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Líder do PSL em SP, Carteiro Reaça segue clã Bolsonaro e evita apoiar Doria

O deputado Gil Diniz (PSL) fala durante sessão na Assembleia Legislativa de São Paulo - Bruno Rocha /Fotoarena/Folhapress
O deputado Gil Diniz (PSL) fala durante sessão na Assembleia Legislativa de São Paulo Imagem: Bruno Rocha /Fotoarena/Folhapress

Diego Toledo

Colaboração para o UOL, em São Paulo

14/07/2019 04h00

Até 2014, Gildevânio Ilso dos Santos Diniz era funcionário dos Correios, vivia e trabalhava em São Mateus, na zona leste de São Paulo, e começava a manter um blog e perfis em redes sociais com o nome de Carteiro Reaça. Na internet, os alvos de suas críticas eram movimentos de esquerda, em especial o PT e os sindicatos. Cinco anos depois, Gil Diniz é deputado estadual pelo PSL e lidera a bancada do partido com mais cadeiras (15) na Assembleia Legislativa.

A guinada na vida de Diniz começou a partir de um encontro com dois dos filhos de Jair Bolsonaro. A afinidade com bandeiras como a defesa da pena de morte, de regras mais brandas para comprar armas, de ações mais duras da polícia e do antipetismo aproximaram o Carteiro Reaça do bolsonarismo. Em um comentário recente, o colega de partido Alexandre Frota chegou a chamar Gil Diniz de "Louro José do Eduardo Bolsonaro".

"Eu quero ser associado à imagem deles [dos Bolsonaros]. Não só pra lucrar politicamente, realmente eu acredito naquilo que eles defendem. Pra mim, não é uma crítica, é motivo de orgulho."
Gil Diniz, deputado estadual (PSL-SP)

Admirador de Olavo de Carvalho e pró-Escola Sem Partido

Em três meses de mandato (a nova legislatura na Assembleia começou em março), Diniz partiu em defesa dos servidores da segurança pública, com homenagens a PMs mortos e críticas a ativistas de direitos humanos que condenam abusos da polícia.

"Ele sempre tenta colocar os defensores dos direitos humanos como inimigos da segurança pública", reage a deputada estadual Mônica Seixas (PSOL), da Bancada Ativista, que antagoniza o discurso de Diniz. "Eu sempre rebato, dizendo que nós queremos direitos humanos e respeito para todos os trabalhadores, inclusive os policiais."

O líder do PSL na Assembleia também propôs a exigência de exames toxicológicos para matrícula de alunos em universidades públicas e se posicionou em defesa do projeto Escola Sem Partido.

Admirador de Olavo de Carvalho, Diniz também simboliza a posição ambígua do partido em relação ao governo de João Doria (PSDB). O governador apoiou Bolsonaro no segundo turno da eleição presidencial e agora precisa dos votos da bancada do partido do presidente para aprovar os projetos de seu governo.

"Eu e mais alguns deputados somos mais críticos ao PSDB e ao próprio Doria. A gente faz uma crítica muito dura principalmente à política de segurança pública. Mas, tirando isso, nós não temos problema com o governo", afirma Diniz. "Em algumas votações, o PSL foi fundamental para a vitória do governador, mesmo sendo independente."

Foto do dia em que Gil Diniz, então carteiro, conheceu os irmãos Eduardo (à esq.) e Carlos Bolsonaro - Gil Diniz/Reprodução - Gil Diniz/Reprodução
Foto do dia em que Gil Diniz, então carteiro, conheceu os irmãos Eduardo (à esq.) e Carlos Bolsonaro
Imagem: Gil Diniz/Reprodução

De Serra Talhada (PE) para a zona leste de São Paulo

Gil Diniz costuma falar com orgulho de sua trajetória. Diz ter vivas na memória as lembranças da infância pobre, mas alegre, na cidade de Serra Talhada (PE), onde nasceu. "Era uma família humilde, sempre com poucos recursos", recorda.

