Damares diz que manterá programa de direitos humanos que criticou em 2014
Anos antes de assumir o Ministério da Família, Mulher e Direitos Humanos, Damares Alves se posicionou contra o Programa Nacional de Direitos Humanos - PNDH 3, hoje sob sua tutela. "Não quero, sou contra. Eu luto. Faço o que posso para que esse decreto seja revisto, mas não tem sido fácil", disse em 2014 sobre a regulamentação do programa feita cinco anos antes.
Em nota, o ministério não comentou a declaração da ministra, mas afirmou que, no momento, não prevê nenhuma alteração no plano. A fala de Damares foi feita durante palestra de 1 hora e 30 minutos direcionada para o público evangélico. O discurso foi gravado em vídeo e postado em 2014 no canal do Youtube da pastora Cynthia Ferreira, a quem Damares disse que a Igreja "perdeu espaço" com a Teoria da Evolução nas escolas. Damares também criticou os movimentos gay e feminista.
A crítica é ao programa como um todo, mas durante a palestra ela aponta uma das ações programáticas do documento, que inclui nos "sistemas de informação do serviço público todas as configurações familiares constituídas por lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, com base na desconstrução da heteronormatividade".
Damares explica no vídeo o que, na sua visão, significa o termo: "Desconstrução da heteronormatividade. E aqui vou traduzir porque alguns não entenderam: desconstrução da família tradicional. Deixa eu traduzir a palavra desconstrução: destruição da família tradicional. Isso é sério por demais", disse.
Durante a exposição, a ministra vincula a questão à bandeira do movimento gay, que classifica de ideológico e orientado por partidos políticos. Para Damares, esses movimentos buscam privilégios e querem calar a maioria.
Para justificar suas afirmações, ao longo da palestra, Damares exibia em um telão cartilhas direcionadas a crianças, que ela disse ser do Ministério da Educação e Ministério da Saúde. O conteúdo do material didático continha informações sobre formação de famílias, educação e orientação sexual.
Vêm esses conselhos, esses sábios, esses notáveis 'do cão' dizer que o menino não é menino até dez anos. E a menina não é menina até dez anos, que é gênero neutro. Vocês não têm ideia da confusão que eles estão fazendo na educação no Brasil
Damares Alves, durante palestra como pastora
A hoje ministra questionou na época a efetividade dos conteúdos e disse entender que as políticas públicas estão sendo influenciadas pelo movimento gay e queer (teoria que sustenta que as identidades sexuais e de gênero são construídas pela sociedade e não apenas determinadas biologicamente).
Antes de se tornar ministra, a advogada e pastora Damares Alves foi por quase 20 anos assessora jurídica de parlamentares da bancada evangélica. Ela também dava palestras sobre costumes, família, mulheres e direitos humanos.
O que o PNDH-3?
O terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos torna a questão política de Estado e está organizado em seis eixos:
- Interação Democrática entre Estado e Sociedade Civil;.
- Desenvolvimento e Direitos Humanos;
- Universalizar Direitos em um Contexto de Desigualdades;
- Segurança Pública, Acesso à Justiça e Combate à Violência;
- Educação e Cultura em Direitos Humanos;
- Direito à Memória e à Verdade.
O programa tem a intenção de "aperfeiçoar a interlocução entre Estado e sociedade civil e depende da implementação de medidas que garantam à sociedade maior participação no acompanhamento e monitoramento das políticas públicas em direitos humanos, num diálogo plural e transversal entre os vários atores sociais e deles com o Estado", segundo o documento oficial.
No Programa, a palavra "heteronormatividade", criticada pela ministra, aparece apenas uma vez.
Ato contra o PLC 03/2013
No mesmo canal da pastora Cynthia Ferreira, há um vídeo postado em 2013 com o título "Não quero sangue inocente em minhas mãos! Dra Damares Alves". Nele, a pastora faz uma encenação com as mãos sujas de tinta vermelha e as esfrega na camiseta branca que veste.
O ato era para que a então presidente Dilma Rousseff (PT) não sancionasse o projeto de lei complementar 03/2013, que determina a hospitais priorizar atendimento às mulheres vítimas de agressão sexual.
Parte do movimento evangélico considerou, à época, que o projeto poderia favorecer o aborto, uma vez que as vítimas dessa violência poderiam (como prevê a legislação), optar pelo aborto ao serem atendidas.
Polêmicas de Damares
A ministra já se envolveu em outras polêmicas desde que assumiu o cargo, em 1º de janeiro. Em um vídeo gravado após a posse, Damares disse que "menino veste azul e menina veste rosa". Ela justificou que queria fazer uma metáfora contra a ideologia de gênero. Já em uma outra declaração, disse que o Estado é laico, mas a ministra é "terrivelmente cristã".
Ainda sobre questões de costumes, em entrevista à GloboNews, a ministra disse que os atuais moldes do Enem podem atrapalhar as famílias, uma vez que os estudantes podem se deslocar para estudar em outras cidades.
Outro lado
Em nota, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos informou que "no momento não está prevista nenhuma alteração no Programa Nacional de Direitos Humanos - PNDH 3".
O UOL questionou qual avaliação que a ministra faz, atualmente, do programa e se o considera útil, mas não houve resposta. Em relação à encenação de Damares com posicionamento contrário à lei que dispõe sobre atendimento obrigatório e integral às pessoas vítimas de violência sexual, o Ministério não se posicionou.
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