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Para advogados, dia do branco é 'absurdo', mas não seria ilegal

Sessão da CCJ na Câmara  - Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Sessão da CCJ na Câmara Imagem: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Alex Tajra

Do UOL, em São Paulo

13/12/2019 19h26

Resumo da notícia

  • CCJ aprovou projeto de lei que cria um data para comemorar a "chegada oficial do branco europeu ao Brasil"
  • Advogados ouvidos pela reportagem apontam que medida é constitucional, mas "absurda"

A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados aprovou nesta semana um projeto de lei que propõe datas comemorativas para "três segmentos étnicos" do Brasil.

Além do Dia do Índio (19 de abril) e Dia da Consciência Negra (20 de novembro), já existentes, o projeto quer estabelecer um dia da "chegada oficial do branco europeu ao Brasil" — iniciativa classificada de "absurda" por advogados ouvidos pelo UOL, que avaliam, no entanto, que a proposta não fere a Constituição.

O texto foi apresentado pela então senadora Roseana Sarney em 2005, e, desde então, passou por várias comissões dentro da Câmara, incluindo a Comissão de Educação e Cultura e a Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Ao longo dos anos, a proposta recebeu pareceres positivos de deputados à esquerda e à direita, incluindo parlamentares do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e do Partido dos Trabalhadores (PT).

A proposta sustenta que, no dia 22 de abril, atualmente caracterizado como "Dia Do Descobrimento do Brasil", passe a ser comemorada a "chegada oficial do branco europeu ao Brasil."

"A proposição estabelece datas que, já celebradas, correspondem aos três grandes grupos étnicos que se encontram na base da formação da população brasileira. Nota-se que as datas comemorativas de alta significação derivam de eventos históricos e culturais notórios do povo brasileiro que, pela força da tradição, são incorporadas naturalmente no calendário nacional", escreveu o deputado Gilson Marques (NOVO), relator do projeto na CCJ.

Advogados criticam

A despeito de ser "absurda", "ridícula" e "completamente inadequada", a proposta aprovada na CCJ não fere a Constituição do país, conforme advogados ouvidos pela reportagem.

"Para mim não faz o menor sentido ter um dia do branco, do orgulho branco. É bastante absurdo. (...) O direito, no entanto, segue uma racionalidade bem própria do que é lícito e do que é ilícito. Nem sempre algo que é bizarro e considerado errado vai ser necessariamente ilegal", diz o advogado constitucionalista André Portugal

"Se fosse uma data celebrando o nazismo, por exemplo, seria algo ilegal por conta do racismo. Celebrar a cultura branca, embora seja um erro evidente, e de maneira indireta se pode falar em uma desconsideração completa das questões raciais no Brasil, não me parece que seja inconstitucional", argumenta.

Para Portugal, o projeto, apesar de ser considerado legal, é completamente equivocado pois desconsidera a importância do movimento negro e do movimento indígena. "O pleito por datas comemorativas é uma luta por reconhecimento de setores da sociedade historicamente marginalizados."

O advogado Gustavo Polido corrobora a posição de Portugal. Mesmo sendo tecnicamente constitucional, o projeto de lei é "absurdo porque reforça a ideia de racismo."

Racismo institucional

A reportagem selecionou alguns dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) para balizar o racismo institucional que permeia o país — o que, por si só, já torna o "dia do branco" um reforço à discriminação. Os números reforçam o que já é explícito empiricamente: