Topo

Moro interrompe Morais durante depoimento e diz que escritor estava fazendo propaganda de Lula

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

11/06/2018 15h03

O depoimento do escritor Fernando Morais, testemunha de defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na ação penal que investiga o sítio de Atibaia (SP), nesta segunda-feira (11), chegou a ser interrompido pelo juiz federal Sergio Moro. Para o magistrado, o escritor estava usando o momento para fazer propaganda do ex-presidente.

Morais respondia às perguntas do advogado de Lula, Cristiano Zanin, quando o magistrado interrompeu o defensor para reclamar de questões que, avaliou, não tinham “nenhuma relevância para o processo”.

O escritor falava sobre o acompanhamento quase que permanente a Lula desde 2011, quando o petista, já fora do Palácio do Planalto, passara a se dedicar a palestras pelo mundo.

Do círculo de relacionamentos do petista há 44 anos, Morais contou que havia sido contratado pela editora Companhia das Letras para escrever sobre o período entre a primeira prisão de Lula, em 1980, durante a ditadura militar, e a saída dele do poder, em 2010, encerrados dois mandatos.

Com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016, o trabalho de pesquisa acabou derivando a proposta de dois livros --de modo que a segunda prisão do petista, em 7 de abril deste ano, será contemplada.

Morais afirmou que, a partir de 2011, fez um trabalho de acompanhamento, em função da produção dos livros, ao ex-presidente. Ao todo, listou 18 países aos quais Lula viajou por convite de empresários ou de sindicatos de trabalhadores para palestras.

Em uma dessas ocasiões, em Londres, relatou, Lula recebeu a visita do músico Bono, líder da banda irlandesa U2, no hotel onde estava, e teria pedido a Morais que acompanhasse o músico até a portaria.

Lá, relatou o escritor, Bono afirmou a jornalistas que o aguardavam que, “depois da morte de Mandela, só existe no mundo uma pessoa capaz de juntar ricos e pobres, pretos e brancos, magros e gordos, e essa pessoa se chama Luiz Inácio Lula da Silva.”

Moro, que pouco antes dessa declaração cobrara objetividade do depoente nas respostas, interpelou o advogado de Lula sobre a relevância, dentro do processo, daquele tipo de detalhe.“Estamos falando da reputação do acusado”, justificou Zanin.

“O senhor pode divulgar questões meritórias fora do processo”, rebateu o juiz. “Há questões que devem-se levar em consideração”, pediu o advogado, que sugeriu que o juiz estaria incomodado com os fatos narrados. “Não me incomoda, só acho que o processo não deve ser usado para esse tipo de propaganda”, refutou o juiz.

Zanin chegou a rebater que a testemunha estivesse agindo em “propaganda” ao ex-presidente. “Existe aqui uma discussão em torno de palestras, colocada em dúvida pelo juízo, e estamos inclusive fazendo a prova de que elas foram realizadas, por uma pessoa de grande reputação, e que havia interesse em assistir às palestras. Isso é absolutamente pertinente à questão”, definiu o advogado.

Antes de prosseguir à próxima pergunta, Morais se dirigiu ao juiz: “Posso fazer uso da palavra?”. Moro respondeu: “Não, o senhor pode responder as perguntas que forem feitas”. “Sim, senhor”, reagiu a testemunha.

Morais aproveitou a pergunta de Zanin sobre ter ou não presenciado Lula pedir vantagens ilícitas nessas oportunidades fora do país – o que ele negou que o petista tivesse feito, em todas as vezes em que o acompanhou --para responder à crítica do juiz.

“O meritíssimo fez uso da palavra ‘propaganda’, que eu repudio. Não estou fazendo propaganda – quero dizer que, nessas viagens, eu só ia no avião [em que Lula estava] quando havia lugar sobrando. Quando não havia, elas eram pagas pela Companhia das Letras”, disse.

“Em nenhum momento eu teria razão para estar fazendo propaganda para quem quer que seja. Não ia jogar fora uma carreira de 50 anos para fazer propaganda de um presidente da República”, encerrou.