Sem consenso, governo ensaia retomada das pautas de costumes
O Planalto ensaia retomar as pautas de costume no Congresso. O líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), afirma que entre as prioridades estão aprovar a desburocratização do acesso a armas e a regulamentação da educação em casa - o chamado homeschooling.
Os projetos sobre os temas não se destacaram na pauta no início do ano e ficaram ainda mais travados desde a eclosão da pandemia do coronavírus no Brasil, por volta de março. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não tem proximidade ideológica com os assuntos e não deverá se esforçar para discuti-los de imediato, segundo apurou a reportagem.
O Congresso Nacional está voltado às propostas que buscam combater efeitos sociais e econômicos negativos da pandemia, embora não esteja limitado a elas. Para parte da base governista, apesar dessa dedicação à crise na saúde, é preciso levantar as pautas de costume perante os eleitores de Bolsonaro para que pressionem o Parlamento a discuti-las.
Um grupo de deputados bolsonaristas também acredita que o governo tem, em tese, mais chances de aprovar as pautas de costume com o apoio do centrão, com cerca de 165 dos 513 deputados - grupo informal de partidos que passou a defender mais o governo em troca de cargos na administração pública.
Mas a verdade é que não há garantia de uma maioria em plenário. Isso porque o centrão também não tem esses assuntos como bandeiras eleitorais.
O deputado Felipe Francischini (PSL-PR) reconhece que o único partido que defende abertamente essas questões é o PSL, ainda rachado.
Segundo ele, Maia fez um acordo no ano passado para pautar a facilitação de porte e posse de armas no segundo semestre deste ano. A oposição alega que, em março, ficou firmado que a Câmara só votaria propostas relevantes para a pandemia enquanto ela durar.
"Essas bandeiras do presidente são bandeiras que defendemos em campanha junto com ele. [...] Claro que a esquerda não tem esses mesmos objetivos, mas é a questão do voto. Ganha quem tiver mais", disse Francischini.
A líder do PCdoB na Casa, Perpétua Almeida (AC), afirma que o governo terá dificuldades, porque "hoje as pessoas estão mais preocupadas em saber o que vão comer no dia seguinte". Em sua avaliação, a tentativa do governo é "uma cortina de fumaça" para "falta de propostas".
Outro fator apontado pela oposição como dificultante para a pauta de costumes é a suspensão dos trabalhos presenciais em comissões para se evitar aglomerações em Brasília.
O consenso entre os parlamentares é que as discussões não são as mesmas à distância. O vice-líder do governo na Câmara, José Medeiros (Podemos-MT), admite que esses assuntos requerem "muito debate e muita negociação".
O deputado bolsonarista Otoni de Paula (PSC-RJ) entende que os temas são importantes para a militância do presidente, porém, também pensa que o momento é de não causar polêmicas na população ou entre os Três Poderes.
Nas últimas semanas, Bolsonaro tem baixado o tom nas críticas ao Judiciário e ao Legislativo. A atitude coincide com investigações de suspeitas de corrupção envolvendo pessoas próximas a ele, como o filho e senador, Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), e o ex-assessor de Flávio, Fabrício Queiroz.
Flávio Bolsonaro, inclusive, cobrou a discussão da questão do armamento nesta quarta (5) em entrevista ao jornal O Globo.
Quanto a mudanças na legislação sobre aborto e drogas, a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) diz que o governo não deve tocar nesses assuntos. A intenção é que sejam mantidas as previsões atualmente em lei para não haver o risco de serem descriminalizados com judicializações pela oposição, apurou a reportagem.
Além do Congresso voltado à pandemia e da dificuldade de aprovação, uma ala dos deputados bolsonaristas prefere esperar a eleição à Presidência da Câmara, prevista para 1º de fevereiro de 2021.
A expectativa é eleger um presidente mais conservador e afeito às pautas para uma tramitação ágil, como os pré-candidatos Capitão Augusto (PL-SP) e Marcos Pereira (Republicanos-SP).
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