Para especialistas, será difícil passar medida contra servidores filiados
Resumo da notícia
- Especialistas veem obstáculo em aprovar fim de estabilidade por causa de filiação partidária
- Medida só poderia ser aprovada por meio de uma emenda à constituição, dizem advogados
- Professora entende que proposta é inconstitucional por retirar direitos fundamentais
A proposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, de acabar com a estabilidade do servidor público filiado a partido político, anunciada hoje, terá muita dificuldade de ser aprovada, segundo especialistas ouvidos pelo UOL, pois não é prevista pela Constituição e mexeria com direitos fundamentais.
"Tem filiação partidária? Não é servidor público. Não vou dar estabilidade para militante. É como nas Forças Armadas: é servidor do Estado", disse o ministro durante a apresentação da proposta que autoriza a redução de jornada e salário de servidores em caso de emergência financeira.
Dos três especialistas ouvidos pelo UOL, dois entendem que o plano do ministro só poderia ser aprovado por meio de uma PEC (proposta de emenda à Constituição), que exige maioria qualificada (três quintos dos votos no Senado e na Câmara) para aprovação e que a mudança só poderia valer para novos servidores.
Já a professora de direito trabalhista e previdenciário Cristiane Grano Haik acredita que a proposta é inconstitucional e só poderia ser introduzida no ordenamento brasileiro, caso fosse convocada uma Constituinte, pois mexe com direitos fundamentais, cláusulas pétreas.
"Quando a proposta fala que vai proibir alguém de se filiar, propõe retirar direitos fundamentais, pois a Constituição prevê que é plena a liberdade de associação para fins lícitos", diz Cristiane.
Segundo a professora, um servidor público só não poderia ter atividades políticas nos casos previstos em lei, como os militares e membros do Ministério Público.
"O constituinte previu que a atividade política do militar deve ser evitada para não colocar em risco a democracia. Com relação ao servidor civil, é muito diferente. O motivo tem que ser muito forte para lhe retirar esse direito", da afirma a professora, citando como exemplo as hipóteses previstas na Lei da Ficha Limpa ou na lei de improbidade administrativa, e ainda assim, analisadas caso a caso.
Necessidade de PEC
Já os advogados Vera Chemim, constitucionalista com mestrado em administração pública pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), e Leandro Scalabrin, membro da mesa diretora do Conselho Nacional de Direitos Humanos, entendem que a proposta só poderia ser aprovada por PEC, o que exigiria a aprovação de 49 senadores e de 308 deputados.
Para Scalabrin, a proposta seria inconstitucional apenas se fosse proposta por meio de projeto de lei. Caso seja proposta como PEC, a ideia seria legal, contudo ele avalia que a medida é "um retrocesso e antidemocrática".
"Este governo já monitora servidores em suas redes sociais para ver suas opiniões e reprime quem pensa diferente e agora quer restringir os direitos políticos dos servidores públicos", afirma.
Exceção
"Só uma emenda constitucional pode tirar esse direito que o servidor tem. A perda de direitos políticos só pode ser aplicada no caso das exceções previstas em lei. O direito político de votar e ser votado é de qualquer um", afirma Vera Chemin.
Para a constitucionalista, como se trata de um direito fundamental, é muito mais difícil de ser abolido.
A medida teria que ser proposta por meio de PEC, aprovada e só poderia atingir novos servidores. Sobre quem já é servidor não há o que se falar
Vera Chemim, constitucionalista
Vera citou decisões do STF que anularam demissões de servidores civis de empresas de economia mista por razões de ordem político partidária.
A professora entende que só a filiação partidária não significa militância. "Não há como evitar que alguém seja filiado a partido político desde que ele não se manifeste politicamente no trabalho dele. Só é errado se militar no exercício da função", afirma. "Se sou filiado e nunca me manifestei no meu trabalho, não há porque tirar a estabilidade."
Vera lembrou que o estatuto dos servidores públicos da União prevê licença em caso de candidatura do funcionário a um cargo público. "O servidor público tem regras para se licenciar e se candidatar", afirmou.
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