AL: juiz bloqueia bens de prefeito por usar pandemia para fins eleitorais
A Justiça de Alagoas bloqueou R$ 200 mil em bens móveis ou imóveis do prefeito de Teotônio Vilela (AL), João José Pereira Filho (MDB), também conhecido como Joãozinho Pereira, e de mais três funcionários do município por suspeita de aproveitarem a pandemia de coronavírus para distribuir cestas básicas e usar a máquina pública para fins pessoais e eleitorais. No total, o bloqueio é de R$ 50 mil para cada um.
A decisão de hoje do juiz Allysson Jorge Lira de Amorim, titular da comarca de Teotônio Vilela, acatou denúncia do MPE (Ministério Público Estadual), que acusou os quatro de improbidade administrativa.
Além do prefeito, as pessoas investigadas são: Pedro Henrique de Jesus Pereira (Peu Pereira), secretário-chefe do Gabinete Civil; Giselda Barbosa de Souza Lins, secretária municipal de Assistência Social;, e o vereador André Antonio dos Santos (MDB), o André Novinho.
O magistrado afirma na decisão que devido às incertezas econômicas e sociais causadas pela pandemia do novo coronavirus, "o bloqueio não alcança, por enquanto, eventuais valores depositados em conta bancária dos réus."
Na decisão, o magistrado destaca que as atitudes denunciadas pelo MPE mostram os réus se valendo do "estado de calamidade e pandemia provocados pelo novo coronavírus para fazer promoção de imagem pessoal, aproveitando-se da máquina pública." O magistrado afirma que os vídeos veiculados pelos agentes públicos são suficientes para caracterizar o requisito dos "fundados indícios de responsabilidade".
"Na inicial demonstram os indícios de irregularidades quando da distribuição dos alimentos, possivelmente oriundos da merenda escolar, como forma de promoção pessoal dos requeridos, com fins eleitoreiros, no âmbito do município de Teotônio Vilela, ainda mais em um momento em que todo o mundo trava verdadeira luta no combate a uma pandemia. É de se reconhecer que tais condutas, como alega o MPE/AL, estariam contrárias às hipóteses permitidas pela Constituição Federal de 1988", ressalta o juiz.
O magistrado explica que a decretação de indisponibilidade de bens, prevista na Lei n.º 8.429/92, não exige a prévia demonstração de eventual tentativa de dilapidação do patrimônio pelos acusados, pois, neste caso, "sustenta a doutrina que o periculum in mora seria implícito." "O interesse público subjacente tem prevalência sobre os interesses particulares, em especial quando o assunto é a reparação dos cofres públicos."
Denúncia
Na manhã de hoje, o Ministério Público Estadual divulgou que Joãozinho Pereira, Peu Pereira, Giselda Barbosa de Souza Lins e André Novinho estavam sendo processados por "promoção pessoal com fins eleitoreiros ante a obrigação de fornecimento de cestas básicas", além de usar a pandemia da covid-19 na entrega dos alimentos.
O promotor de Justiça Rodrigo Soares, com apoio do NUDED (Núcleo de Defesa da Educação) do MPE, pediu à Justiça o bloqueio de bens e a perda de função pública dos acusados, que são as penas previstas para a violação da impessoalidade dispostas na Lei de Improbidade Administrativa.
"Alguns agentes políticos estão se valendo desse momento tão difícil de pandemia para buscar a promoção pessoal, isso considerando-se também que estamos em ano eleitoral. A constituição proíbe expressamente, com vistas no princípio da impessoalidade, tais atitudes", destaca o MPE.
O promotor explica que a denúncia à Justiça foi baseada em dois vídeos em que aparecem Giselda Barbosa de Souza Lins e André Novinho. No primeiro vídeo, a secretária aparece em cima de um caminhão distribuindo cestas básicas no bairro Gerais e explica que a suspensão da festa de São José, Padroeiro do bairro, ocorreu em decorrência da disseminação do coronavírus. Ela afirma ainda que a distribuição das cestas estava ocorrendo devido aos cuidados do prefeito com a comunidade.
O Ministério Público Estadual observou ainda que a ação provocou gratidão às famílias carentes, "tudo ligando a ação aos nomes e imagens dos agentes públicos." Além disso, segundo o MPE, a secretária reforça que, como porta-voz do prefeito, ele teria dito: "Gisela, vá lá com o vereador e entregue 400 cestas básicas".
Em um segundo vídeo, o vereador André Novinho discursa a favor do prefeito Joãozinho Pereira, da secretária Giselda e do secretário Peu Pereira, pela distribuição das cestas, básicas e aproveita o momento para destacar obras municipais, como a construção de três casas populares e revitalização de uma praça e da igreja do bairro.
