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Barbosa pode ser o 1º ministro do STF a disputar Presidência em 100 anos

Joaquim Barbosa, ex-presidente do STF, durante reunião do PSB, partido ao qual se filiou - Renato Costa/Frame Photo/Estadão Conteúdo
Joaquim Barbosa, ex-presidente do STF, durante reunião do PSB, partido ao qual se filiou Imagem: Renato Costa/Frame Photo/Estadão Conteúdo

Gustavo Maia

Do UOL, em Brasília

24/04/2018 04h00

Pela primeira vez em 100 anos no Brasil, um ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) deverá concorrer à Presidência da República, nas eleições deste ano.

Ex-presidente da Corte, Joaquim Barbosa, 63, é tido como nome praticamente certo nas urnas em 2018. Ele se filiou ao PSB no último dia 6, véspera do fim do prazo que quem pretende disputar cargos eletivos estivesse registrado em um partido político.

A última –e única-- vez que isso aconteceu foi em 1919, quando o ex-ministro do STF e então senador Epitácio Pessoa disputou e venceu o pleito. A eleição foi realizada de forma extraordinária, após a morte do presidente eleito no ano anterior, Rodrigues Alves.

Pessoa integrou o STF entre 1902 e 1912. Até 1905, ele acumulou o cargo com o de procurador da República, de acordo com sua biografia disponível no Acervo Nacional. Após deixar o Supremo por motivos de saúde, foi eleito para representar a Paraíba, seu estado natal, no Senado. Ele deixou a Presidência da República em 1922.

Epitácio Pessoa - Arquivo Nacional - Arquivo Nacional
Epitácio Pessoa integrou o STF de 1902 a 1912 e presidiu o país entre 1919 e 1922
Imagem: Arquivo Nacional

O UOL cruzou os nomes dos candidatos em todas as eleições realizadas desde a proclamação da República com a lista de 167 ministros que passaram pelo Supremo Tribunal Federal no período, entre eles os 11 atuais.

Barbosa se aposentou do Supremo em julho de 2014, pouco mais de 11 anos depois de tomar posse.

Na pesquisa Datafolha divulgada no dia 15, o ex-ministro obteve de 8% a 10% das intenções de voto e chegou a ficar em terceiro lugar em cenários sem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que o nomeou para o STF --e está preso.

Na última quinta quinta (19), ele afirmou que ainda não decidiu se será candidato, mas classificou como "muito bom" o resultado da pesquisa, já que leva “uma vida pacata” e não costuma dar entrevistas.

O ex-ministro nunca disputou cargos públicos. Antes de integrar o STF, que presidiu entre 2012 e 2014, foi procurador da República no MPF (Ministério Público Federal) de 1984 a 2003.

A experiência do possível presidenciável no STF foi destacada pelo presidente do PSB, Carlos Siqueira, ao comemorar a filiação.

“Ele deixou sua marca pessoal de firmeza e independência, e, ao colocar em discussão na Corte pautas progressistas contribuiu para um significativo avanço civilizatório da sociedade brasileira”, disse Siqueira.

Em comunicado divulgado para explicar a filiação ao PSB, Barbosa disse que há quase quatro anos deixou espontaneamente a vida pública, mas continuou a “acompanhar atentamente a evolução da vida econômica, política e social do país”.

Admitindo pela primeira vez em público a possibilidade de se candidatar ao Palácio do Planalto, o magistrado disse que “dar esse passo” tem sido um dilema pessoal para ele, “sobretudo neste momento conturbado da vida nacional”.

Para a cientista política Nara Pavão, professora visitante da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), a possível incursão do ex-ministro na disputa pela Presidência pode ser um sinal do avanço da judicialização da política, mas só será possível observar isso se ou quando ele começar a campanha e divulgar suas propostas.

“Por enquanto, a única coisa que a gente sabe sobre ele é o que ele simboliza”, comentou. "Eu acho que ele, como um ex-ministro, está se aproveitando da imagem positiva que o Judiciário tem em uma campanha onde a renovação é uma peculiaridade importante, assim como a corrupção”, declarou a pesquisadora.

A possível candidatura, para ela, “é muito natural” dado o contexto atual de descrença na política tradicional e de grande legitimidade do Judiciário, principalmente na Operação Lava Jato. “Houve um choque externo muito grande que abalou a estrutura da política tradicional”, disse.

“Em momentos de crise econômica ou política, você tem esse clamor pelo novo. Só que ele é um novo associado a uma instituição que tem reputação [Judiciário]”, afirmou Nara, que tem pós-doutorado na Universidade Vanderbilt (EUA), doutorado e mestrado na Notre Dame (EUA), e outro mestrado na USP (Universidade de São Paulo).

Quanto ao fato de um ministro do Supremo tentar se eleger como chefe do Executivo, ela destaca que o Judiciário é o protagonista da atual crise. “É o principal herói da história, que está indo contra a corrupção, que está limpando a política, que está fazendo algo que ninguém fazia antes”, comenta.

“Em 1989 a gente tinha um cenário relativamente parecido quanto à abertura a atores novos, só que ali a lógica era diferente. Não se estava saindo de uma destruição massiva, estava se construindo um sistema [democrático]”, declarou. “E antes o Judiciário não era um ator tão importante para a opinião pública.”

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