Dino autoriza R$ 370 mi em emendas para cumprimento do mínimo da saúde
O ministro do STF Flavio Dino atendeu a pedido da AGU (Advocacia-Geral da União) para liberar uma pequena parte das emendas de comissão que estão bloqueadas — especificamente, as relacionadas à saúde.
O que aconteceu
Em decisão tomada no último dia do ano, Dino autorizou pagamento de parte das emendas, "com a finalidade exclusiva" de garantir o "mínimo constitucional de despesas com saúde". A decisão foi tomada após a AGU enviar, em 30 de dezembro, um pedido para a liberação de R$ 370 milhões das emendas bloqueadas, dizendo que só assim o piso das despesas com saúde poderia ser alcançado.
Valor liberado chega a R$ 370 milhões — menos de 10% do total bloqueado inicialmente. Dino havia determinado o bloqueio de R$ 4,2 bilhões das chamadas "emendas de comissão" só na Câmara. Segundo a AGU, para cumprir o mínimo constitucional da saúde, seria necessário pagar R$ 370 dessas emendas destinadas à saúde especificamente.
Fato mostra "preocupante dependência de gastos vinculados a emendas", que "não se articulam com ações planejadas no SUS", diz Dino. "Ao contrário, tem prevalecido nas emendas o caráter fragmentário, inclusive sem levar em conta indicadores sanitários objetivos, além dos terríveis casos de improbidade já identificados ou ainda em investigação", diz a decisão do ministro do STF.
Ministro vê "uma grave colisão de direitos e obrigações constitucionais". De um lado, diz Dino, está "a imperativa adequação das emendas parlamentares ao devido processo orçamentário", que levou o ministro a bloquear as "emendas de comissão". De outro lado, a necessidade de atingir o piso constitucional, "sendo que o Poder Executivo alega que somente com um determinado montante de 'emendas de comissão' isso se torna possível."
Em um trecho da decisão, o ministro voltou a chamar a situação atual de "balbúrdia" orçamentária. Dino disse que as decisões do STF sobre as emendas "visam a que tenhamos uma melhor alocação de recursos, seja pelo aspecto da eficiência, seja no tocante à transparência e à rastreabilidade". Em decisão no domingo (29), o ministro já havia classificado a situação das emendas como "o ápice de uma balbúrdia quanto ao processo orçamentário".
Ministro determinou que comissões de saúde no Congresso deem respaldo para as emendas específicas que serão liberadas. Isso deve ocorrer até 31 de março de 2025. Sem esse procedimento, a autorização dada hoje por Dino para liberação das verbas poderá ser suspensa. Após a decisão do magistrado, a AGU publicou um documento para que os órgãos do governo façam o empenho dos recursos seguindo as determinações de Dino.
Emendas parlamentares — por sua configuração atual — não se articulam com ações planejadas nas instâncias de direção do SUS. Ao contrário, tem prevalecido nas emendas o caráter fragmentário, inclusive sem levar em conta indicadores sanitários objetivos, além dos terríveis casos de improbidade já identificados ou ainda em investigação. (...)
Entendo que a relevância do direito fundamental à saúde — e do cumprimento do piso constitucional de gastos — justifica, no presente caso, a adoção de medidas de adaptação do processo legislativo orçamentário, de modo a permitir a contabilização de valores oriundos de "emendas de comissão". (...)
Sem planejamento, conjugado com adequada vontade política e administrativa, a balbúrdia orçamentária -- violadora da Constituição Federal -- não terá fim.
Flávio Dino, em decisão de 31 de dezembro de 2024 autorizando pagamento de parte das emendas que haviam sido bloqueadas
Entenda o cabo de guerra sobre as emendas de comissão
AGU disse que governo não consegue cumprir o piso da saúde sem as emendas. A AGU (Advocacia-Geral da União) informou, nesta terça-feira (31), ao ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Flavio Dino, que o governo federal não poderá cumprir o piso constitucional de despesas na saúde sem liberação das emendas.
Dino havia pedido que AGU fornecesse informações "objetivamente, com números". A Advocacia-Geral da União solicitou ao ministro, na segunda-feira (30), a liberação de R$ 370 milhões em emendas de comissão para saúde. No pedido, o órgão argumentou que a execução do valor seria uma "forma de garantir o cumprimento integral do mínimo constitucional em saúde".