O pai, hoje desempregado, veio primeiro para São Paulo, onde trabalhou na construção civil e, depois, como porteiro. Meses depois, a mulher e os dois filhos chegaram - Gil Diniz tinha nove anos - e foram viver no Jardim Arize, na zona leste da cidade.

Hoje, com 32 anos, o deputado não tem bens declarados, diz que usa o carro funcional apenas para alguns deslocamentos e por motivos de segurança e, nos fins de semana, usa o transporte público para visitar os dois filhos do primeiro casamento em São Mateus - de onde se mudou para viver com a atual mulher.

As viagens de metrô e as imagens com os filhos de 8 e 10 anos aparecem com frequência nos perfis de Diniz em redes sociais. Seguindo a cartilha do bolsonarismo, Twitter, Facebook e Instagram são as principais ferramentas de comunicação do deputado com seus simpatizantes.

"Eu sempre postei [fotos no transporte público] e não me ligava. Repercute, a galera acha o máximo", diz o deputado. "O presidente [Bolsonaro], o próprio Eduardo, a ascensão foi por esse boom das redes sociais. Já tinha um discurso, já tinha um trabalho, e a rede social potencializa. É uma baita ferramenta pra divulgação."

"Era eu criando fake news já na infância"

Gil Diniz gosta de dizer que sua formação foi moldada pela família, pela igreja e pelo movimento escoteiro. Os pais insistiam para o filho seguir na escola, e a Paróquia de Santa Maria de Nazaré ajudava a família com doações de roupas de frio.

Na escola Dom Camilo, Diniz conta que se articulou com outros dois colegas para criar um jornal, "O Escracho", que misturava humor com ataques a professores e outros alunos. "Nós pegamos alguns desafetos e começamos a fazer 'reportagens' pegando o ponto fraco deles. Era eu criando fake news já na infância'", recorda o deputado, rindo da ironia. Como resultado, foi suspenso das aulas por uma semana.

Foto de quando o hoje deputado Gil Diniz era carteiro - Gil Diniz/Reprodução - Gil Diniz/Reprodução
Foto de quando o hoje deputado Gil Diniz era carteiro
Imagem: Gil Diniz/Reprodução
Antes de se tornar carteiro, o atual deputado trabalhou como entregador de leite, vigilante em shopping e policial militar temporário. As várias tentativas de se tornar definitivamente um PM esbarraram no veto na avaliação psicológica que apontava para uma "impulsividade" em Diniz inadequada para a função.

Nos Correios, o Carteiro Reaça nasceu das críticas à gestão da empresa - apesar de funcionário concursado, Diniz defendia a privatização da estatal e criticava a atuação de sindicatos ligados ao PCdoB.

Em setembro de 2014, ao sair de um shopping na zona oeste de São Paulo, o carteiro viu os irmãos Carlos e Eduardo Bolsonaro distribuindo panfletos de campanha. Já um admirador do pai de ambos, aproximou-se e disse que era funcionário público, morador da favela da Vila Flávia, em São Mateus, e que votaria em Eduardo nas eleições daquele ano.

O perfil do carteiro chamou a atenção de Carlos, que pegou o telefone e ligou para o pai. Durante a ligação, passou o celular para Diniz. O diálogo transformou o fã de Bolsonaro em devoto do bolsonarismo. A partir de então, o Carteiro Reaça virou cabo eleitoral de Eduardo Bolsonaro.

No ano seguinte, Gil Diniz foi convidado para trabalhar como assessor parlamentar do filho de Bolsonaro em São Paulo. A experiência no escritório do deputado rendeu o convite para ser candidato a uma vaga na Assembleia em 2018. Na campanha, usou e abusou de vídeos e referências a sua proximidade com a família Bolsonaro.

