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Mourão quer fim de "antiamericanismo infantil" e pressão contra a Venezuela

Luis Kawaguti

Do UOL, no Rio

02/11/2018 04h00

O vice-presidente da República eleito, general da reserva Antônio Hamilton Mourão (PRTB), defendeu o fim do que chamou de “antiamericanismo infantil” na América do Sul e a aplicação de pressão diplomática no governo do presidente Nicolás Maduro, para que a Venezuela tenha “eleições em situação de normalidade” e alternância de poder.

Segundo ele, o governo de Jair Bolsonaro (PSL) deseja que o Brasil tenha uma relação “estratégica e não só algo puramente comercial” com parceiros globais como Estados Unidos, China e União Europeia. Mourão destacou a necessidade de criar parcerias não só políticas com essas nações, mas também na área de tecnologia, com ênfase em inteligência artificial e tecnologia da informação --que possuem aplicações na área de Defesa.

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se esforçou para tornar o Brasil mais relevante no cenário político internacional, tentando ganhar um assento no Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), enviando tropas militares para o Haiti, negociando uma solução para a questão nuclear do Irã e expandindo a rede de embaixadas. Já os governos Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) deram menos ênfase a esses tipos de iniciativas, focando em relações comercias. 

Em entrevista ao UOL no Clube Militar, no centro do Rio, Mourão, que foi adido militar na Embaixada do Brasil na Venezuela, disse que o governo de Bolsonaro não deve aplicar sanções econômicas ao país vizinho, mas que a diplomacia brasileira fará pressão por alternância de poder.

“Vamos lembrar que, desde 1998, esse grupo [chavista] ocupa o poder na Venezuela, são 20 anos de poder. Essa curva chegou ao seu final”

Antônio Hamilton Mourão, vice-presidente da República eleito

A equipe de Bolsonaro vem afirmando que não cogita ação militar contra a Venezuela, mas poderia participar de eventual missão de paz da ONU no país. Até o momento, não houve qualquer sinalização pública de que o departamento de missões de paz das Nações Unidas cogite uma ação no país.

Unasul x Estados Unidos

O UOL questionou se o vice-presidente eleito vê o Brasil mais alinhado em questões de Defesa com os Estados Unidos ou com a Unasul (União de Nações Sul-Americanas) --bloco composto pelos 12 países da América do Sul com o objetivo de integrá-los.

“A Unasul está praticamente falida, morreu e esqueceu de deitar. O famoso Conselho de Defesa da Unasul nunca decolou. Isso era birra daquele pessoal que governou os países da América do Sul com a visão ainda no século 19, aquele antiamericanismo infantil, que não leva a nada.”

Antônio Hamilton Mourão, vice-presidente da República eleito

Historicamente, Washington defende que as forças militares sejam usadas na América do Sul para combater ameaças locais, como o narcotráfico. Já na Unasul, a visão predominante é que o poder militar seja usado só para defender as fronteiras contra outros estados.

Mourão descartou a possibilidade de formação de uma força transnacional para combater o narcotráfico na América do Sul (opção já cogitada pelos EUA nos bastidores no início dos anos 2000), mas afirmou:

“Considero que nosso sistema de relações exteriores tem que ter um trabalho mais agressivo junto a nossos vizinhos que são grandes produtores de drogas, para que eles também façam sua parte, não só nós aqui do lado de cá”, afirmou ele, sem detalhar possíveis medidas.

Bolívia, Colômbia, Equador e Peru são países produtores de cocaína, e o Paraguai é utilizado para a produção de maconha.

No plano interno, Mourão defendeu que as Forças Armadas continuem a ser usadas com poder de polícia dentro do território nacional nas chamadas operações de GLO (Garantia da Lei e da Ordem), desde que de forma “episódica” e sem banalização. Também se disse favorável à participação do Brasil em missões de paz no exterior.

Mourão compara redução de ministérios com economia de cofrinho

UOL Notícias

Papel no governo

Mourão está participando do processo de transição da administração Temer para o governo recém-eleito de Bolsonaro. Segundo ele, quando o governo começar oficialmente, não poderá assumir cargo executivo fora o de vice.

Eu sou limitado pela Constituição e tenho que buscar um espaço onde eu possa, dentro da legalidade, auxiliá-lo [Bolsonaro] (...) Fico mais como um assessor privilegiado do presidente, uma vez que fui eleito junto com ele.

Antônio Hamilton Mourão, sobre seu papel no governo Bolsonaro

Por isso, disse que atuará como uma espécie de articulador interno em projetos que envolvam mais de um ministério. “Por exemplo, Agricultura e Infraestrutura estão debatendo a construção de uma ferrovia ou a duplicação de uma rodovia e há controvérsia nisso aí, então é onde eu posso dirimir as disputas que estejam ocorrendo”, disse.

Ele afirmou também que a redução do número de ministérios --atualmente são 29, e o governo eleito já falou em 15, 16 e 17 pastas (o número ainda não foi definido)-- trará uma economia ao governo que ainda não foi calculada, mas que ele apelidou de "economia da moedinha no cofrinho" por poupar os menores recursos, até material de escritório. Afirmou ainda que, em sua opinião, o governo se tornará mais eficiente e restringirá “as áreas onde a corrupção pode fluir”.

Mourão: leis de fomento eram usadas de forma ideológica

Mourão disse ser necessário defender uma postura pacificadora da sociedade após a conclusão das eleições. “Nós governamos para todo o Brasil, independente de opinião política, independente de gênero, independente de opção sexual, independente de cor”, afirmou.

Questionado se apoiadores de Bolsonaro podem se sentir legitimados para usar a violência nas ruas, Mourão afirmou:

“O presidente Bolsonaro em nenhum momento chegou ou chegará a dizer: ‘atenção, carta branca para caçar opositores’. Jamais isso aí. É inadmissível algo dessa natureza”, afirmou. Ele disse que, se crimes forem cometidos, os suspeitos devem imediatamente ser investigados pela polícia e levados à Justiça.

Em entrevista nesta semana ao "Jornal Nacional", da Rede Globo, Bolsonaro criticou o jornal "Folha de S.Paulo" afirmando: “por si só, esse jornal se acabou”. Disse ainda que veículos de imprensa que se comportarem de maneira indigna não terão recursos do governo federal.

Perguntado sobre o assunto, Mourão disse: “Acho que a relação entre o governo e a imprensa tem que se dar em alto nível. Uma relação onde a verdade prevaleça efetivamente. E a política de publicidade, ela tem que ser justa”.

No área da cultura, o vice disse que leis de incentivo, como a Lei Rouanet e a Lei do Audiovisual (que permitem abatimentos de impostos para empresas que patrocinem ações culturais), não podem ser usadas de forma ideológica “como vinham sendo usadas”.

“Tem que haver critérios muito bem definidos para que esses incentivos, que nada mais são do que incentivos, cheguem àquelas pessoas que necessitam”.

Previdência

Mourão disse que os próximos passos do governo eleito serão analisar a estrutura do governo atual, os quadros de pessoal e a “real situação econômica do país”.

Ele defendeu que a reforma da Previdência seja votada ainda no governo de Michel Temer. “Nos daria um fôlego para a gente buscar correção de rumo. Ela passa uma imagem para os investidores da seriedade e da disposição do governo”.