância. Deputados federais, senadores e ministros de Estado, por exemplo, são julgados pelo STF.

Para Mendes, o foro sobrecarrega o Supremo.

“Eu tenho a impressão, e essa é a opinião que já externei muitas vezes, que o foro por prerrogativa de função, tal como ele está dimensionado hoje, ele traz um supertrabalho para o Supremo Tribunal Federal, uma sobreoneração”, disse.
“Não se imaginava quando se aprovou o foro por prerrogativa de função que nós teríamos uma coisa como 400, 500 investigados e denunciados no Supremo Tribunal Federal, se considerarmos apenas os membros do Congresso Nacional. E claro que isso é uma conta bastante complicada de o Supremo digerir”, afirmou o ministro.

Foro no STF

Nesta quinta-feira (23), o STF deve julgar uma ação que pode levar à restrição das regras do foro privilegiado antes mesmo da aprovação da PEC pelo Congresso.

A proposta que será debatida no julgamento pode restringir a regra do foro privilegiado para crimes cometidos durante o exercício do mandato e que guardem relação com o cargo ocupado.

Por exemplo, um deputado que cometesse um crime no trânsito, seria julgado em primeira instância. Já um deputado flagrado negociando propina em troca da aprovação de projetos na Câmara, permaneceria sendo julgado pelo STF.

Segundo números do STF citados pelo ministro Luís Roberto Barroso, tramitam na Corte cerca de 500 processos contra pessoas com prerrogativa de foro.

Já a PEC em tramitação no Congresso é mais ampla, e extinguiria o foro para 45 mil a 52 mil políticos e autoridades em todo o Brasil. O número varia a depender do autor do estudo sobre o impacto do projeto.

O projeto no Congresso mantém o foro privilegiado apenas para o presidente e o vice-presidente da República, além dos presidentes da Câmara, do Senado e do STF (Supremo Tribunal Federal).

Caso a proposta seja aprovada, deputados e senadores que hoje são julgados por corrupção no STF, por exemplo, passariam a ser julgados por juízes de primeira instância, como o juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, ou o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, ambos responsáveis pelos processos da Operação Lava Jato em cada Estado.

A proposta analisada no Congresso não altera a proibição da prisão de parlamentares federais, que só pode ser feita em flagrante de crime inafiançável. Nesses casos, o processo deve ser remetido dentro de 24 horas à respectiva Casa Legislativa, para ser resolvida pela maioria dos deputados ou senadores.

A PEC ainda terá um longo caminho a ser percorrido na Câmara. Isso porque, após ser aprovada na CCJ, a proposta terá que ser analisada por comissão especial, criada especificamente com essa finalidade. Depois, o plenário terá que votar a matéria em dois turnos, sendo necessários 308 votos (3/5 dos 513 deputados) em cada um deles.

Por se tratar de uma emenda constitucional, se a Câmara modificar o texto aprovado no Senado o projeto tem que ser votado novamente pelos senadores, também em dois turnos de votação. A promulgação, que não precisa passar por sanção presidencial, só ocorrerá se um mesmo texto for aprovado sem alterações pelas duas Casas.