Gil Diniz foi o quinto deputado estadual mais votado em São Paulo, com pouco mais de 214 mil votos em outubro - atrás apenas da colega de partido, Janaina Paschoal, do youtuber Arthur Mamãe Falei (DEM, apoiado pelo MBL) e dos reeleitos Carlos Giannazi (PSOL) e Coronel Telhada (PP).

"Sou Bolsonaro, não sou PSL"

No início de junho, Eduardo Bolsonaro assumiu a presidência do diretório estadual do PSL, com Gil Diniz como vice. A legenda que cresceu nas eleições de outubro enfrenta divisões internas: os deputados federais Joice Hasselmann e Alexandre Frota costumam trocar farpas com os filhos de Bolsonaro, e os embates entre militares, liberais e discípulos de Olavo de Carvalho têm sido frequentes.

Eduardo Bolsonaro e Gil Diniz posam com armas de airsoft - Gil Diniz/Reprodução - Gil Diniz/Reprodução
Eduardo Bolsonaro e Gil Diniz
Imagem: Gil Diniz/Reprodução

"O PSL foi uma sigla partidária que deu certo. Foi um partido que nos acolheu e 'bum', deu certo. A gente ainda não é um partido ideológico. Agora que a gente está tentando tomar uma cara", afirma Diniz.

"Não somos pessoas de partido. Minha vida não está atrelada ao PSL. Eu estou no PSL hoje e tentando organizar da melhor maneira possível, junto com o Eduardo", acrescenta o deputado.

"Se amanhã tiver que sair do partido [PSL], criar um partido ou migrar para uma sigla, eu estou junto com eles. Eu sou Bolsonaro, não sou PSL."
Gil Diniz, deputado estadual (PSL-SP)


Em março, em seu primeiro desafio como líder da bancada do PSL na Assembleia, Diniz fez campanha para Janaina Paschoal na disputa pela presidência da Casa, contra o tucano Cauê Macris, que acabou eleito. O esforço rendeu ao ex-carteiro o respeito da colega de sigla.

"Ele é menos radical do que as pessoas pensam. Estamos nos dando bem", afirma Janaína Paschoal. "As coisas devem ficar mais difíceis agora, já que ele vai assumir grandes responsabilidades no partido."

Planos contra o PT e olho em 2022

No momento, Diniz diz que planeja articular uma forma de, na visão dele, reduzir o poder do PT na Assembleia Legislativa. "A gente está pensando agora em tirar a minoria do PT", diz o deputado.

A gente está costurando dentro da bancada de nos declarar oposição ao governo, tirar a minoria do PT e continuar com a independência. Lógico, fazendo a crítica ao governador, não somos base e não queremos ser, mas a gente também não quer dar essa prerrogativa ao PT.
Gil Diniz, deputado estadual (PSL-SP)

A atual líder da minoria, deputada Márcia Lia (PT), promete impedir a iniciativa de Diniz e cita um trecho do regimento da Assembleia que diz que a minoria é formada por partidos "com representação imediatamente inferior que, em relação ao governo, expresse posição diversa da maioria".

"Pela quantidade de projetos de lei que o PSL vem votando com o governo Doria, fica evidente que o partido não se configura como de oposição ao governo", diz a deputada petista. "O PSL é da base do governo. Dessa forma, não há a menor condição de pleitear a minoria."

Diniz insiste que as ambições do PSL são "ver o PT diminuir na Assembleia" e o "PSDB sair do poder em São Paulo". Para isso, diz que o partido precisa ajudar a construir uma candidatura viável para derrotar os tucanos em 2022.

O deputado evita, no entanto, falar em planos para o próprio futuro. Diante de rumores de uma possível candidatura de Joice Hasselmann à Prefeitura de São Paulo no ano que vem, Diniz diz que vai seguir aquilo que Jair Bolsonaro determinar. Com um sorriso controladamente contido, o ex-Carteiro Reaça lembra que já foi questionado se ele próprio não poderia vir a ser candidato a prefeito. "Eu falei: Olha, pra quem era carteiro até pouco tempo atrás, não vou duvidar."