Dallagnol não tinha certeza de provas contra Lula, mostram mensagens
Mensagens trocadas entre o procurador Deltan Dallagnol e outros membros da operação Lava Jato no Paraná mostram que havia dúvidas sobre a solidez das provas apresentadas pela acusação do caso do "tríplex do Guarujá". O julgamento resultou na prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Além do debate a respeito da denúncia do tríplex, uma série de reportagens publicadas ontem pelo site The Intercept também mostra que o ex-juiz federal e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, orientou as investigações da Lava Jato em Curitiba por meio de mensagens trocadas pelo aplicativo Telegram com Dallagnol, que é coordenador da força-tarefa.
Em 9 de setembro de 2016, Dallagnol enviou uma mensagem a um grupo do aplicativo Telegram chamado "Incendiários ROJ". Dele, faziam parte os procuradores que trabalhavam no caso.
"Falarão que estamos acusando com base em notícia de jornal e indícios frágeis? Então é um item que é bom que esteja bem amarrado. Fora esse item, até agora tenho receio da ligação entre Petrobras e o enriquecimento, e depois que me falaram tô com receio da história do apto? São pontos em que temos que ter as respostas ajustadas e na ponta da língua", escreveu Dallagnol ao fazer sua última leitura da denúncia contra Lula.
Ninguém respondeu a mensagem.
Definição do foro
Se os procuradores não conseguissem provar que o tríplex havia sido recebido como propina por Lula em caso de corrupção na Petrobras, o caso não poderia ser julgado em Curitiba. Assim, sairia das mãos do então juiz federal Sérgio Moro e passaria ser à Justiça de São Paulo. A disputa envolveu até o STF (Supremo Tribunal Federal), mas acabou com a vitória dos procuradores de Curitiba.
Após ler uma reportagem do jornal O Globo em 2010 que atribui a Lula a posse de um apartamento no mesmo edifício do tríplex, Deltan Dallagnol mostrou-se mais convicto em prosseguir com a acusação.
Em seguida, Dallagnol pediu que algum dos procuradores falasse com a jornalista que apurou a matéria. O procurador Januário Paludo foi a outro grupo, o "Filhos do Januário", informar que havia conseguido falar com a repórter. "Conversei com a TATIANA FARAH DE MELLO, que fez a reportagem em 2010 sobre o TRIPLEX. Ela realmente confirmou que foi para GUARUJÁ e lá colheu diversas informações sobre os empreendimentos da BANCOOP", disse.
"A matéria era para ser sobre a BANCOOP e o calote dado nos mutuários. Em Guarujá conversando com funcionários da obra - que ainda estava no esqueleto, é que ela descobriu que o triplex seria do Lula. Ela manteve contato com a Assessoria de comunicação do Palácio do Planalto que confirmou a informação. Toda parte documental, como e-mail e outros dados foram inutilizados quando ela saiu do 'o Globo'. Acho que podemos tomar por termo o depoimento. Marco uma video e pronto", escreveu o procurador.
No processo que levou Lula à prisão, Moro considerou que a empreiteira OAS ofereceu o tríplex ao ex-presidente como vantagem por um esquema de corrupção envolvendo três contratos entre a empreiteira e a Petrobras.
O tríplex chegou a ser visitado por Lula e sua mulher Marisa em 2014, mas o ex-presidente sempre negou que fosse proprietário do imóvel. O apartamento está registrado em nome da OAS e já foi leiloado.
A empreiteira, que reformou o tríplex, indicou que o imóvel era preparado para Lula e sua família. A defesa de Lula nega.
Outro lado
Em nota, a força-tarefa da Lava Jato falou em "ataque criminoso" ao lembrar o ataque de hackers ao celular do ministro Sérgio Moro.
Segundo o documento, os procuradores "mantiveram, ao longo dos últimos cinco anos, discussões em grupos de mensagens, sobre diversos temas, alguns complexos, em paralelo a reuniões pessoais que lhes dão contexto".
Esses procuradores seriam amigos próximos e, "nesse ambiente, são comuns desabafos e brincadeiras". "Muitas conversas, sem o devido contexto, podem dar margem para interpretações equivocadas".
Por fim, a nota diz que "a força-tarefa lamenta profundamente pelo desconforto daqueles que eventualmente tenham se sentido atingidos", mas reitera que nenhum pedido de esclarecimento ocorreu antes das publicações, "o que surpreende e contraria as melhores práticas jornalísticas".
"De todo modo, eventuais críticas feitas pela opinião pública sobre as mensagens trocadas por seus integrantes serão recebidas como uma oportunidade para a reflexão e o aperfeiçoamento dos trabalhos da força-tarefa", completou a nota.
Segundo o The Intercept, o site não entrou em contato com procuradores e outros envolvidos nas reportagens "para evitar que eles atuassem para impedir sua publicação e porque os documentos falam por si". "Entramos em contato com as partes mencionadas imediatamente após publicarmos as matérias", explicou o veículo.
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