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TCU acionará PGR para analisar se Decreto dos Portos, assinado por Temer, é constitucional

Decreto dos portos foi assinado pelo presidente Michel Temer em 2017 - MARIVALDO OLIVEIRA/CÓDIGO19/ESTADÃO CONTEÚDO
Decreto dos portos foi assinado pelo presidente Michel Temer em 2017 Imagem: MARIVALDO OLIVEIRA/CÓDIGO19/ESTADÃO CONTEÚDO

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília*

26/06/2018 18h42Atualizada em 26/06/2018 21h34

O plenário do TCU (Tribunal de Contas da União) decidiu nesta terça-feira (26) encaminhar uma representação à PGR (Procuradoria-Geral da República) para que ela analise uma possível inconstitucionalidade no Decreto dos Portos, editado pelo presidente Michel Temer (MDB) em maio de 2017. 

O TCU quer saber se a PGR considera inconstitucional a prorrogação por até 70 anos de contratos de arrendamentos em portos independentemente de quando foram firmados. O tribunal pede que sejam considerados tanto contratos passados quanto futuros. Dependendo do entendimento da PGR, ela poderá formular uma Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) no STF (Supremo Tribunal Federal).

“A questão é saber se é compatível com os princípios da administração pública esse prazo de 70 anos, mesmo para casos futuros”, afirmou o relator do processo, Bruno Dantas.

A prorrogação por 70 anos dos contratos das companhias atuantes nos locais é o principal ponto estipulado pelo chamado Decreto dos Portos. Antes da medida, os contratos podiam ser estendidos por até 50 anos.

Normalmente, as sessões ordinárias do TCU acontecem às quartas, mas a dessa semana foi antecipada devido ao jogo da seleção brasileira na Copa do Mundo na Rússia nesta quarta (27) à tarde.

O Decreto dos Portos foi analisado pelo TCU após questionamento da área técnica do próprio tribunal ao identificar pontos que poderiam ser considerados inconstitucionais.

O documento também é alvo de uma investigação da Polícia Federal que apura se Temer, aliados e políticos do MDB receberam propina em troca de benefícios a empresas portuárias em Santos, litoral de São Paulo. Não cabe à jurisprudência do TCU investigar as suspeitas políticas sobre o mérito do decreto. 

O governo federal nega quaisquer irregularidades, afirma que o decreto foi editado após amplo debate e que nenhuma companhia foi beneficiada de forma individual. A Polícia Federal concluiu que a Rodrimar não teria sido contemplada com privilégios, mas jogou luz sob supostas benesses ao grupo Libra. Sócios da Libra chegaram a ter a prisão decretada e a prestar depoimentos.

As suspeitas sobre Temer em torno da edição do Decreto dos Portos surgiram a partir de uma conversa de pouco mais de 2 minutos com o ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures interceptada pela Polícia Federal em 4 de maio. Loures, que foi assessor especial da Presidência, estava grampeado. O deputado tentava saber sobre a assinatura do decreto dos Portos e Temer informou o parlamentar que iria assinar o decreto na semana seguinte. Temer assinou o decreto no dia 10 de maio.

Depois da conversa com Temer, Rocha Loures passou informações por telefone a Ricardo Conrado Mesquita, membro do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira dos Terminais Portuários e diretor da empresa Rodrimar, que opera no Porto de Santos.

Na semana passada, a Rodrimar voltou a alegar que não foi beneficiada pelo decreto e pediu que a parte correspondente a ela do inquérito no STF seja submetida à primeira instância.

TCU endurece prorrogações de contratos

Além de acionar a PGR, o TCU também decidiu endurecer a prorrogação de contratos de arrendamentos em portos. Agora, a extensão dos acordos ficará limitada ao prazo previsto nos contratos iniciais anteriores a 2017. 

Por exemplo: se o acordo previa a possibilidade de uma extensão por 10 anos, a empresa poderá permanecer no local somente por mais 10 anos. Ou seja, os efeitos do Decreto dos Portos de permitir prorrogações por até 70 anos não serão retroativos. 

Os contratos assinados antes de 2017 também só poderão ser estendidos uma única vez. Antes, era possível haver diversas extensões de prazo.

No voto original, o ministro Bruno Dantas defendeu o veto à prorrogação ordinária ou antecipada dos contratos, autorizando-a apenas em “casos excepcionalíssimos” para “fins de reequilíbrio financeiro”.

Dantas ressaltou que o TCU, como órgão fiscalizador, precisa “criar amarras e estabelecer parâmetros” para evitar ilegalidades apesar da necessidade de modernizar o setor portuário.

O tribunal ainda enrijeceu as condições para a permuta de áreas, como terminais, entre arrendatários dentro de um mesmo porto. Os espaços precisarão ser equivalentes e o pedido para a troca terá ser de aprovado pelo TCU previamente.

Quanto a investimentos de empresas em áreas comuns, sem ser onde operam estritamente, terão de ser dentro da área do porto com orçamento pré-aprovado pela autoridade portuária. Além disso, a obra deverá ter relação direta com o serviço realizado no local, explicou Bruno Dantas.

Entidades defendem decreto

Representantes de empresas portuárias conversaram pela manhã com integrantes do tribunal na tentativa de adiar o julgamento e reverter a decisão. Eles alegam que o decreto trouxe racionalidade econômica e foi elaborado com imparcialidade e foco no bem público. 

Ainda na avaliação das entidades, a extensão de prazos é necessária e não gera direitos automáticos. Sobre a possibilidade de mudanças de áreas, defenderam que seriam feitas por meio de processo administrativo com análise prévia do TCU.

Ministério aguarda notificação

Em nota divulgada à noite, o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil não contestou a decisão do TCU e disse aguardar uma notificação do Tribunal para colocar as novas medidas em prática.

A pasta afirmou, porém, que as mudanças implementadas no Decreto "foram embasadas em critérios técnicos a partir do diálogo produtivo e transparente com as entidades do setor privado, com o acompanhamento permanente da AGU (Advocacia Geral da União) e da Controladoria Interna deste Ministério".

*(Com informações da Agência Estado)