Constituição prevê gasto mínimo na saúde de R$ 215,5 bilhões. Segundo a AGU, uma parte das emendas bloqueadas seriam necessárias para complementar uma pequena parcela desse montante.
Dino suspendeu emendas de comissão
Pagamento das emendas de comissão bloqueados. O ministro determinou no dia 23 de dezembro a suspensão dos recursos e a abertura de inquérito pela Polícia Federal para investigar a estratégia do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para pagamento dos recursos.
Lira e lideranças arquitetaram manobra. Poucos dias antes do recesso parlamentar e, enquanto o governo tentava aprovar os projetos do pacote de ajuste fiscal, o presidente da Câmara coordenou o envio de um ofício para o Executivo com indicações de todas as emendas de comissão. Os indicativos foram assinados pelos 17 líderes partidários da Casa. O valor dessas emendas, conforme mostrou o UOL, pode chegar até R$ 5,4 bilhões.
Comissões não aprovaram recursos. A nova destinação das verbas foi apresentada, porém, sem que colegiados deliberassem sobre as emendas, o que Dino entendeu ser irregular e, por isso, determinou a suspensão do pagamento destes valores.
Câmara argumenta que teve aval do governo. O advogado da Casa informou ao STF que seguiu as orientações do Poder Executivo, com base nas decisões de Dino, e que Senado elaborou ofício semelhante.
Dino cobra transparência
O ministro do STF negou, na segunda-feira (30), pedido do Senado para autorizar pagamento de emendas de comissão indicadas pelos líderes partidários da Casa. Dino afirmou que o Senado tem "um degrau mais elevado de transparência" que a Câmara por individualizar a responsabilidade de cada indicação entre os líderes, mas ainda assim apontou que não foram apresentadas as atas das reuniões que teriam aprovado as indicações.
Como empenhar uma 'emenda de comissão' cuja indicação do beneficiário e o valor a ser a ele repassado não foram aprovados pela Comissão?
Flávio Dino, em decisão de 30 de dezembro
Dino havia liberado neste domingo (29) parte das emendas que estavam bloqueadas. Mesmo permitindo a movimentação dos recursos, o ministro manteve críticas à maneira como as emendas são distribuídas. O ministro cobra transparência dos parlamentares para saber a qual finalidade são destinadas as emendas solicitadas por deputados e senadores que o governo federal precisa liberar.
AGU recomendou não pagar recursos liberados. A Advocacia-Geral a União defendeu "interpretação mais segura" da decisão de Dino. No documento, afirma que há uma "dúvida razoável" se a decisão do ministro de liberar a execução de parte dos recursos alcança as emendas de comissão tratadas no ofício dos líderes. Portanto, orienta o governo a manter a suspensão dos pagamentos até que seja feito um esclarecimento judicial.
Como funcionam as emendas de comissão
Emendas de comissão substituíram o orçamento secreto considerado irregular pelo STF. A modalidade ganhou força após a ministra aposentada da Corte, Rosa Weber, considerar as emendas de relator inconstitucionais em 2022.
Governo não tem obrigação de pagar os recursos. As emendas de comissão não são impositivas, ou seja, o Executivo não tem o dever de realizar o pagamento das verbas assim como faz com as emendas individuais e de bancadas.
Indicações escondem "padrinhos" dos recursos. A indicação das emendas eram definidas pelas comissões do Congresso, que não identificavam os autores originais de cada indicação. A modalidade entrou na mira do STF, após Dino determinar a transparência de todas as emendas parlamentares pagas desde 2020 e o bloqueio dos recursos.
Congresso aprovou projeto que não dá transparência a verbas. O texto, que foi sancionado pelo presidente Lula (PT), transfere para os líderes a assinatura das indicações das emendas de comissão. Nesse formato, a ideia é que as lideranças indiquem os valores pedidos pelos parlamentares, o que, na pratica, continua escondendo os "padrinhos" das verbas.
As emendas de comissão são utilizadas como moeda de troca nas negociações políticas no Congresso. Parlamentares ouvidos pelo UOL afirmam que, geralmente, as comissões recebem listas prontas da cúpula das Casas com os nomes dos deputados e senadores que serão beneficiados com as verbas. A prática beneficia poucos parlamentares e é alvo de reclamação.
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