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Após ameaças, testemunha contra Paulo Preto entra para programa de proteção

O ex-diretor da Dersa, Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto: acusação de ameaça a testemunhas levou à sua prisão em 2018 - Sérgio Lima/Folhapress
O ex-diretor da Dersa, Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto: acusação de ameaça a testemunhas levou à sua prisão em 2018 Imagem: Sérgio Lima/Folhapress

Aiuri Rebello

Do UOL, em São Paulo

27/06/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Principal testemunha na condenação a 145 anos de cadeia de Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, entrou para o programa federal de proteção
  • Ela foi ameaçada diversas vezes por causa de sua delação premiada e decidiu abandonar tudo para proteger a família
  • Apontado como operador de propinas do PSDB em SP no governo do senador tucano José Serra, Souza responde a outros processos e está preso em Curitiba

A principal testemunha na condenação a 145 anos de prisão no início deste ano de Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto e apontado pela Operação Lava Jato como o operador de propinas do PSDB em São Paulo durante o governo do senador tucano José Serra (2007-2010), entrou para o Provita (Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas) após seguidas ameaças de morte contra si e sua família.

Souza está preso preventivamente em Curitiba, após ter sido alvo da Ad Infinitum, 60ª fase da Lava Jato no Paraná. Neste caso, o MPF (Ministério Público Federal) o acusa de ter operado propina para a Odebrecht e de ter movimentado ao menos R$ 135 milhões (de acordo com o câmbio atual) em contas na Suíça, de 2007 a 2017.

Na segunda-feira (24), o UOL mostrou que a força-tarefa da Lava Jato conseguiu bloquear R$ 113 milhões de Paulo Preto localizados em um banco de Nassau, nas Bahamas. A reportagem procurou a defesa de Souza, mas o advogado Alessandro Sílvério não retornou as tentativas de contato da reportagem.

Em 2018, no decorrer do processo, Souza chegou a ser preso por conta das ameaças contra a testemunha -- e solto alguns meses depois em um habeas corpus concedido pelo ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal). De acordo com o advogado Emerson Flávio da Rocha, que representa a testemunha protegida M., as ameaças continuaram mesmo com a prisão, e a cliente foi incluída junto com toda a família no programa federal de proteção às testemunhas.

"No início deste ano, mesmo após a condenação e o fim do processo, a Justiça permitiu que ela ficasse no programa, onde já estava desde as ameaças sofridas relatadas no processo, dada a gravidade e seriedade das ameaças que sofreu", afirma Rocha, que pede que sua cliente não tenha mais o nome exposto pois ainda o usa.

A sentença do processo garante a ela ser identificada publicamente apenas pela sigla. "Assim, ela segue no programa de proteção com a família em local sigiloso, monitorada por MPF (Ministério Público Federal) e PF (Polícia Federal) e à disposição das autoridades", diz.

"Foi reconhecido o valor da contribuição dela para a condenação dos outros acusados", diz o defensor. "O caso dela é tão grave que a juíza autorizou que ela não participasse das audiências do processo e fosse ouvida separadamente, em outra sala, sem a divulgação de seu nome ou imagem. Agora ela só quer reconstruir a vida, trabalhar e esquecer essa história, mas eles têm muito medo, com toda a razão."

Empurrão na rua e ameaças aos filhos

M. afirma que pouco após o início das investigações das desapropriações no Rodoanel, em 2015, começou a receber as ameaças que atribui a Paulo Preto em função do teor de seus depoimentos. Naquele ano, disse a delatora, um desconhecido a ameaçou na rua.

Você é o arquivo vivo da Dersa e cuidado para não ser o arquivo morto"
De um desconhecido, na rua, para M

Tempos depois, foi empurrada por um homem logo após ser demitida da Dersa. A ex-funcionária teria caído no chão e machucado o braço. "Você tem a língua grande", teria dito o agressor enquanto afastava-se.

Em 2016, outro desconhecido chamou-a pelo nome na rua e disse que ela seria presa e que na prisão iria conhecer as mulheres do PCC -- a facção criminosa Primeiro Comando da Capital.

De acordo com a delatora, criminosos armados ou seus representantes compareciam à sede da Dersa, no Itaim, em São Paulo, para receber as indenizações. O dinheiro vivo era acondicionado em caixas e mochilas. A maioria dos beneficiados não assinava os recibos comprovando o pagamento do dinheiro, segundo o depoimento.

M. foi condenada neste mesmo processo que Paulo Preto junto a outros réus, mas de acordo com o defensor, sua prisão domiciliar foi convertida em pena restritiva de liberdade -- onde o condenado perde temporariamente alguns direitos como ser contratado ou prestar serviço para o poder público, tirar passaporte, viajar para fora do país e sair da cidade sem comunicar as autoridades com antecedência, entre outras restrições.

Como funciona o programa de proteção a testemunhas

Criado em 1999, o Provita (Programa de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas) funciona em parceria com os estados e é um dos três programas de proteção a pessoas ameaçadas do governo brasileiro -- os outros dois são o PPCAAM (Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte) e o PPDDH (Programa Nacional de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos).

Até o ano passado, 537 testemunhas em todo o Brasil, em alguns casos com suas famílias, integravam o Provita. A entrada no programa é voluntária e significa abandonar a casa, trabalho e cidade de origem.

A vítima sob proteção recebe alimentação, saúde, atendimento psicológico e dinheiro do governo para pagar despesas, mas precisa comprometer-se a tentar arrumar um novo emprego, prestar depoimentos e não poder dizer a ninguém, seja amigo íntimo ou familiar, onde está. O acesso à internet também é controlado.

Apenas a Justiça, o Ministério Público e a Secretaria de Segurança Pública têm acesso aos dados das testemunhas. Em casos mais graves, a família também pode ser incluída no programa e, em situações de perigo extremo, a pessoa pode até ganhar uma nova identidade.