Governo prevê estudo de viabilidade a distância em terras indígenas
Se for aprovado no Congresso, o projeto de lei do governo Jair Bolsonaro (sem partido) que libera a exploração mineral em áreas indígenas permitirá que estudos técnicos, como o que atesta a viabilidade de uma operação, sejam realizados a distância, sem que profissionais pisem nas comunidades.
De acordo com o texto elaborado pelo Ministério de Minas e Energia, "poderão ser utilizados dados e elementos disponíveis". O estudo técnico seria permitido mesmo em terras com processo de demarcação em curso.
No teor da medida, o governo observa que a interlocução entre índios e potenciais exploradores pode ser "frustrada" ou impossibilitada devido a uma eventual proibição do acesso à comunidade. Ou seja, em caso de conflito ou divergência.
Próximos passos do projeto
O PL (projeto de lei) chegou hoje ao Parlamento e tramitará em regime de prioridade. Ele será inicialmente analisado por oito comissões de deputados e deve sofrer grande resistência no Congresso, sobretudo a pressão exercida pela bancada alinhada às causas ambientais.
Em setembro do ano passado, durante encontro com o cacique Raoni — líder indígena reconhecido mundialmente —, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que não pautaria proposições que busquem flexibilizar a mineração em terra indígena.
"A intenção é que a gente possa construir projetos que sinalizem aos brasileiros e ao mundo a nossa preocupação com o meio ambiente", afirmou Maia à época.
O texto do governo não esclarece o que são "dados e elementos disponíveis" para a elaboração do estudo técnico prévio, mas cria regras que devem ser seguidas pelos que desejarem explorar as terras.
Seria necessário, por exemplo, fazer o levantamento geológico (para atividade minerária) e/ou um inventário hidroelétrico de bacias hidrográficas (para aproveitamento dos potenciais de energia hidráulica). Já a produção e extração de petróleo dependeria da "integração de dados geológicos e geofísicos disponíveis com a identificação dos potenciais das bacias sedimentares de interesse".
A Funai, órgão de proteção das comunidades indígenas subordinado ao Ministério da Justiça, seria responsável por todo o "mapeamento técnico indigenista".
Agricultura, pecuária e turismo
Além da exploração mineral, a proposição pretende liberar outras atividades econômicas nas áreas protegidas, incluindo agricultura, pecuária e exploração do turismo.
Se for aprovado por deputados e senadores, os índios terão direito a uma compensação financeira pela exploração da terra por terceiros, mas em valores menores do que os pagos em royalties do petróleo a estados e municípios.
Em nota, a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) manifestou repúdio ao projeto de lei do governo Bolsonaro.
Segundo a entidade, a ideia está "maquilhada de falsas boas intenções e retóricas que induzem à cooptação e divisão dos povos, tergiversando o real sentido da autonomia, para na verdade autorizar também a invasão dos territórios indígenas por meio de outros empreendimentos tais como a agricultura extensiva, a pecuária e outros empreendimentos predatórios".
"O 'sonho' do governo Bolsonaro é, na verdade, a vontade de atender os interesses econômicos que impulsionaram a sua candidatura e sustentam o seu governo, mesmo que isso implique total desrespeito à legislação nacional e internacional que assegura os nossos direitos fundamentais", disse a Apib.
O secretário-geral do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Antônio Eduardo Cerqueira de Oliveira, afirmou ao UOL que haverá resistência por parte dos grupos identitários e pressão em relação ao Parlamento para que o projeto do governo não seja aprovado.
"A partir da nossa atuação e da pressão de setores da sociedade, vamos conseguir vencer esse momento tão sombrio da história do nosso país", disse ele. "Vamos fazer tudo que for necessário, em termos das nossas articulações e denúncias, para que esse projeto não seja aprovado."
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