"O uso do nome e da imagem como se as ações da Administração Pública fossem um favor ou uma benesse de um ou outro agente público é violador do princípio da impessoalidade, afinal, o que se estar a fazer é obedecer a lei, conforme bem apontado pela Nota Técnica do NUDED", explica o promotor de Justiça, Rodrigo Soares.
O coordenador do NUDED, promotor de Justiça, Lucas Sachsida, afirma que "é nítido que os réus se valem de estado de calamidade e pandemia provocados pelo coronavírus para utilizar da máquina pública, notadamente bens e servidores públicos no exercício da função, fazerem promoção pessoal, sobretudo considerando que estamos em ano eleitoral".
Na ação, o MPE pediu em caráter de liminar a indisponibilidade de bens e valores dos réus no montante de 50 vezes a remuneração de cada um, respectivamente, e, para garantia de efetividade, no valor, desde já de R$ 50 mil, de forma solidária. Além disso, caso os réus sejam condenados por improbidade administrativa, sejam tipificados no artigo 11, inciso I, da Lei nº 8.429/92 para pagamento de multa civil arbitrada em até 100 vezes à remuneração percebida à época dos fatos, sendo o mínimo de 50 vezes, devidamente atualizados e acrescidos de juros de mora na data a condenação.
A ação requer ainda a perda da função pública que os réus exercem ou venham a exercer, além da suspensão dos direitos políticos por cinco anos. Além disso, a proibição de contratação com o poder público, proibição de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, mesmo por intermédio de pessoa jurídica ou intermediário, por três anos, de acordo com a Lei 8.429/92.
Outras condenações
Joãozinho Pereira já foi prefeito de Teotônio Vilela em 2005, quando foi acusado pelo MPF (Ministério Público Federal) por fraude em licitações do gênero alimentício no exercício do mandato e desvio de recursos federais com uso de 15 cheques, que somaram um total de R$ 255.501,76.
Em 2018, Pereira e a então secretária de finanças de Teotônio Vilela Pauline Pereira, irmã do prefeito, foram condenados pela Justiça Federal a ressarcirem o valor de R$ 205.084,88, corrigidos, além da multa de R$ 20 mil, por se tratar de medida de caráter retributivo motivada pelos atos praticados pelos agentes públicos. Os réus recorreram da decisão.
Pauline Pereira é atual prefeita do município de Campo Alegre. O UOL procurou a defesa da prefeita na noite de hoje, mas não conseguiu,
A sentença foi dada pelo juiz federal Raimundo Alves de Campos Júnior, da 13ª Vara Federal, em 16 de outubro de 2018. O magistrado determinou a suspensão dos direitos políticos dos dois condenados pelo prazo de oito anos.
A Justiça ainda proibiu Pereira e Pauline de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.
De acordo com a denúncia do MPF, o prefeito e a irmã dele praticaram atos de improbidade administrativa com uso irregular de recursos federais do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), do PEJA (Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para Atendimento à Educação de Jovens e Adultos) do município.
Prefeito milionário
Joãozinho Pereira diz que é agricultor e não tem o ensino médio completo. A declaração de bens de Joãozinho Pereira para o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na candidatura para prefeito do município de Teotônio Vilela em 2016 foi de R$ 1.346.986,43, sendo R$ 147 mil em espécie e dois veículos (cujos valores somam cerca de R$ 330 mil), além de quatro terrenos e outros bens.
Outro lado
A secretária de Comunicação do Município e da Câmara de Vereadores, Marcela Vilela, nega a acusação e diz que a entrega das cestas básicas ocorreu dentro dos limites legais. A secretária afirmou que o procurador-geral do município ainda não foi notificado da decisão judicial, mas que vai recorrer da decisão em momento oportuno.
Em nota, a prefeitura de Teotônio Vilela afirma que "a referida entrega de cestas nutricionais faz parte de programa social municipal vigente há mais de uma década e abarca cidadãos com grau de vulnerabilidade social devidamente reconhecido pelo Sistema Integrado de Ação Social."
"Foi por interesse da administração pública e no resguardo à saúde e vida de seus administrados que o fornecimento das cestas nutricionais fora realizado por meio de entrega domiciliar, com o objetivo de não criar aglomerações e evitar o possível contágio de coronavírus (COVID-19)."
"O objetivo da entrega domiciliar é, de fato, conter o contágio e impedir o avanço da pandemia em nosso município, além de ser medida que visa o estrito cumprimento dos decretos expedidos pelo governo do estado de Alagoas, bem como deste município, inclusive a festa cultural em alusão ao padroeiro do bairro Gerais fora cancelada pelas mesmas razões", justifica a prefeitura.
Sobre os vídeos, a prefeitura e a Câmara de vereadores afirmam que "os vídeos citados sequer compuseram o material oficial de comunicação deste Executivo."
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